sábado, 15 de julho de 2023

O 3º conde de Castelo Melhor Luís Vasconcelos e Sousa, valido de Afonso VI

Crónica com resumo publicado no Jornal Serras de Ansião julho 2023

Mais de um ano de caminhadas em Ansião como nos concelhos limítrofes, proporcionou-me uma visão extraordinária de coligir informação histórica complementada no Facebook, no caso para o individuo citado a iluminação no Grupo Amigos de Ourem e o seu concelho.

O episódio do Estreito, sem menção na dissertação de mestrado de Vinícius Orlando de Carvalho Dantas de 2009 - apenas foca a saída do conde de Castelo Melhor do  paço de Lisboa, com os criados. No mesmo seguimento o Dr. Filipe Pinheiro de Campos, também não lhe faz menção nem ao valimento na crónica nº VI no Jornal Serras de Ansião.

O rei D. João IV, faleceu em novembro de 1656, ficando na regência do reino com a rainha D. Luísa de Gusmão, durante a menoridade de D Afonso VI, com o valimento  durante 5 anos, do 3º conde de Castelo Melhor que ganhou uma grande dimensão e poder. 

Foto do 3º Conde de Castelo Melhor Luís Vasconcelos e Sousa 

Existem resquícios dos eu olhar no apelido Leal Fonseca - D. Lucinda e o filho Pedro em Ansião 

Noção do que era o valimento 

Excerto retirado do mestrado acima citado  () Num sermão do jesuíta António Vieira sobre o valimento recordava um aspeto central da privança: a inevitável queda do valido. A impossibilidade de se contentarem com a sua condição inicial, fazia com que almejassem um lugar cada vez mais alto. Quando chegavam a tão desejada posição desfrutavam por pouco tempo, fazendo com que a sua ruina fosse certa. A exemplo da natureza com o crescimento das palmas, e da graça divina pela elevação dos santos, os validos cresciam impulsionados pela ação da fortuna. Para não usurparem o trono, chegando à condição de rei, eram afastados do convívio com o monarca – “ofenderam-se os grandes de tanto crescer; e o remedio que inventaram para não crescer mais foi tirá-los do lado do rei”.

Rei D. Afonso VI

Foi o nobre Luís de Sousa Vasconcelos que ajudou a construir uma nova imagem deste rei, afastando-o do estigma " rei incapaz" -, física e mentalmente que não consumou o casamento, sendo que a rainha se recolheu no convento da Esperança, das religiosas de Francisco, exigindo devolução do dote.

Em 23 de novembro de 1667, apesar da sua permanência como rei de Portugal, acabava o governo de Afonso VI. Sem abdicar livremente, foi preso pelo irmão mais novo, nos paços reais de Sintra. Notável desgaste da tijoleira do quarto em 9 anos. No dia do seu falecimento, a 1 do Setembro de 1683, foi aclamado rei o D. Pedro II, anulou o casamento do irmão e casou com a sua cunhada, a rainha Maria Francisca Isabel de Saboia, que tinha sido aliança com a França e, assim já não devolveu o dote. 

Reinado de D. Pedro II

A corte vivia por essa altura uma conjuntura de conflitos  de interesses em contexto de guerra peninsular. O rei D. Pedro II, deu uma machada num golpe palaciano de duas fações: por um lado, o Conde Castelo Melhor, que tinha sido amigo e valido do rei D. Afonso VI, com tantos poderes que lhe valeu a alcunha “conde rei” e, por outro lado para salvar a monarquia eliminou os nobres políticos resistentes, afastando de vez  do seu governo, o Conde Castelo Melhor. Naquele dia o conde teve o fim do seu grande valimento e, o princípio da sua grande peregrinação - entre 1668 e 1685 - então com 47 anos, mal-amado pelo rei e pela rainha, deixou a cavalo o paço de Lisboa.  Presume um cenário de raios e coriscos e, antevendo perseguição  por enviados do rei, enviou para norte os seus criados para lhe encontrar esconderijo, longe das suas quintas, onde seria facilmente intercetado . Passou por Torres Vedras, com refúgio na aldeia do Estreito, perto de Caxarias, no concelho de Ourém. Em crer, onde os criados acharam quiçá, casa isolada a quem pagaram boas libras ao lavrador e à sua família para o acolher e não denunciar. Onde viveu disfarçado de lavrador várias semanas. O Estreito fazia parte do itinerário de corredores romanos /medievais de Lisboa para norte, pelo Salgueiro de Cima e do Meio, Albergaria dos Doze, Pombal, Soure e Coimbra. E para sul, em Rio de Couros o entroncamento com o corredor vindo de Ansião, Almoster, Perucha e, outro vindo de Chãos, pela ponte romana da Quebrada do Meio, para Colipo, Leiria.

Referência nas Memorias Paroquiais de Olival, Ourem de 10.06.1758

Vasco Jorge Rosa da Silva Câmara Municipal de Ourem 2012

"Capela de Nossa Senhora do Testinho, aldeia de Estreito, outrora freguesia de Ribeira do Olival, hoje
de Urqueira. Com sua imagem da Senhora disce todos os domingos e dias santos misa na dita capella por contado excelentíssimo conde Castello Milhor Luís de Vasconcelos e Sousa,  que a erigio no tempo que andava fugitivo, em cujos alcances tinha huma tropa, e aonde hoje he a capella, abatido, e o culto escapou, e se montou aquella igreja em memoria, com a invocação desestindo por trazer comsigo humprato em que estava esculpida a Senhora, que por milagre, munto o estimava, assim se da aconhecer, pella inscripção que estava sobre o portico que he da forma seguinte:

Hic ubi per multas hebdomadas Ludovicus a Vasconcellos et Sousa comes Castelli Melioris, insuis aerumnis una tutella Sanctissimae Virginis, ab invocatione a Testula in tuto fuit, hoc sacellum erigi
iusit anno ĪDCLXXXVII 4 mo. Possui uma epígrafe latina de 1687.

Em 1758, o Estreito tinha 12 «vizinhos», fogos, uerbi gratia, cerca de 36-48 moradores."


Grupo Facebook: Politica, Historia e Património de Portugal  A lenda de Nossa Senhora do Testinho do Estreito

 vinham na estrada três cavaleiros de Lisboa, em sua perseguição do conde de Castelo Melhor que seguia com um lavrador com uma carrada de mato, quando decide avançar para se esconder num vale por onde corre uma fonte. Os cavaleiros abordaram o lavrador, para que lhes dissesse se aquele homem era um conde fugido e lhes indicasse o sítio para onde teria ido, ao que o lavrador respondeu: Que nem aquele era conde, mas um lavrador do lugar, nem sabia para onde tinha ido, reatando o caminho para o sítio onde sabia que ele se escondera fazendo a descarga do mato, para o esconder melhor e assim frustrar a sua procura. Os cavaleiros sem o localizar foram por onde tinham vindo. Por ter escapado por milagre de Nossa Senhora do Testinho, cuja imagem andava sempre acompanhado, fez o voto de construir uma capela no Estreito, em sua devoção, para se rezar missa nos domingos e dias santificados. Cujos descendentes foram cumprindo cuidando da sua manutenção e do culto divino. Consta que existe no cartório da família Castelo Melhor, um documento que prova essa tradição. O relato aborda José Dias Antunes, bisneto do lavrador que encobriu o conde ajudou na administração dos rendimentos da capela e da sua manutenção e culto”.

A capela de Nossa Senhora do Testinho no Estreito, Ourém 

Ostenta uma lápide falante que engalana a cimalha da porta de entrada com o ano de 1687,  enfeitada de espirais em caracol.  Julgo que o lavrante inverteu inadvertidamente o seu nome.


A razão deste orago?
Segundo o meu amigo Engº e historiador  Rui Manuel Mesquita Mendes 
"A Nossa Senhora do Testinho esta ou outra tinha lugar de destaque na Capela de São Francisco da Quinta do Campo de Vila Nova, no Carregado (Alenquer), cabeça do Morgado de Santa Catarina que o Castelo Melhor fundou."

Segundo a minha amiga Luísa Lima, o seu amigo António José  Cachado da Golegã conhece bem  a família do Conde Castelo Melhor , que agora é o D. Bernardo. O irmão chama se Luís de Vasconcelos e Sousa da quinta da Labruja na Golegã. A quinta foi de jesuítas , foi trocada por outra na Calheta, que era rica em caulino para a vista alegre. E inclusive tem uma história muito interessante.

Foto retirada do Grupo Amigos de Ourem e os eu concelho

AQUI ESTEVE
LUIZ DE SOUSA E VASCONCELLOS,
CONDE DE CASTELLO MELHOR, POR MUITAS
SEMANAS. O QUAL, INVOCANDO
O SANTISSIMO NOME DE
NOSSA SENHORA DO TESTINHO,
TEVE A SUA DEFESA.

Credível nesta estadia o conde Castelo Melhor arquitetou o seu exilio, deixando o Estreito a caminho de Pombal, Bussaco, seguindo para a corte de Luís XIV em França, fixando-se em Turim, na Itália, terra dos duques de Saboia, onde esteve quase 10 anos. Em 1677, serviu em Londres, Catarina de Bragança e Carlos II, onde pediu auxílio à rainha, que era irmã do rei D. Pedro II, para poder regressar a Portugal . Aconteceu o seu regresso em 1685, indo residir em Pombal como alcaide-mor e comendador. 

As MParoquiais de 1721 de Pombal evocam que na sequência do cumprimento desse voto de regresso à pátria, mandou construir em Pombal, a igreja de Nossa Senhora do Cardal com convento, em 28 de maio de 1686 para seu sepulcro, dos seus descendentes e, os restos mortais de seus pais. 


No trabalho de Ricardo Oliveira coligi na Pág. 189
em https://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/10523/1/ulsd067335_td_Ricardo_Oliveira.pdf
(...) O primeiro defunto a ser sepultado na igreja do convento do Cardal, a 8 de Maio de 1710 foi Diogo de Sousa Vasconcelos. Leiria, ADL, Registos Paroquiais, Óbitos, Pombal, livro 1 (1645-1746), fl. 217v.

O  pombalense Diogo de Sousa de Vasconcelos foi recusado ser familiar do Santo Oficio, em 1697 por ser descendente de cristãos novos de judeus. 
O habilitando, fidalgo da Casa Real, havia prestado serviço militar “na Província da Beira em praça de soldado e cappitam de infantaria por espaço de hum anno, e 6 mezes e 14 diaz”. Tinha sido procurador da vila de Pombal nas Cortes de 1679-1680. Pouco depois, a 2 de Abril de 1680, D. Pedro II havia-lhe feito mercê de uma tença de 12$000 réis com hábito de Cristo. O seu pai, Álvaro de Sousa de Vasconcelos, tinha servido, por espaço de 12 anos, nos postos de alcaide-mor e capitão-mor de Pombal. Lisboa, AN/TT, Registo Geral de Mercês, Ordens Militares, livro 14, fl. 264. A 9 de Abril de 1643, D. João IV “por o conde de Castel Melhor, alcaide mor da villa do Pombal, me pedir o proper a Alvaro de Souza de Vasconcelos, fidalgo de minha Caza, para servir o ditto cargo na mesma villa emquanto elle esta exercendo o de governador das Armas na província de entre Douro e Minho e tendo eu concideração as boas partes e qualidades que concorrem na pessoa do ditto Alvaro de Souza de Vasconcelos, que o fazem capaz de occupar este posto, crendo delle que na ocupação delle procedera com toda a satisfação, zello e fidelidade. Hey por bem e me praz por todos estes respeitos de prover do ditto cargo de Alcaide mor da villa de Pombal para que o sirva emquanto durar a auzencia do ditto conde proprietario delle e com a mesma jurisdição preheminencia e poderes com que elle o ouvera de fazer se prezente fora”, cf. Lisboa, AN/TT, Chancelaria D. João IV, livro 16, fls. 54v.-55.

O pretendente a familiar pertencia a uma das principais famílias da vila, era outros sim senhor e administrador das rendas de capela na igreja de Santa Maria do Castelo. Acresce que havia sido provedor da Santa Casa da Misericórdia da vila de Pombal, cargo que desde logo evidência tratar-se de um poderoso local e o poder que exercia sobre centenas de indivíduos. Perante os dados enunciados não se vislumbraria uma recusa por parte do Santo Ofício. Mas esta acabou por acontecer. O Tribunal descortinou que o bisavô paterno de Diogo havia sido casado com D. Leonor da Silva, neta paterna de Jorge Leão cristão-novo “que dizem foi dogmatista” - Poderá tratar-se de Jorge Leão preso pelo Santo Ofício na centúria de Quinhentos pelo crime de judaísmo. Já estava preso em 10 de Janeiro de 1545. Foi libertado a 10 de Junho de 1548, sob fiança de mil cruzados, cf. Lisboa, AN/TT, Inquisição de Évora, proc. 11267.

Por outro lado, a avó materna do pretendente havia sido D. Brites, descendente da família Castro do Rio. O processo de habilitação ao Santo Ofício de Diogo de Sousa de Vasconcelos desapareceu o que poderá atestar um eventual branqueamento da memória, fenómeno verificado em outras instituições. Que consequência terá tido a recusa para este indivíduo? Sabemos que continuou a assumir posições de relevo na vila. Segundo Pinho Leal, em 1709, na sagração do novo templo da vila e trasladação da imagem de Nossa Senhora do Cardal, Diogo foi um dos homens que carregou o andor da Senhora. Augusto Soares d’Azevedo Barbosa de Pinho Leal, Portugal Antigo e Moderno […], vol. VII, pp. 132- 133.
Como tal o impacto da inabilitação teria sido comedido a nível local. 

É conhecido nesta igreja terem estado os restos mortais do Marquês de Pombal, antes da sua trasladação para Lisboa. 

Monumento sepulcral do Marques de Pombal antes de ser trasladado para as Merces em Lisboa
Igreja de Pombal de Nossa Senhora do Cardal 
                   
              
Excerto da História da Igreja de Fortunato de Almeida (...) "1 de Julho de 1698, foi concedido alvará régio para um convento de cónegos de São João Evangelista em Pombal ."
Excerto do arquivo da Torre do Tombo "(…) hum pequeno convento em que assistissem para honra sua “Senhora do Cardal” athe quatorze religiosos, o qual offereceu a Congregação dos Cónegos Seculares de São João Evangelista”. 
O conde escolheu um baixio de cardos onde corriam a céu aberto o leito de duas ribeiras, a metros da foz no rio Arunca, a motivar a desistência dos cónegos, como dos Loios, sendo desfavorável para a granja . A jurisdição do convento ficou com os Franciscanos de Santo António. Tinham 15 conventos, 8 missões, 2 enfermarias e um colégio, sendo cabeça o convento de Santo António de Lisboa. 
Diz-nos Frei Apolinário Conceição
" o convento mais antigo era o de Santo António da Castanheira, no qual eram celebrados as tábuas dos capítulos. O convento do Cardal ocupava a 13.ª posição, atrás do convento de Santo António de Penela e, à frente do colégio de Santo António da Pedreira, em Coimbra." 
O Frei Agostinho de Santa Maria, menciona em 1707
"na vinda a Pombal, do padre secretário da Ordem, para ver o andamento da obra com o mestre João Rodrigues, para agilizar a vinda dos religiosos “tem custado huma grande soma de mil cruzados em que também tem sua parte não só os moradores da Villa, mas os do termo – Santiago de Litém e Vila Cã; porque todos concorrerão segundo a sua possibilidade, pela affectuosa devoção, que todos têm para com aquella milagrosa Senhora”.

Provável que o conde de Castelo Melhor, nos dois anos que esteve em Pombal, viveu no Paço de Santiago da Guarda. Em 1687, teve permissão para ir a Lisboa. Mais tarde o rei D. João V , integrou-o no governo. Foi o 12.º  capitão donatário da ilha de Santa Maria, nos Açores, até à sua morte a 15 de agosto de 1720. Desconheço onde foi sepultado. 

O leitor quando passar pela Casa dos Condes de Castelo Melhor em Santiago da Guarda, Ansião, não deixe de apreciar o fecho do teto da pequena capela com o brasão dos Câmara de Lobos,  os condes da Calheta, que Luís de Sousa Vasconcelos foi o 6º conde da Calheta e o 4º de Figueiró dos Vinhos.

Teto com arcos manuelinos e o brasão

Há também bananas esculpidas

Excerto https://www.heraldrysinstitute.com sobre o apelido  Câmara

"Advêm  do nobre e antigo apelido do grande navegador João Gonçalves Zarco, descobridor da Ilha da Madeira. Era Cavaleiro da Casa do Infante D. Henrique, que o armou na tomada de Ceuta, e depois de descobrir a Madeira lhe deu a Capitania -Mor do Funchal. Por ter desembarcado  no sítio chamado Câmara de Lobos, lhe deu D. Afonso V, por Carta de 04-07-1460, o apelido de Câmara de Lobos, depois usado só Câmara, com armas novas, falantes. Casou com Constança Rodrigues de Sá, filha de Rodrigo Anes de Sá e de Mécia Rodrigues do Avelar, de quem teve numerosa geração que levou o sangue e apelido dos Câmaras às mais ilustres famílias. Do ramo primogénito provêm os Condes da Calheta, título que recaiu nos Marqueses de Castelo Melhor. A varonia manteve-se nos Condes de Vila Franca do Campo, depois Condes e Marqueses da Ribeira Grande, um ramo secundogénito dos quais, casando com a herdeira dos Cabrais Figueiredo de Alarcão, Senhores da Ota e da casa de Belmonte, deu origem aos Condes de Belmonte. Outras ilustres casas titulares como os Câmaras, Condes da Taipa, Câmara Leme, Condes de Carvalhal, etc. deram continuidade ao uso deste ilustre apelido. "

Na Aguda, no concelho de Figueiró dos Vinhos temos o apelido Câmara, Pestana, com origem na Madeira . O apelido Figueiredo no Avelar, em Ansião e Alarcão foi vivo no Espinhal, Penela e Ansião.


FONTES

Memorias Paroquiais de Olival, Ourem de 10.06.1758 - Vasco Jorge Rosa da Silva Câmara Municipal de Ourem 2012

Grupo Amigos de Ourem e o seu concelho
Dissertação de mestrado de Vinícius Orlando de Carvalho Dantas de 2009
Memórias Paroquiais de Pombal de 1721
História da Igreja de Fortunato de Almeida
Frei Apolinário Conceição
Arquivo ad Torre do Tombo
https://www.heraldrysinstitute.com
Facebook: Politica, Historia e Património de Portugal A lenda de Nossa Senhora do Testinho do Estreito

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