quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Estórias de cachopos do Bairro de Santo António em Ansião

O que-fazer das crianças no meu tempo de cachopa no Bairro de Santo António … 
Sempre se ouviu dizer que a brincar a criança aprende a ser no dia-a-dia - homem ou mulher  construindo e revelando passo a passo a sua personalidade. Nos meus tempos de miúda éramos capazes de nos divertir a fazer troça do que quer que fosse: um simples rir; incitar bulha; imitar os pássaros; troçar do cambalear dos homens bêbados; pedir como os mendigos e ciganos; comandar o trânsito como os polícias sinaleiros; fazer de árbitros e relatores de futebol; apresentadores de televisão; brincar aos médicos; às princesas, andar aos grilos e, …Dependia da nossa imaginação momentânea e daquilo que nos desse na real gana. Praticávamos assim a nossa imaginação criadora em exercícios da liberdade de crianças inocentes como “roubar fruta, num tempo que havia pouca” - então não me lembro por detrás da fonte da Lagoinha ao Pinhal, subíamos ao muro da casa dos velhotes para apanhar laranjas, na quinta do Bairro junto ao poço da Ti Laurinda íamos às cerejas, mais à frente a caminho da Monteira de Baixo, dizimávamos os morangos na roda dos poços de gente do Escampado, uvas, pêssegos, maçãs riscadinha nas Lameiras, ameixas vermelhas na fazenda ao pé do cemitério... Naquele tempo os cachopos afrontavam o “Toino Trinta “ no dizer que não comia fruta em casa, só da que nós roubávamos, ainda íamos às amoras, nozes das nossas nogueiras, e medronhos da quinta do Dr. Faria em Novembro. 
Havia outras brincadeiras e jogos coletivos: jogávamos à roda; à parda; reis e rainhas; à corda; à macaca; ao botão; ao burro; ao pião; ao berlinde; à bola; andar de bicicleta; subir às árvores e,...Cavalgar no cavalinho -, a grande raiz aérea do plátano ao lado da escadaria da Capela de Santo António, que no tempo a encosta foi atulhando e encontra-se neste agora quase soterrada.

Entretínhamos-nos nos escorregas de pedra onde as cuecas se rompiam em fanicos e buraquinhos...
Outro entretêm era a dizimar carreiros das formigas do adro apesar de sabermos que se fartavam de trabalhar para encher o celeiro para o inverno enquanto as cigarras se derretiam a cantar - adorávamos apanhar grilos com junco nos esconderijos cilíndricos arquitetónicamente elaborados, pela noitinha dávamos caça aos pirilampos que se chamavam luzicus… A cachopada do Bairro onde eu e a minha irmã nos incluíamos, desenvolvíamos uma socialização - a nossa - apesar de irrequietas, e criativas reforçávamos o nosso espírito coletivo, mas também havia muitas vezes que nos desentendíamos uns com os outros, e todos levavam nas “trombas” porque conforme diz o rifão: “Quem vai à guerra, dá e leva” - safei a minha irmã que gostava de os atiçar e afrontava com certas atitudes que alguns não aprovavam. Dava-lhe um gozo especial mandar, sempre teve carisma de líder, no limite da afronta mandava-os estender no arame as nossas cuecas… Alguns deles ao tempo “armados em xico espertos” recusavam-se a fazê-lo, como o “Tonito da São”. Valia-lhe eu nas zaragatas desta rebeldia, quantas vezes me fiz a eles em sua defesa, tal a minha força de mãos, unhas e dentes -, mal daquele que eu apanhava, todos fugiam de mim, sempre me tiveram muito respeito. Passado algum tempo fazíamos as pazes, continuávamos a brincar juntos outra vez, e a levar e dar porrada também. Nas nossas brincadeiras, o que contava era a imaginação sem limites, e a arte do desenrasca em que o português ainda hoje é mestre, nesses tempos para além das brincadeiras, sempre tive gosto por coleções, entre elas, selos e postais, as cadernetas de cromos constituíram a minha iniciação à leitura e à literatura, a primeira abordagem à História de Portugal, a partida à descoberta do mundo de outros povos, e de outros costumes que eu e a minha irmã já conhecíamos pela televisão, e os outros miúdos não. Em 69 apareceu a série televisiva “Pipi das Meias Altas” uma miúda irrequieta de trancinhas ruivas e meias às riscas coloridas, a loucura de fazer a caderneta de cromos, também outra série francesa deu-nos mote para formar uma sociedade “o clube dos cinco” sendo os sócios, os cachopos do Bairro –, o jogo consistia na troca de coisas uns com os outros. Um dia o ” Tó Zé da Carmita” não tinha nada para a troca foi à casa da Deolinda, em dia que cumpria castigo imposto pelo pai Carlos Pego, estava “presa à mesa” o malandro do Tó Zé não hesita em lhe roubar um tanque de lata feito pelo pai dela e foi-se embora. A Deolinda mal acaba o castigo desata a correr no encalço dele com fé de reaver o tanque -, o Tó Zé não foi de modas, era rapaz levado da breca, com génio e armado de humor sarcástico o atira na frente dela para o silvedo da Cerca, em frente da casa. Nesse dia não houve troca no clube dos cinco, nem mais brinquedo para se brincar. Nestas trocas e baldrocas trocou-se uma libra de ouro da minha mãe que tinha deixado em cima do armário da cozinha -, à falta de coisa melhor, tal a luz que resplandecia, foi-se para sempre! 
Decerto que foi com a caderneta dos Trajes típicos de todo o mundo que eu fiquei fascinada pela Etnografia, antes de saber que entre nós, Garrett tinha sido o precursor, Leite de Vasconcelos o fundador e Luís Chaves e outros mais, os continuadores. Também muito ajudou os jogos da Majora comprados num bazar de Coimbra: xadrez; damas; trajes regionais do folclore português; jogo do galo e o monopólio, todos foram as minhas pastilhas de Cultura, o meu software, antes de terem inventado as consolas eletrónicas que programam e condicionam hoje o divertimento.
A rondar a extrema do quintal -, as "capelas imperfeitas" só lhes faltava as portas, nada mais do que duas casinhas baixas, idealizadas para galinheiro, feitas pelo primo Chico do Bairro -, que nunca o foram-, uma era minha, outra da minha irmã ,onde se brincava muito às donas de casa até usufruíamos de adega, sendo os pipos as latas do Milo com torneira feita na tampa com um prego fechado com um espicho de salgueiro. Predileção usar os serviços de porcelana SP de Coimbra da casa dos nossos pais guardados na sala -, fosse o de café ou de chá para servir os convidados nos batizados das bonecas, os cachopos nunca tinham visto loiça brilhante e bonita… A minha casa era uma azáfama o corropio de cachopada fosse pela nossa alegria contagiante, fosse pela fartura e grande atividade em inventar coisas além da liderança da comandita pela minha irmã "Maria rapaz" em fazer coisas e tropelias de mente fértil "do arco da velha ,trinta por uma linha". 
Havia tudo na minha casa para os distrair desde televisão que nenhum tinha, rádios, telefone, brinquedos, jogos, e comida. Inventávamos idiotices de bradar aos céus, chegou-se a fazer galão com água e barro do barreiro ao pé do "cavalinho” ,isto porque a minha irmã nunca foi de beber leite nem comer queijos, nem o cheiro. Bebia-se qualquer coisa naqueles tempos, nada fazia mal , não se falava em viroses, também não havia leite, só em pó, anos mais tarde houve uma vacaria no Fundo da Rua. Tanta loiça que se partiu naquelas festas a fazer de conta, lembro-me que um dia com as pressas fui à cristaleira da sala de jantar, não sei a força que fiz, num relance vi a prateleira cair, partiu-se praticamente tudo. Fiel guardadora dos serviços de vidros da Marinha Grande, por sorte salvou-se uma garrafa e dois cálices de pé alto, relíquias guardadas na casa da minha irmã. No patim em frente da cozinha estendia-se o terreiro de terra batida ladeado por canteiros com capuchinhas a invadir o chão na sombra da frondosa figueira, uma árvore de extraordinária particularidade com um dos ramos principais grosso, que o tempo quis teimar em deixar deitado -, imitava na perfeição um banco, o nosso regalo, não havia dia que não fosse escalado, refúgio para esconderijo, também para prender o baloiço que me fazia ficar “sem pinta de sangue” tinha de suster a respiração…No tempo dos figos que eram muito grandes, apodados de "bosta de boi" num virote enchia-se o balde para os porcos, enxabidos, não se comiam . Na extrema dos quintais, a figueira de pingo mel da tia Maria, esses sim doces de mel. Lugar de excelência, poiso ideal, o dorso do ramo para se pescar, divertimento maior no final de verão quando as abóboras grandes trazidas da Lameira se empilhavam junto ao muro, escolhida a maior, mais bojuda, abria-se ao meio com a faca da “horta” enchia-se de água e flores a flutuar, em punho canas de pesca improvisadas por nós, usava-se guita encerada de cozer as lombadas dos processos que o nosso pai trazia do Tribunal, o carreto, esse servia um carro de linhas roubado da caixinha de costura, os anzóis feitos de arame dos fusíveis do quadro elétrico. Divertíamos-nos à farta, quem pescava mais tinha direitos, ditava ordens, fazia menos tarefas domésticas, na folga das criadas!
O Halloween - predileção em o festejar no dia 31 de outubro , o Dia das Bruxas na América -, não se julgue que imitávamos o que a televisão mostrava , também. O facto é que nos contavam ser ancestral a tradição, pelos vistos caída em desuso na nossa terra. Sentíamos um prazer em esculpir as abóboras com a “faca da horta" esburacar carantonhas, depois pô-las em cima do muro da casa defronte para o adro da capela. Quando a noite caia acendíamos mechas de algodão embebido em azeite que as iluminava e fazia resplandecer na noite fria e escura em luz tons laranja, efeitos da cor do miolo das abóboras porqueiras, porque as abóbora bolina aqui chamada de “Menina” não tínhamos autorização de sequer mexer,serviam para os velozes no Natal. No dia seguinte era esquartejada aos bocadinhos, servia de lavagem para os porcos...
Levantadas cedo, vestidas em traje domingueiro então não era dia ...Dia de " Todos os Santos " procurávamos na gaveta os taleigos, sacos feitos de retalhos de tecidos que atavam com fita de nastro, ainda não haviam de plástico e em grupo com a comandita dos cachopos do Bairro de Santo António iamos caminhos fora apregoar cantilenas pelas portas dos vizinhos desde o Ribeiro da Vide, vila até ao Moinho das Moitas ver o rio Nabão que nessa altura já levava água na eira sem agriões...Em forte gritaria, entoávamos: Ti Maria dá bolinhos por alma dos seus Santinhos?
Na véspera do Dia de Ramos o caminho era ao Escampado de Santa Marta apanhar alecrim .
Boas lembranças dos cachopos desse tempo, hoje homens e mulheres: 
Toino e Mena Trinta; Deolinda e irmãos; irmãos Cunha; cachopas da Robertina; Tonito da São; Tó Zé da Carmita; Cristina e irmão,netos da Ti Ermelinda e,...

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Leitoa de pele estaladiça da Nexebra


Lembrança feliz d'hoje da Maria Andrade a viver na Bairrada, bafejo que me despertou o apetite para saborear um bom naco de leitoa de pele estaladiça, apimentada, bem regada com um bom espumante. O meu sogro e a minha mãe sempre lhe chamaram - leitoa … esse o jeito assim como era chamada em tempo de antanho pelos mais antigos na Serra de Nexebra. O meu avô José Lucas casou no ano da República, segundo o que sempre ouvi contar o primeiro leitão que assou em casa foi em 1912 no Ano Novo por ocasião do nascimento da sua primogénita Maria da Luz - a minha Titi, além de tia foi avó e quase mãe, amiga a quem nunca ouvi uma palavra mais alta.
Vista do miradouro da a Serra do Mouro sobre o vale e a Nexebra
A Titi -, irmã mais velha da minha mãe veio à luz no último dia do ano,  31 de Dezembro de 1911. Era sábado ao cair da noite quando os pais vindos de regresso da feira em Ansião onde tinham uma banca de tendeiros se viram aflitos quando irromperam as dores fortes, o certo foi apressar o passo do macho na descida da Serra do Mouro para pedir ajuda na casa de uma amiga na aldeia, onde veio a nascer, sendo que ele foi todo o caminho em rezas a confortar a minha avó para não a deitar em cama dos fardos de fazenda da chita da tabela, riscado de Santo Tirso ou do serrubeco e ali mesmo lhe fazer o trabalho de parto, sem ter prática, jeito, nem maneira na carroça, em terra de nenhures... A amiga foi a “aparadeira de serviço" ajudada pelo meu avô Zé Lucas que usou para cortar o cordão umbilical a mesma tesoura de cortar o corte de fazenda para o freguês, estreante nesta função e feliz nestas andanças servente como pode à mulher cheia de dores em grunhido forte e gemidos, de mãos presas aos varões da cama de ferro ainda assim bem melhor que fosse nos varapaus da tenda da carroça. Sempre me lembro de ouvir falar da tamanha felicidade que sentiu com a sua menina nos braços, a ajeitou como pode no colo da mãe ao aconchego do cobertor fino de algodão do Avelar que foi buscar à carroça, a estrear, e assim as deixou em paz para se fazer ao caminho de casa,  à porta assobiou ao macho que se aprontou para seguir marcha… A bebé menina de olhar doce foi-lhe dada a graça de Maria Augusta - Maria da Luz - nunca soube, sempre a conheci e amei tratar por Titi - mulher de pequena estatura, baixinha, graciosa, de cabelo escuro. Enternecedor o gesto do seu pai em querer fazer dela uma menina fina, não hesitou em a mandar para Coimbra estudar, para ser Professora. Aos fins de semana o irmão Alberto a ia esperar na paragem da carreira ao alto de Lisboinha às Alminhas, trazia-lhe a malita, fizesse sol ou caísse chuva vinham todo o Santo caminho desde o Pinhal do Índio a resmungar ( ele achava que ela era uma felizarda por estudar, talvez porque fosse um inteletual, lírico, poeta apaixonado,adorava tocar concertina, e ainda tinha de acompanhar o pai na profissão de tendeiro na rota sazonal do Alentejo tarefa de aprendizado que não abonava). A Titi sofreu na pele anos de chumbos, contudo o pai insistia sempre mais um ano…Apesar de inteligente, nada destituída, tinha azar nos exames, até ela se sentia mal, chegou a confidenciar ao pai para não gastar mais dinheiro, sentia que prejudicava os irmãos. No seu tempo no sótão da casa havia poceiros de abas a transbordar de sapatos e chapéus, aquela tia foi muito vaidosa na sua mocidade. Os pais a dada altura decidem acertar o casório com um filho de uns tendeiros amigos que abancavam ao seu lado nas feiras, gente dos lados de Ferreira do Zêzere, em dia marcado partem com ela para se conhecerem… O rapaz achou-a pequena demais para noiva!
A Titi não foi professora, acabou por concorrer para os Correios, denotando ser uma extraordinária funcionária nada despojada de atributos para o trabalho, frase que sempre ouvi da boca da minha mãe, sua colega… Melosas as tardes soalheiras com a sua chegada ao portão da minha casa, sendo mais velha vinte e quatro anos que a minha mãe -, para mim foi mais avó do que tia, e a minha mãe sempre a ouvi chamar de madrinha, porque em pequenita ouvia a irmã Zaira assim a chamar e, o jeito em a imitar ficou-lhe no coração. Arte tinha nas mãos e criatividade, em fazer do velho novo, com os lençóis que eu e a minha irmã nos entretínhamos a rasgar com as unhas dos pés -, sendo a minha mãe sua coadjuvante davam nova vida aos lençóis rotos com remendos, faziam acrescentos e peças novas: panos para a cozinha, cuecas, toalhas para a mesa da cozinha, combinações e bibes, que a minha mãe depois aprimorava nas noites de turno da meia noite no Correio velho com picô às cores...Era tão doce a Titi -, tal qual os doces e licores de leite, folha de figueira, tangerina que sabia fazer como o famoso prato de cacholada. Adorava comer na sua salinha com mobiliário em bambu preto e móvel de espaldar em madeira com faiança exposta, grande a janela em guilhotina virada a nascente para o terraço que deixava antever o canteiro da laranjeira ao meio, ornada de escadinhas e a um canto a gaiola do melro. No hall da entrada da casa havia um grande o vaso com o espargo verde a enlear o candeeiro, na cozinha a graça do minúsculo lavatório, ao lado a cadeira com tampo em corda trazida dos Açores da ilha das Flores onde trabalhou no início de casada , onde gostava de me sentar a conversar com ela ou com a criada Arminda. Guardo com carinho algumas peças que me fez para o enxoval, já em fase avançada na idade, com visão enfraquecida,  grande a estima apesar de pequenos defeitos. 
Conta a minha mãe que do namoro dela, tomou conta ” o Tonito chegava montado na bicicleta e apeava-se ao átrio do pátio, olhava para ela e dizia Dinita vai ao guiador buscar o que trouxe para ti” mote para roubar um beijinho à Titi, enquanto ela saboreava as guloseimas na vez de tomar conta do namoro , até ao dia que ele lhe levou castanhas piladas, e ela não gostou. A Titi foi mulher muito sofrida com a vida que o marido lhe deu num tempo que apesar de ter estudos e de ordenado igual ou mais, era ele que mandava, coitada sofria calada, sem ninguém quase se aperceber. Não reclamava, pacífica com um coração do tamanho do mundo ainda o tratava com carinho por Tonito…
Sempre me acarinhou como uma mãe, meiga era demais a Titi, boas recordações, só comparável ao deguste de um bom naco de leitoa!

QUE DELÍCIA

Uma tradição assar leitões na aldeia de Moita Redonda levada para a Mó em Chão de Couce , na banda norte da Serra de Nexebra onde a cunhada do meu avô a - Maria , mulher com veia para o negócio, deles fazia criação, mal lhes sentia pessanha os tentava vender antes que morressem por causa do prejuízo...Assim o dizia o meu avô Zé Lucas que depressa lhe conheceu tal engenho e arte, e o dizia em tom matreiro à minha avó Maria da Luz mal a via a subir a quelha do Vale  na Moita Redonda “ Luz , cuidado com a lábia da tua irmã cá para mim vem-te impingir leitões ...” 
Na Moita Redonda se assou muita leitoa no forno da casa dos meus avós, para dias de festa e piqueniques na Nexebra num tempo sem eucaliptos, só castanheiros, pinhal e flores. Esta arte de bem assar  o leitão continua no Bigodes no Pereiro, na casa do primo Agostinho Coimbra nos Palheiros em Maçãs D. Maria, e Ansileitões em Ansião...
Também bem me lembro dos que a tia Zézita assava no seu forno a lenha no Pereiro, tinha um buraco na parede ao fundo da cúpula para cravar o espeto de loureiro, passava o tempo a roda-lo para as orelhas não esturricarem.Deu-me a receita que escrevi numa folha de 24 linhas azul...
É sabido que os romanos já apreciavam este repasto, há documentos que falam dele no século XVIII no Mosteiro do Lorvão e no da Vacariça. Sendo que o convento do Lorvão tinha um pequeno em Almoster, Alvaiázere, relativamente perto num raio de 15 km(?) e como os frades fecharam o convento, se perderam(?) é possível que este repasto tenha no tempo nesta região ficado assim conhecido.
Faltou visão nos meados do século XX  ao meu avô Zé Lucas para não ter  apostado na sua propriedade no Bairro, numa sucursal da sua taberna, casa de panos e mercearia, tendo pela frente a estrada a caminho de Coimbra ou Tomar, de grande movimento, onde a iguaria da leitoa se pudesse saborear, comprar, e assim afamar a região.
De maior olhão o foram na Mealhada décadas depois a dar cartas no leitão.Nos anos 40 um homem perto da Anadia vendeu o negócio de sandes de leitão que tinha à borda da estrada Nº 1, onde alguns automobilistas paravam para o saborear… 
Gostava de saber onde a tradição de assar o leitão nasceu primeiro -, só investigando ! 
Contei a história da minha Titi e da tradição de comer leitão na Moita Redonda. Conta-me a minha mãe que se recorda dos pais presenteavam amigos com piqueniques saboreados na aba do costado da mina de S. João no outeiro do Cuco. No forno da casa da avó Brísida assavam-se dois leitões para dias de festa -, o cheiro deambulava em fuso aberto pela Cova da Raposa até ao Penhasco...O Zezito, o criado que adorava beber uns copitos mas deles tomava conta no virar do espeto de loureiro para a pele dos pobrezitos não esturricar -, um dia a minha mãe surpreendeu-o a pôr pazada de cinza sobre as orelhas pretas de ardidas… AS mulheres da aldeia contratadas à jorna carregavam cestas brancas à cabeça cobertas com toalhas de linho, o criado Acácio de garrafão de vinho nas mãos, e o Zezito com as mantas de tear. Tantas vezes a presença do Padre Melo, do médico D. João e do Dr. Quintela de Chão de Couce, caminhando pelos carreiros de frondosos e belos castanheiros e chão coberto a tapetes de murteiras, campainhas amarelas e colónias de abróteas -, as abrigotas flores brancas em cachos composto na extremidade de uma longa haste, as raízes de tubérculos de uso medicinal, na sabedoria popular o seu suco serve para o tratamento das impinges. 
A serra da Nexebra, infelizmente eucaliptizada há mais de 70 anos, num tempo que a Quinta de Cima optou por cortar o pinhal nórdico, sendo que os vizinhos depressa se aperceberam do negócio rentável...

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Artefactos do passado, moeda em cobre romana

A minha moeda romana - oferta do meu amigo Sr Bonito que me reviu na feira de Montemor o Novo, no bolso trazia um saquinho delas , umas mais "comidas pelo tempo" do que outras - deu-me a escolher uma - espólio por si encontrado perto de Beja...com o seu detetor de metais...já tem encontrado em oiro, prata, cobre e bronze - até me disse os locais onde as encontrava com facilidade...
Difícil foi registar em foto a moeda - tentei fazer uma cenário - parece que não me saiu bem.
Juntei duas pedras de mosaico que encontrei em Conímbriga há mais de 30 anos e uns óculos antigos.
Com a ajuda de uma pequena lupa consegui que se reconhecesse minimamente o rosto da moeda com a coroa de louros.Julgo que consegui decifrar - GLORIA ROMANORVM.
 
A moeda na outra face apresenta um guerreiro  
Recebi um comentário que junto  " Boa noite, a moedinha é já do início do século V d.C. 
Veja se não é esta a legenda (as letras podem aparecer muito juntas, mas o espaçamento deve ser lido assim: D N HONORIVS P F AVG (Dominus Noster Honorius Pius et Felix Augustus) GLORIA ROMANORVM (não está abreviado)."

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