quinta-feira, 8 de julho de 2010

Uma noite no Forte de S. João nas Berlengas!

A primeira vez que visitei a Berlenga foi no início de Agosto de 1982.Adoro idealizar passeios. Convidei os meus sogros que rumaram comigo ate Peniche onde tínhamos encontro marcado com a minha mãe e irmã. Jantámos no restaurante em cima do mar!
Na vila tivemos alguma dificuldade para alugar quartos, decorriam os festejos anuais alusivos a Nossa Senhora da Boa Viagem. Ficámos numa casa com um grande largo pela frente a ver o mar...à noite fomos ver a procissão, num repente caiu uma chuvada tal que os panos das tendas abarrotavam com barrigas de água - os tendeiros com ajuda de paus altos tentavam esvaziar...claro ficámos todos molhados.
Quanto a mim ainda me recordo bem de ter dificuldade em dormir, tal era a enxaqueca.
De manhã muito cedo rumámos ao porto para apanhar o primeiro barco o "Cabo Avelar Pessoa", e rumar até a Berlenga. Confesso ia cheia de medo, de me sentir indisposta, tais eram os comentários que ouvia sobre a travessia em pleno mar aberto. O barco ia cheio, sentei-me num banco basculante junto à porta para ter mais ar e não me sentir sufocar...
Aborda-me o marinheiro de idade olhando para mim...olhe a semana passada o homem que costumava ir ai sentado morreu afogado a pescar polvos nas rochas...tal o susto, jamais o esqueci!
Chegados à ilha desfrutámos da sua beleza ingénua, singular, agreste, seca,excessivamente povoada de gaivotas salpicada por múltiplos carreirinhos -, os trilhos que devem ser usados pelos caminhantes para se percorrer a ilha em todos os sentidos de norte para sul de oeste para leste, naquela visão soberba, única, idílica, a contemplar aquele mar imensamente transparente,também os Farilhões sem nevoeiro num jeito de esculturas a emergir das águas, que falar do sussurro das ondas de espuma branca numa louca imitação de vestidos de noiva com grinaldas, do grunhido das gaivotas -, ensurdecedor... ovos sem ninho espalhados ao acaso na vegetação rasteira, magnifico foi sentir o oceano, na sua fascinaste e omnipotente grandeza!
Voltei em 2006. Decidi fazer uma reserva via Internet para um fim de semana no Forte de S.João Baptista também em Agosto. Consegui!


Aviado farnel de casa. Pensei em tudo.Foi magnífico, decorreu como sonhei...De sacos e malas térmicas nas mãos os três rumámos até Peniche. Mal chegados tomámos o nosso pequeno almoço que vinha de casa nos muros do forte. Tomámos rumo do porto para o embarque, íamos muito contentes. O pior na ilha - caminhar em subida, carregados, o trajecto para o forte só se faz em barco alugado ou a pé. Tempo era o que mais tínhamos, mas que custou lá isso custou, primeiro a eterna e grande subida, depois a descida em mil e um degraus desiguais que atrapalham o equilíbrio, baralham a mente.
A praia pequena de areia branca. Em toda a ilha uma única árvore, uma figueira numa vereda no canto da praia, por lá deixei caroços de pêssego para quando lá voltar saber se algum vingou. Foi um dia inesquecível em família.No regresso o barco vinha atarracado de gente, vim de pé, uma viagem suave, maravilhosa, sem quaisquer sobressaltos. Adorámos!
O jantar foi saboreado ao entardecer. Descobrimos que no piso do quarto havia uma porta que dava acesso a uma placa em lajes ladeada de muros onde o degustámos sob uma brisa suave que àquela hora se fazia sentir.O almoço na praia, teve um dia que comemos mesmo no quarto, recordo de ter estendido a toalha sobre a cama tipo piquenique. Idealizámos o pequeno almoço no telhado, na parte mais alta, tanta escada estreita até ao topo, valeu a pena o cenário que se avista - fenomenal.Tudo ali cheirava a inédito, único, verdadeiro.
Maravilhoso foi apreciar no dia seguinte pela manhã a chegada do primeiro barco, observar num repente os trilhos a ficar repletos de gente em fila vestidas de cores berrantes, uma imagem inesquecível.
Foi um fim de semana imensamente vivido na pobreza, mas não o foi menos imensamente fabuloso nas emoções. Alugámos um barquito para sair do forte em direcção ao ancoradouro para apanhar o barco de regresso a Peniche, desfrutar daquele mar, ver as grutas, os canais, sentir as arribas abruptas,foi das melhores sensações que até lá tinha vivido!
Jamais me esquecerei de ter dormido duas noites no forte de S.João Baptista da Berlenga!
Finalmente chegados ao Forte sentimos como se chegássemos a um castelo solene...
O quarto com janela sobre o mar tinha duas camas de espaldar tipo dos reis muito velhas, um armário, mesinha de cabeceira, lavatório e um bidé com armação em ferro forjado, o chão em tijoleira a descascar de velho, as paredes de cal brancas com escamas de tantas pinturas sem antes retirarem a camada antiga...a casa de banho era única no piso para todos...
Mote de imaginação, tão arcaica era..contudo senti e desfrutei do mar através do janelo pequeno, que falar do chuveiro, um pote em folha de Flandres com crivo munido com uma corda que se puxava para abrir a água...esta era aquecida em potes azuis de plástico de 20 litros durante o dia na janela do quarto. Digam lá que não foi uma aventura e daquelas!