quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Hóspede indesejado analogia ao Hospital de Santiago de Setúbal!

Ontem, o calendário ditou viagem a Setúbal, ao Hospital de Santiago pela primeira vez.
Quem passa na estrada parece de fraca afluência(?), puro engano, antes das 9 H da manhã, no  seu tardoz a norte, já os patamares de estacionamento se mostravam repletos, sorte nossa em ditar estacionamento  no lugar de um utente já despachado, que se chega em descida pela escada em pressas ...
Como nota menos abonatória seja o meu papel  de cliente misterioso(?) e observador, nesse pressuposto dei conta que na entrada no balcão das Informações, onde nos abeiramos, não tivemos o acolhimento devido, sendo que apenas nos foi informado para nos dirigirmos ao primeiro andar e virar à esquerda. Uma vez no primeiro andar reparei que no átrio havia uma funcionária que chamava utentes para a especialidade de ginecologia, a quem de novo questionei ao que vinha, e me foi facultada a mesma orientação, sem contudo esclarecer que tinha de tirar senha, cujo monitor estava ao seu lado, para depois me dirigir ao balcão ao fundo para fazer a inscrição do exame marcado, e disto não há avisos. Dirigimos-nos à sala de espera, onde permanecemos uma valente hora sentados, até que  ao mexer na pasta para tirar um livro para ler, a senhora da frente repara que retiro uns papéis, e sem hesitação nos aborda questionando em maré de boa hora "Os senhores desculpem, constato que estão com os papéis, e pergunto se tiraram senha e fizeram a inscrição para o exame no balcão?"...
Lamentável é constatar uma entidade de saúde que obriga à entrega de um questionário onde se ressalva de qualquer dano ou prejuízo de saúde que possa ocorrer com os exames aos utentes com  sedação , não assumindo quaisquer responsabilidades, do que possa eventualmente de menos bom acontecer , sendo que alguém uma vez lesado, fica assim ilibado de poder exercer o seu direito à reclamação,descartando-se a empresa com esse compromisso previamente assinado e entregue...
Pois, foi grande alívio o fato de ter sido uma anónima, que também estava na espera para realizar o seu exame médico, que se deixou dos seus cuidados, em prol de fazer o trabalho de cidadania que deveria ter sido feito pelas empregadas, até porque lhes acresce um ordenado remunerado-, seja no balcão das Informações, atendimento no átrio do 1º andar, e ainda da empregada que faz a chamada das pessoas para o exame, tendo sido todas questionadas, sem nenhuma nos perguntar o que deveria ter sido questionado, se já tínhamos a inscrição feita! Como isso ainda é pouca sorte, porque o balcão onde se faz a inscrição encerra às 10 H , abrindo depois na entrada do corredor de acesso aos exames, sem que a funcionária ao entrar neste posto ao serviço se mostra sem o mesmo  cuidado de questionar os utentes-, se todos tinham a inscrição efetuada.
Portanto passámos por quatro funcionárias, que se revelaram no mínimo, de fraco atendimento personalizado, sem grande preocupação pelo utente, em explicar, sobretudo ajudar!
Assim devo a satisfação de termos sido atendidos em tempo útil, embora com grande atraso, a uma simples anónima, gente do povo, alentejana-, olha a nossa sorte, única ajuda na prestação e conduta da boa informação, a quem endereço boa saúde e o meu bem haja, porque mulher de bom gosto o será, atendendo ao seu sobretudo alentejano em verde ervilha com bela gola de pele.
Pelas 11, 30 H desloquei-me ao 4º andar ao Bar, optei pela subida da escadaria em degraus de granito com abençoadas janelas abertas para a claridade vinda de sul, a meu ver deveria o arquiteto ter apostado em palas, para no verão a cortar na demasia, porque deve ser ambiente abrasador...
Contudo as vistas são espetaculares a lembrar o ilustre da terra o poeta Bocage!
"Um dos mais atormentados poetas da literatura portuguesa, sobre “tormentos íntimos” que se plasticizam e adquirem, frequentes vezes, a figuração de um fantasma: do ciúme ao desamor, da glória à morte, do Fado à sombra tutelar de Camões (benigno fantasma-émulo).
Não tremo de que os séculos me ultrajem: 
Lá (mercê do pincel, mercê do canto) 
Meu nome viverá, e a minha imagem.
 Bocage"

No lembrar o mesmo nome - Bocage, dado à paisagem de prados, no casodas antigas quintas, vestidos neste agora de verde, serpintados de flores brancas e amarelas a chamar a Páscoa, sendo que ainda estamos em janeiro, ornados de sebes altas, sem poda, onde ainda distingui uma sequência de colmeias...
Avistando o norte ao longe em local estratégico, confluência  de serras, o morro da vila de Palmela com o seu grandioso castelo e estalagem.
Na meia encosta onde se distingue ao meio um esqueleto de pedra e cal, sem teto e sem velas, do que foi um moinho de vento.
Vistas ao longe da cidade de Setúbal a nascente

Vistas a poente
Vistas a sul, o portal da quinta Vidais com um lindo portão em ferro forjado com painel azulejar na frontaria, com casa solarenga na meia  encosta.
De paredes meias para nascente outra quinta, mas a casa de telhado abatido e a palmeira morta...
O Bar, onde degustei um esplêndido abatanado curto com um bolo-,  um ovo estrelado, há anos que não saboreava um café tão saboroso, sem açúcar e o bolo fresquíssimo, doce no ponto, que me derreteu as papilas gustativas de prazer ali  sozinha, apesar de sentada na mesa a regalar o olhar espraiado na pradaria vestida de verde, fatalmente me inspirou a sonhar!

De volta à sala de espera, a manhã já ia alta, logo eu que nem sou de leituras, mas mulher prevenida, na pasta com um livro-, compilação editada na década de finais de 50 com fascículos vários, por isso o título "Vária", onde destaquei uma fábula do Teatro do Trabalhador "O hóspede Indesejado" de Rui Vieira Miller Simões , incrivelmente me deliciou, e por isso fica a minha impressão para mais tarde voltar a recordar e a deliciar-me, tenho a certeza!

O enredo desenrola-se à volta de uma família  de um casal com uma filha noiva, que vivem numa casa modesta, sendo o único rendimento o do homem da casa, o Sr João, com ordenado de guarda livros numa fábrica.Fiel e humilde trabalhador ganha a confiança do patrão que nutre por ele estima, mas também pelos demais funcionários, por isso mesmo decide um final de dia reunir depois do laboro para os informar que pensa proceder a um aumento de salários. Em função da reunião, o noivo da filha do guarda livros, também vendedor na empresa, se chega atrasado na visita à noiva  em fim de dia, invocando a razão- o aumento de salário. Mote que desperta a mente fértil das mulheres-, mãe  e filha a pensar alto no que poderão comprar para o enxoval, com o aumento de ordenado...Até que se chega o homem da casa, o nosso guarda livros, não fala do aumento, antes fala do que o perturba - o patrão tinha-o chamado a recato para lhe pedir um favor, albergar na sua casa modesta, um primo romancista, na pretensão deste querer  viver a realidade das gentes, para escrever um novo livro, tendo a escolha recaído nele por o considerar um homem dedicado e de vida modesta, sendo a aposta certa para o receber, apesar de fazer questão de cobrir as despesas.De cariz desanimado, por não ter conseguido dizer não ao patrão, por saber da estima e considerarão que sabe o tem, mas por saber que não tem condições para receber o senhor doutor, por a casa ter parca mobília : a secretária com o pé descaído, não se poderia apoiar nela que podia descarrilar, tinha de lhe dispensar o seu quarto com mobilaria completa, a cama onde nasceu, o  seu pai, e não sabe se mais algum antecedente, e assim deslocado para dormir no quarto da  sua filha que por sua vez se acomoda no quarto de guardar as malas pondo um colchão no chão...
A cabeça não lhe deixava de andar à roda, a pensar  como haveria de receber o hóspede indesejado, ainda por cima sendo a mulher com a mania das grandezas, em mostrar o que não é, que mal ouve tanto desalento não hesita em virar o jogo a seu favor, e assim decidida diz-lhe que vai subir para ir bater na casa do vizinho, invocando " os amigos são  para as ocasiões" na sorte deste lhe emprestar a mobília de torcidos do escritório ,comprada recentemente, para fazer vista na sua casa em prol da secretária com o pé descarrilado.. conversa fervilhada entre vizinhos, onde se juntou a fome com a vontade de comer, o vizinho acede ao pedido da mulher atrevida, que  ainda lhe diz que precisa de dois maples, para ele se sentar comodamente, a que o vizinho sem incómodo lhe responde que tem um amigo que faz aluguer de mobiliário, e sendo a seu pedido, o aluguer ao dia sairá mais barato, mas por já ser tarde,  fora de horas, descem para vir comunicar as decisões ao Sr João que assim pode dormir descansado, que  logo pela manhã a mobília descia para a sua sala e ainda vinham maples e reposteiros de veludo, para cobrir as janelas-, mas o bom homem, nada dado a mentiras nem embustes, mal consegue dormir com o maquiavélico esquema engendrado pela mulher  em coloro com o vizinho, ali na sua frente montado, sem lhe deixar alternativa, pelo entusiasmo em não deixar ficar mal alojado, o hóspede indesejado. No dia seguinte, no final da tarde, chega-se a casa o Sr João com a mala do hóspede nas mãos, logo no primeiro impato a mulher e a filha se entreolham, porque no seu pensar julgavam se poder tratar de homem mais novo, sendo que este se apresentava de meia idade e um pouco obeso, mas pior foi o dono da casa ao constatar a transformação da sua sala, que além do empréstimo da mobília do escritório e dos reposteiros de veludo ainda havia uma carpete... Troca de cumprimentos, encaminha-se o hóspede para acomodar a sua mala no quarto para voltar à sala onde se senta confortavelmente, interrompido pela dona da casa, que invoca que a criada se teve de se ausentar à sua terra, por isso deixa a bandeja com aperitivos para cada um se servir. 
O hóspede perante a escolha de Anis opta por beber um Porto, que degusta a contento perguntando a sua origem,  e mais uma vez a dona da casa em tom alteroso se gaba, dizendo que é da sua quinta no Douro, sem querer saber o mau estar que as mentiras provocam no seu marido espantado e aterrorizado ... 
Estupefacto o hóspede, interroga-a sobre a quinta no Douro dizendo-lhe "como a gente se engana:o meu primo disse-me que me aguardava um casal modesto, mas de viver são e, afinal, encontro-me no meio de grandes vinhateiros do Douro. Agora compreendo o luxo destas instalações...A que lhe remata o dono da casa " é um exagero, senhor doutor...nós...nós...a que a talhe de foice acrescenta a mulher "Sim, é um pouco de exagero. Na verdade, não somos o que se pode chamar grandes proprietários. Longe disso!Mas temos alguns rendimentos que nos permitem vir um pouco acima daquele nível de vida que o ordenado de meu marido permitiria. Mas a minha avó o devo agradecer, pois foi ela que me legou a quinta de que há pouco falei. Eu era a sua menina bonita..." A que responde o hóspede " Folgo imenso em saber isso. E, meu primo, por certo, também gostará de saber que o seu melhor e mais delicado guarda livros - e isto são palavras dele - não é um pelintra qualquer. Pois, sem dúvida, nem pela cabeça lhe passa o que a sua modéstia esconde, a avaliar pela maneira como ele me falou de si." A que responde o Sr João, o dono da casa " O senhor diretor é a bondade em pessoa e tem-me distinguido sempre de uma maneira que eu mereço cada vez menos."  em remate o hóspede responde "Não: é uma pessoa que sabe reconhecer os serviços e as necessidades dos seus empregados."  finaliza o Sr João, o dono da casa " Sem dúvida: norteia-o um espírito de justiça e um sentido das realidades que é raro encontrar-se numa entidade patronal.Isso lhe granjeou justa simpatia entre todo o pessoal. E digo isto sem qualquer sombra de lisonja" dando mote ao hóspede em retorquir " Mas há descontentes, por certo." Para receber de resposta "Sim, mas os descontentes nunca faltam em parte alguma. E se uns tem razão, outros carecem dela em absoluto."  a que o hóspede lhe diz " Hei-de transmitir a meu primo as suas palavras"...
Ambos trocam elogios e galhardetes, até que na conversa a mulher da casa o questiona " Um nadinha de ambição não fica mal a ninguém, não acha senhor doutor?" A que ele lhe responde " Sim, mas apenas na medida em que a ambição constitui um estímulo para proveitosos cometimentos. Não já como fim em si. Pois devo dizer-lhe que comecei bem a minha digressão:já recolhi os primeiros elementos para o romance que tenho planeado" Surpresa a mulher da casa diz -lhe " Mas com que rapidez, senhor doutor".  "Sim, com uma rapidez com que eu próprio não contava. Mas a nossa conversa foi tão interessante e tão proveitosa que quase farei dela um capítulo, talvez o capítulo, do meu romance." Espantada responde a dona da casa 
" Nunca imaginei que viesse a ser inspiradora de quaisquer páginas de qualquer livro." para no calor do contexto o hóspede dizer " As coisas mais inesperadas saem, às vezes, de onde menos se esperam. Quem sabe quantas surpresas não nos estarão ainda reservadas?"
Irrompe na sala a filha do casal dizendo que o jantar está pronto, quando quiserem...a que acrescenta  a mãe "Coitada de ti Linda! Pus-me aqui à conversa e nem me lembrei de te ir ajudar, Por certo, o senhor doutor não se importaria que o deixasse por uns momentos." A que lhe responde cortezmente "Sem dúvida, minha senhora!Tive muito prazer em a escutar, mas o certo é que não quero causar perturbações na vida da casa. E então, agora, que estão sem criada, calculo o que não deve ser."
Levantam-se na sala as três vozes  " Estamos às sua ordens, senhor doutor!Quando quiser dar-nos o prazer..." Todos se encaminham para a mesa, onde degustam um jantar que se prolongou até tarde, recheado de boas iguarias, que a dona da casa pôs à prova a sua arte culinária,  até aí desconhecida para o marido que jamais se apercebera que a mulher era dona de tais dotes culinários assim tão apurados.O serão continuou  na verbosidade da dona da casa queixando-se da pequenez da habitação, invocando que mal se respira nela...por outro lado coitado do marido, farto de tanta farsa e mentira, retorcendo-se na cadeira incómoda que lhe coube , ansiando que a comédia termine e rápido!
Hora de se recolherem aos seus quartos, a filha fatigada ainda teve de arrumar a cozinha e com um dia de inquietações adormece  rapidamente.Já o hóspede, o romancista fértil, mirou o leito histórico antes de se deitar e já deitado,ainda alinhou apontamentos num canhenho. Quem não dormia eram os donos da casa na vontade de se agatanharem mutuamente...a mulher a espicaça-lo "Por mais que uma vez me ias deitando tudo a perder..." repenica em resposta rápida o marido " Era o que tu merecias! Não te bastou a fantochada que arranjaste: quiseste ir mais longe com essa série de mentiras que não sei onde nos levará." mas a mulher não se quer ficar sem resposta e ainda lhe diz " Não sabes? Pois talvez nos abra as portas da casa deste cavalheiro tão distinto. Vais ver como ele nos convida quando se for embora!São novas relações que vamos criar, é uma janela que se abre para outro horizonte, como dizia o vizinho cá de cima quando lhe fui pedir a mobília emprestada"... Visivelmente nervoso e irritado diz-lhe o marido " Deus queira que forte ventania não acabe por te fechar essa janela na cara." a que lhe remata a mulher "Bom casmurro me saíste!" 
- Casmurro?! Eu só quero é que me digas com que cara vou aparecer ao diretor quando ele souber desta comédia: vou passar por trapalhão, por vigarista...eu sei lá mais que mais..."
A mulher desata de resposta afiada na ponta da língua " Só te lembras disso!...Mas não te ocorre que podes alcançar na fábrica um lugar de maior categoria. "
- "Que outro lugar? Só sei ser guarda livros não tenho habilitações para mais.Mas ainda que assim fosse, o que me interessa é que me arrisco, com esta fantochada toda, a perder a confiança do diretor."
- Diz-lhe a mulher "Não vejo motivos para tanto..."
- Não vês?Pois diz-me lá que pensarias de um tipo qualquer que nunca aparentou senão mediocridade económica e que, de um momento para o outro, aparece como um magnate do vinho do Porto. Não pensavas nada, com certeza...A cabeça nem para isso te serve..."
Amofinados um com o outro, cada um tinha as suas razões, os seus argumentos, velhos atritos entre um e outro, a invocar a propósito disto e daquilo, até que acabaram por se cansar, sendo que não vinha longe o alvorecer quando finalmente pegaram no sono, por isso acordaram olheirentos , bocejando, já o hóspede indesejado tinha tomado o pequeno almoço servido pela filha Linda, disposto em abandonar a casa às primeiras horas de sol da manhã, disposto ainda em arrumar a secretária, por ter o inquérito feito: 
"Pessoas do agregado familiar, três e uma criada...habitação regular com mobiliário e decorações de um modo geral excelentes...qualidade da mesa, excelente...rendimentos próprios, uma quinta no Douro com benefício de vinho do Porto...e por sinal bom, na verdade nunca bebi um assim bem bom!O que me parece bastante para concluir que o homem desta casa vive mais como um novo rico, do que como modesto guarda livros, e arrumando os papéis na sua velha pasta de cabedal dá a missão cumprida mais depressa que o julgava."
João atrasado pela primeira vez  na vida na chegada ao escritório, fazendo analogia ao velho ditado popular "um mal nunca vem só" e pede desculpa de interromper o hóspede que julga estar a trabalhar quando este o surpreende " Não me perturba nada, tanto mais que tenho o meu estudo por assim dizer concluído; o trabalho deste dia rendeu-me imenso e tanto que, hoje mesmo me retiro, se me der licença.".
Visivelmente espantado pela rapidez da hospedagem grita a chamar pela mulher e pela filha para as avisar...
Ao que o hóspede lhes responde " O vosso acolhimento simplificou-me imenso a minha tarefa, e antes de me ir embora tenho de vos pedir desculpa, porque nem sou senhor doutor, nem primo do diretor da fábrica, nem romancista...Estupefacto dia o homem da casa " Essa agora!...Mas que brincadeira é esta?"
A que lhe responde " Sou apenas o senhor Silveira, um dos membros da comissão nomeada pela direção da fábrica para proceder ao estudo do aumento dos salários ao pessoal."
O bom homem, o senhor João caiu na cadeira sem palavras, bocejando " mas...mas...então..."
Reforça o bom do Silveira " Como já lhe deve ter constatado, é intenção da direção da fábrica conceder uma melhoria de salários a quantos nela trabalham. Mas essa melhoria pretende-se que seja proporcional às necessidades de cada um, de modo que aqueles que mais precisam tenham um aumento mais substancial em relação àqueles que, por exemplo, não vivam apenas sobre o salário que auferem na fábrica, como é o seu caso.Estamos, pois, a proceder, como nos é possível, aos estudos necessários a uma perfeita realização deste plano. O que quer dizer, apenas, que me servi deste meio para auscultar as suas necessidades, agindo, aliás, deste modo, por determinação expressa do diretor da fábrica. Ele tinha a impressão, e muito lhe pesava que assim fosse, que o senhor vivia com grandes dificuldades, pelo que tencionava subir-lhe o ordenado para o dobro, atendendo também à sua antiguidade na firma. Seria como que uma compensação "
Balbucia a mulher do guarda livros..."Subir para o dobro..."
Finaliza o Silveira, " Mas não queria dar tal passo sem estar senhor de elementos seguros que lhe permitissem justificar o que poderia parecer um aumento desmesurado. Por isso me mandou como seu enviado."
Revoltada a mulher prolifera "Eu nem quero acreditar." O Silveira estando ciente dos elementos aflorados invoca " não ter necessidade de se demorar mais tempo, e assim se despede para dar contas do seu serviço, levando, aliás, consigo, a certeza que que eles concordam em que o beneficio que lhes estaria reservado, vá para quem, vivendo apenas do seu salário, não goze da confortável abastança que lhe proporcionaram. Não é assim? E se me dão licença, retiro-me. Já aqui tenho a minha mala...só me resta despedir-me de todos e agradecer o vosso acolhimento. É o romancista, o senhor doutor que vos agradece. Em cada um de vós, espero deixar um amigo, não é assim?..." Fecha a cena, a filha Linda , decidida que se adianta "Sim, senhor Silveira!Pode ter a firme certeza de que nunca o esqueceremos!Foi tão...como direi? Tão eloquente como um moralista..." E nas derradeiras palavras de agradecimento pela grata fidalga  hospedagem se despede com vénias dedicadas às senhoras e ao guarda livros que de mão estendida, desalentado ainda  lhe ouve o elogio; " Senhor João, agradeço-lhe também mas por dois motivos: primeiro, pelo seu acolhimento que me desvaneceu. Quero dizer: que desvaneceu o senhor doutor...Depois, por me ter proporcionado a oportunidade de fornecer o meu modesto contributo para uma mais equitativa repartição das riquezas."
Mal saí de casa o hóspede indesejado-, os três revoltados, qual maldição do destino vêem cair os reposteiros pesados de veludo, por ter sido postos às presas na parede de tabique, sem tacos de madeira, que não se aguentaram nos pregos ao ouvir tanta mentira e assim lamentavelmente frustrado, em final de cena,  se deixa cair de corpo morto na cadeira o senhor João, que com o peso, esta se desconjunta o deixando prostrado e  desterrado na carpete que lhe amortece os osso...e ainda sem saber do valor da conta do aluguer!
Com a fábula a chegar ao fim sou chamada pelo nome pelo enfermeiro que me encaminha para junto da máquina do chá, onde deixara o meu marido sentado a comer bolachas, e delicadamente  me pede para puxar a cadeira, e a três fala dos exames de forma explicito, sendo que já antes tinha gostado da tramitação em sempre chamar o acompanhante do utente que faz o exame, atitude que confesso não estava habituada , onde em parcas palavras mostrou desenvoltura, assertividade e confiança, que nos deixa na saída tranquilos. 
Hora de abandonar o espaço de cariz satisfeito e ainda assim aliviados, para na saída a sinalética se mostrar deficiente, pois em pressa o porteiro salta da casota para dar o alerta - melhor seria,  se tivessem placa identificativa  bem visível para se contornar o posto do segurança na entrada!
Analogia sentida no Hospital de Santiago com a leitura do hóspede indesejado, acomodada em bom ambiente, apesar da leitura apressada, por achar o texto hilariante, ainda assim sem esquecer em deixar recados!

FONTES
Livro "Vária" fábula do Teatro do Trabalhador de Rui Vieira Miller Simões
http://www.uc.pt/fluc/eclassicos/publicacoes/ficheiros/humanitas62/15_bocage.pdf

domingo, 24 de janeiro de 2016

Fotos a preto e branco na idade da inocência, gente de Ansião

O meu primo Afonso Lucas, partilhou algumas fotos de crianças de Ansião, recolhidas nos escombros da casa de fotografia Jaime Paz , de paredes meias com a sua loja também de fotografia.
Relíquia histórica, a meu ver deveriam merecer destaque como outras em mãos de particulares pelo valor credetício vir a ser património fotográfico em  ala especifica no futuro Museu que ainda não existe em Ansião, e até parece inacreditável!

Valente, foi o meu bom amigo, o Prof  Arnaldo Silva de Torre de Moncorvo, comprou a casa do primeiro fotografo da terra na zona histórica. Endividou -se para a recuperar e nela instalar o Espaço Museológico do Douro Superior. Admirável tanto espolio com fotos de casamentos, do quotidiano, tradições e de muita gente.  

As fotos das crianças valem pelo testemunho da época, com crianças que se apresentam genuínas, ingénuas, mas também pela simplicidade do cenário, onde não se distingue qualquer preocupação do fotografo em fazer arte criativa (?), nem sequer usa a técnica do lençol a tapar a parede para dar realce à foto.
Há crianças que se mostram para a câmara com ar assustado, arregalado, amedrontado, espantado, intrigante mas também risonho. Devem ter sido tiradas na década de 50. 
Julgo que alguns olhares consigo identifica-los sem contudo saber os nomes...
Esta menina é muito bonita será a Elvira André, fico na duvida pela semelhança com a Helena Coelho que viveu no Cimo da Rua.
 
Bela expressão!
Esta foto tem uma expressão extraordinária já ao tempo aventava o futuro, pela pose de modelo - a Alzira, filha do Zé Saguim, vive no Mogadouro, explora uma loja de roupa de mulher, no prédio do Sr Bernardino na vila.
Olhar sério...
Quem serão as gémeas?
O sorriso do bebé na esquerda lembra os Serras do Escampado(?)
O meu neto Vicente tem este olhar maroto...
Olhar atento na câmara e o outro espantado
Esta expressão também me é familiar, agora saber quem é...
Graciosas, uma vestida de branco e a outra atrevida de mini saia e chapelinho na cabeça
Também cheguei a vestir-me de anjinho nas procissões, aqui vestido de S. João, mas não sei quem é...
O miúdo assustado parece que engoliu um palito...
A graça dos vestidos , o primeiro com combinação e rendas onde não faltam os casaquinhos de malha
Quantas crianças se sentaram nesta cadeira?
Supostamente foi a modista D. Lucinda do Fundo da Rua que me fez a fatiota, e o seu filho Virgilio Valente , mais velho do que eu 4 meses, experimentava até ao dia que se cansou e bateu o pé "não sou menina para provar vestidos) enfeitado com a gola em plástico por cima da gola da blusa, uma novidade que a minha mãe comprava em Coimbra na cave de gaveto da Praça Velha na única loja de chinos que na década de 60 existia na cidade.
Euzinha em pé, ainda tenho a mania de ficar com uma perna na linha da frente...
Aqui com a minha irmã
Interessante o rodapé das fotos com manchas pretas do cenário...o alpendre telhado aberto a norte ...

FONTES

Cortesia da partilha do meu primo Afonso Lucas

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