sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

Residencial universitária do Campus da Univ. Nova no Monte de Caparica

Caminhada ao talvegue com partida ao casario quinta da Torre, com 500 anos, no Monte de Caparica, pertença de nobres de apelido Alarcão, com ligação ao Espinhal, Penela.

Reparei que entre a berma da estrada e os muros nasce inusitado faval ao sol poente e do outro lado da escada abertas covas à espera de coval.

Sondado o local que nos parecia óbvio para vir a conhecer a torre de S. Sebastião, forte, ou torre velha, baluarte que defendeu o Tejo, com a torre de Belém. Bem antes, já antes andamos pela azinhaga da Torrinha, seguindo a vedação do Campus da Universidade Nova, até onde termina num barracão que serve de oficina de automóveis e na encosta do talvegue se mostra possível entrar, mas, nessa altura estava atulhada de lixo e não avançamos. 

Assim, entramos no perímetro da residência universitária, falamos com o segurança que nos esclareceu, ser pertença do Estado, por isso pública, podendo usufruir do circuito de manutenção e desfrutar do miradouro . 

Seguimos o trilho avistando a abundância de aroeiras, e canavial, autóctones, com plantio de cedros e pinheiros Alepo, salpico de pinheiro manso.

Grande mancha de aroeiras que fecham em cúpulas

Impressionante ao tentar enxergar o talvegue do Raposo, explorado uns dias antes, para na verdade apenas enxergar a crista, do que se lhe segue de Alfazina, pelos barracões da quinta de Monte Abraão, o que revela a grandeza e dimensão dos vales profundos e dos seus costados, barrigas e falésias na real condição medonha e abismal, pese em local altaneiro a poente.



O emaranhado de uma figueira, só por aqui na região existem assim quebradas de ramos entrelaçados
Daqui a poucos anos as vistas perdem-se. A aposta de plantio de pinheiro não foi equacionada...

Na arriba uma pequena gruta

Grande pinheira , monumental, a fechar a arriba, ao miradouro, onde se avista a volumetria sul do Lasareto ou Asilo 28 de Maio, em promontório mais baixo com a torre para a esquerda, que não se visualiza pelas copas das pinheiras novas que estão a fechar a bela paisagem, e se possa afirmar foram má aposta ali o seu plantio. A partir dali para norte pareceu- nos difícil continuar pelos perigos iminentes da floresta cerrada sem carreiros e perigos iminentes ao desconhecido.

O que ainda se enxerga para norte

Para nascente
                             
Euzinha sem peneiras em cima da pinheira...
Avistei a volumetria a sul do Lazareto
De volta avistamos a poente o que resta de um portal, possivelmente o do acesso à torre, que dista menos de 1 km.O problema é que não existe carreiro e de perigo quiçá imensurável.
A quinta famosa, onde se vai de helicóptero para degustar sushi , ou ia até há pouco tempo, agora fazem criação de cavalos.

A vista só possível pelo devaste para desimpedir os postes de alta tensão
Já na estrada da Azinhaga da Torrinha a quinta do Castelo Picão
Quase ao fundo da vedação do Campus da U Nova a vista sobre Lisboa e o Tejo.

Revisto o painel azulejar quase totalmente degradado pela erosão, o tempo não perdoa.
O Santo, segura na mão uma torre, talvez a que existiu neste talvegue e deu o nome à quinta da Torrinha

Vista sobre o talvegue a nascente

                 

                  

Na descida da azinhaga a caminho da Fonte Santa, à direita, verificamos que a entrada sobre a arriba estava limpa com carreiro feito e sem favor entramos, debalde, ao fundo o chão todo alquevado, nem sei como o trator entrou ali, outro remédio não tive que saltar pelos montes de argila ainda moles da chuva...

                  

Porto Brandão

Lisboa

O Lazareto Novo

Foi fundado para o controlo de pestes e doenças dos viajantes chegados por mar que ali ficavam em quarentena, e só depois podiam seguir para o destino. Claro, que houve alguns com dinheiro fugiam ao ritual ao mudar de indumentária ...

  Quem morria ali ficava no próprio cemitério cujo muro se enxerga ao fundo depois do alqueva da terra.


O perímetro do Lazareto encontra-se todo vedado. A nova dona, uma multimilionária, julgo japonesa, pretende aqui instalar uma unidade hoteleira de luxo, e tem intenção de comprar mais hectares na sua abrangência ao Estado...

No dia seguinte de Belém apanhei o barco para a Trafaria, mas a hora do cair da tarde e das sombras não foi o ideal para fotografar. Como se enxerga a frente ribeirinha foi escandalosamente vendida a empresas!






Torre ou forte de S. Sebastião


Atualmente a forma mais fácil de conhecer a torre será seguir pela margem ribeirinha, mas temos o mesmo problema de ser privada. Se o monumento é público devia ter acessibilidade.


quinta-feira, 17 de dezembro de 2020

Tempos difíceis

Terrível corona vírus! Quantos já sofreram e não resistiram? Outros saturados com familiares no desemprego, prejuízos no comércio, restauração e a falta de turismo? A TAP com aviões em terra e, na cultura quantos sem trabalho? Vive-se a contingência de medidas drásticas de pouca liberdade, por cá e pelo mundo a obrigação de máscara à laia de açaime. Bem pior fazer dos afetos reféns com as perdas de beijos e abraços!

Há quem se lembre de ouvir falar de epidemias; a pneumónica em 1918, a gripe espanhola na década de 50, mas agora é diferente. Resta a esperança da sua erradicação com as vacinas. Já repor o que foi a normalidade, aguarda sem palpite!

E o Natal? Atípico. Diferente do habitual.   Para mim foi e será sempre Ansião.Mesmo que este ano não possa por outros imprevistos familiares, ali estarei sempre imbuída em espírito. Graças ao aconchego familiar, lareira e o fumegar do comer à moda da terra  que saboreei na Lagoa da Ameixieira,  na casa da D Helena Duarte Silva, falecida este mês, dia 5. Grande consternação e quanta saudade. A D Helena teve uma vida cheia de vitalidade e de extraordinária franca energia, bem disposta, alegre, simpática , amiga do seu amigo, com gosto de dar e receber fosse à família ou a amigos. Do seu alto e belo semblante, ao apelo dos genes da família - Duarte, ficou-me o seu belo e doce olhar esverdeado, contadora de estórias, a quem devo ajuda em mais enxergar sobre o passado de Ansião, do apelido Reis, da Ameixieira. Recordo os últimos Natais na visita à sua casa, sempre com a lareira a crepitar, onde jamais faltava a boa sopa de pedra, tão bem a sabia fazer como mais ninguém, ou de caldo verde. A mesma mão nos assados, cachola e nos doces, tanta variedade, sem faltar o pão cozido na sua fornalha caseira. Ainda quente o fazia chegar a minha casa. E o famoso Pão de Ló, com dosagem à antiga - 8 ovos, 8 colheres cheias de farinha e o dobro rasas de açúcar. Senhora admirável, o conhecimento veio através do meu genro Samuel, por ser a sua avó materna. Sempre me distinguiu no trato afável de rasgado carinho e amizade, com boas recordações, fica a muita saudade que deixa no meu coração. Um exemplo de Matriarca - a mãe que todos gostavam de ter- o quanto adorava ver a família reunida. Confessou-me não ter medo da morte, o que lhe custava era deixar de ver crescer netos e de nascerem bisnetos, sempre a pensar na forma de também os vir a proteger na sua áurea de coragem e valentia. Recordo a última vez que a vi em novembro, o Vicente fez-lhe um desenho que lhe ofereceu e a deixou emocionada...A D Helena já pagou a sua fatura nesta vida, resta a cada um de nós exaltar - Paz à sua alma, e acreditar que se encontra nesta hora ao lado de Deus, de quem era ferverosa devota em companhia de todos os irmãos e pais, na esperança um dia todos nos voltaremos a juntar. A chuva de hoje seja sinonimo de lágrimas pela alta perda na esperança do sol abrir para o adeus , que bem o merece, por tudo o que fez em vida, uma lição a muitas mulheres. E sobretudo de honrar as tradições gastronómicas de Ansião. Até sempre querida amiga D Helena, para mim foi tanto ou mais que uma das minhas avós, seja por isso jamais esquecida, antes jubilada pelo seu elevado legado e fibra de gente de boa estirpe, a elevar o meu horizonte!

O comer à moda da terra, é uma sopa grossa com carnes de porco e enchidos - tradição gastronómica introduzida pelos nossos avoengos nas safras sazonais; vindimas e apanha de azeitona no Ribatejo. Guardo a arca que foi da minha sogra que levou ao Ribatejo, é dividida, na parte maior ia a roupa, e na outra o "feijão da velha" , carnes da salgadeira, fumeiro, batatas, massa meada, a bacia de faiança e a colher. Repasto ancestral de substância - sopa forte, enérgica, ao jus tranca da barriga com as novidades do que havia na horta; nabo, abóbora, hoje cenoura, couve-galega e lombardo.

Por volta de 1957 uma taberna em Almeirim serve-a como sopa de carnes. Quiçá foi aposta mais tardia o refogado e coentros com o rótulo Sopa da Pedra fazendo alusão à lenda de um monge... Afoitos, os Ribatejanos,  a vieram a certificar este ano. Porém, a raiz genuína da sopa de carnes, ou comer à moda da terra, é ancestral de Ansião e concelhos limítrofes; o “feijão da velha” cresce com o milho e na ciranda é peneirado com pedrinhas desagregadas do eirado, ao serem mal enxergadas vão aparecer na sopa, ainda acontece em produção de cariz familiar, se não estou atenta de vez em quando ainda as encontro.

A alma das tradições do nosso povo é dever e orgulho valorizar porque trata-se de Património Imaterial. Alegadamente foi deixado usurpar por falta de aposta na cultura, quando é imperioso a deixar aos vindouros. Saramago, aborda a tensão dos trabalhadores locais com os beirões Sujeitam-se a ganhar menos, vêm aqui fazer-nos mal, voltem para a vossa terra, ratinhos. Dizem os do norte - Na nossa terra não há trabalho, não nos chamem ratinhos, que é ofensa. Diziam os do sul, São ratinhos, são ratos, vêm aqui para roer o nosso pão…” O Nobel Saramago, desprestigiou sem dó nem piedade o valor meritório dos beirões, obstinados desde sempre a qualquer trabalho, aventureiros, sem medo de dar o corpo ao manifesto perante o desdém dos demais, por cá e pelo mundo. Sensato seria duvidar e mais ter investigado!

O meu Natal em Ansião? Firme nas tradições das minhas avós – Maria da Luz Ferreira da Mouta Redonda, Pousaflores e de Piedade da Cruz da vila de Ansião. Bôla de carnes. Bacalhau; couves asa de cântaro, azeite novo, azeitonas de travo a erva de Santa Maria, broa de mistura, queijo Rabaçal, fêveras, morcelas e leitão. Doces; Veloz de abóbora, Filhós de laranja e aguardente que tendia no joelho, Sonhos, Formigos com as sobras do Bolo de Noiva, passas, nozes e mel, Pão-de-Ló húmido, Torta de laranja e da minha lavra o  que me aprouver inventar!

A melhor prenda este ano no sapatinho? Livre-nos Deus do vírus com saúde para todos. A derradeira esperança que melhores dias virão para todos nós.

A fechar mais um ano, formulo votos de excelente Festa Natalícia a toda a Direção do Jornal Serras de Ansião, extensiva a todos os seus estimados colaboradores e leitores, na ânsia maior que o Ano Novo, venha a ser bem melhor para Todos!

 

segunda-feira, 9 de novembro de 2020

Histórias de Ladrões que as palavras nos contam em Ansião

O que é ser ladrão? Se considerar a pilhagem e homicídio a  má herança de romanos, vikings, assírios e árabes no salpico em genes de mil e uma artimanha astuta e facetada ao engenho e arte  e olho gordo, de meter a mão ao alheio ou ao freguês, assalto à mão armada, falsário, corrupção, tráfego humano; armas, drogas, branqueamento de capitais e,…Gente que não olha a meios para atingir fins; ao logro auspício de riqueza instantânea no adulado ditado Tão ladrão é o que vai à vinha como o que fica ao portal.

Recordar o  lampejo que se ouvia na voz do Bairro de Santo António em Ansião; matavam viajantes para os roubar, desprezando os seus corpos na estrumeira da cavalariça. Ao tempo a estrada real era minada de corjas de salteadores no mesmo mau agoiro estalagens e tabernas; o perigo de todo o viageiro; escapava o lázaro, e almocreves no frete de bagagens e mercadorias com coldre de pistolas para abastecer quadrilheiros. Perto de Tomar, na Soianda, o povo criou o provérbio “assaz e não pares porque podes ser morto”


A verdade doí. O passado da nossa terra não é diferente do que foi o das outras, no mesmo laivo a negrura. A descoberta retrata o povo que somos, das misturas de genes e sua estratégia, os álibis de sobrevivência, onde venceram quem se mostrou mais afoito e ganancioso . Demorei mais de 50 anos para fechar este ciclo, que antes ninguém se atreveu a contar. É forte, mas foi verídico. O relato de Aquilino Ribeiro corrobora o que acontecia ao tempo nas tabernas e estalagens - quando gente sem escrúpulos sentia o peso do ouro nas algibeiras de um viajante, o embebedava para o roubar ou então o surpreendia de noite e matava. No Bairro, temos o testemunho do homem, dado pela sua filha ainda viva - no estrume iam corpos misturados. Quando a parte das cavalariças e palheiro foram requalificadas, em duas casas - uma para a Ti Laurinda e o marido o Ti Inácio, e a outra de uma irmã julgo Beatriz que nunca conheci, de paredes levantadas com janelas abertas de portadas em chão de terra onde estava a laje sepulcral, o pedreiro foi o tio do meu pai - Manuel Silva do Bairro, dizia em casa que ao abrir os caboucos para os alicerces encontrou muitos ossos humanos... 
Tenham sido as mulheres a levar a dianteira no crime, agora a matar já não sei. A verdade é que houve necessidade de as separar da mesma cela masculina, pela confusão gerada com homens...Abriu uma outra cadeia para as separar. O sitio ainda existe. Não inventei nada, apenas correlacionei o que ouvia, juntei testemunhos com conhecimento dos palcos, onde existiram . 

Foto do palco da última estalagem no Bairro
Hoje apenas existe a parte a norte onde foram no r/c o salão, cozinha e dispensa e no sobrado os cómodos para dormir, adoçada a sul onde agora estão vivendas havia um grande arco para entrada das cavalariças e do palheiro.Debaixo do arco haviam  pias de pedra, os bebedouros e no chão de terra uma laje sepulcral. A estrumeira era no tardoz, no que foi uma dolina cársica, assoreada. A estalagem tinha ainda a norte depois do portão para o quintal uma grande e secular glicinia, de cachos lilazes, outra igual havia na vila onde foi o 1º hospital da Misericórdia, foi removida quando fizeram o 1º calcetamento do largo do Bairro, então em areado claro.Defronte da estalagem ainda resiste o banco de pedra corrido, na tradição, para se sentarem.

A última estalajadeira desta estalagem no Bairro foi a "Ti Maria da Torre"; viveu mais de 100 anos. Teria encerrado portas nos inícios  da década de 20 do séc. XX, quando alugou a parte dos cómodos da estalagem ao casal André, que daqui se mudou para o Ribeiro da Vide. 
O lampejo que se ouvia é corroborado graças ao testemunho do homem incumbido da trasfega do estrume que dizia em casa, e me foi transmitido pela filha, ainda viva, que levava corpos misturados, na carroça de grande galera para as terras a sul do Casal das Peras!

Brutal realismo naquele tempo vivido sendo retratado noutra estalagem no Livro Terras do Demo, de Aquilino Ribeiro (…) estalajadeiros que iam de noite cravar o coração ao viajante, em corpo cansado, fazendo desaparecer o seu cadáver debaixo da terra e só mais tarde a locanda (estalagem) ao mudar de dono, no acaso da cava do quintal, se descobria o cadáver, o que restava do homicídio (…) na rua o jogo do chincalhão e à noite o jogo de cartas, bailaricos, bêbados apalpavam as mulheres, e muitas os roubavam. Um homem é para o Mundo! Alanzoava, no duplo sentido a malicia sexual! Quanto mais santanários (beatos e hipócritas), mais ladrões. Mas, enfim, em pouco mato se esconde um lobo…ou como diz o outro; à conta de ciganos todos roubamos!

Óbvio nem todos os estalajadeiros seriam pessoas de estirpe honrada e sabendo das mortes como classificar esta estalagem no Bairro, em mais de 200 anos? Abona a seu favor o grande arco para a cavalariça com os bebedouros, pias de pedra em chão de terra, onde sobressaia laje sepulcral branca, como a cal, sem inscrição - quem ali fora enterrada? E,ainda a cortesia de Henrique Dias que localizou dois registos de óbito; em 28/3/1735 homem de caminho do Correio de Sua Majestade e em 31/3/1821 António Rodrigues dos Santos, fragateiro de Ovar, passageiro da diligência morreu repentinamente. Ambos sepultados no adro da igreja. A relevar condutas corretas em cenário de morte súbita, em épocas diferenciadas. Então o que mudou a justificar o motivado tamanho desprezo dado à vida humana? A ambição do dinheiro fácil a poder precipitar ocasião ao roubo e até morte, em ambiente de vinho e luxuria, a promover a inclusão de mulheres ao crime; artes de bruxaria; olhares sedutores , mãos de fada e sorrisos feiticeiros, na ciranda do amor ao jus da Pitonisa de Delfos, herança trazida do império Persa. Bem de ver, sem temor à cadeia pelo farrabadó na certa na única cela masculina. De tal maneira foi exponencial  com a necessidade de as separar surge uma nova cadeia em 1777, com lintel reutilizado, adoçada a norte à casa do carcereiro, de igual data, mas, em moldura. Desativado o poder na Cabeça do Bairro, por volta de 1875 pela mão do Conselheiro; a casa da câmara e as cadeias ficaram desativadas . O farrabodó ali vivido de ócio, sexo e roubo (pelos filhos incógnitos) na roda da estalagem, na beira da estrada real por onde quem viajava na ligação norte/sul tinha forçosamente de passar. No ajuizar - sem lei por perto, a ocasião faz o ladrão furtar o que tinha à mão de semear – algibeiras com libras de oiro e peças de prata fosse a forasteiro, mercador ou bêbado metido a valentão em volta do rol do mulherio...No séc. XX na cava do quintal da estalagem foram encontradas algumas peças e moedas em ouro - uma medalha de 1640 e, 28 libras que a avó dos "Borracheiros" achou debaixo das tábuas do resto do soalho da primitiva taberna do Casal do Galego, até se falava que estavam dentro de uma panela de ferro... Quem ali as escondeu? Passado esquecido agora colocado na historia de Ansião!

Os primeiros estalajadeiros eram galegos e árabes, qual deles enriqueceu dignamente? O que fechava contas, sem cravar o cliente, por conta disso; uma vez abancado freguês, não mais demandava outra estalagem e ainda passava palavra no caminho. Em destrinçar o que é a alma de qualquer negócio, a satisfação do cliente. Hoje, ainda se pautam os galegos por servir bem e barato. Já o inverso com mouros foi retratado por Bartolomé de Villalba y Estana, em 1575. A verrinosa descrição poética  da estalagem da Venda do Negro, Ansião. Na minha tradução.

Chegámos à Venda do Negro
Negro o pão, e negros os panos,
Negro o caldo e a carne chamuscada,
E negros, a santa companhia.
Neste ponto negro aqui chegámos,
Cascavel, a má cara do estalajadeiro,
Porca, negra, suja e desarrumada

Livre-nos Deus de tão negra pousada.

Ansião sentiu um aumento populacional na centúria de 500 com a chegada de clãs de judeus asquenazes; ao destaque de mentes visionárias; obreiros a engendrar sofisma a novos filões de negócio; Confraria da Misericórdia, Milagre da Fonte Santa, Confraria de NSPaz e Alvarás para 2 Feiras na Constantina e, ainda a base da atual Banca, com empréstimos a juro.

Neste tempo vivia-se uma grande agitação, tinham sido extintas as Ordens Religiosas em 1834 , que demorou a ter efeitos em Ansião, em finais da centúria ainda havia registo do pagamento de foros que encontrei no Diário da República. Revela que foi tardio a venda da terra em haste pública da que tinha sido a herdade de Ansião. E claro quando aconteceu, bem de ver veio a favorecer o enriquecimento, não só do Administrador, como dos seus amigos e correligionários; se julgarmos, sem ter havido isenção, nem benefício aos pobres, as muitas injustiças e disputas criadas. Aziago continuado de mau estar e de vento em poupa ao tempo de República, bem  retratado na transcrição da ata camarária pelo Dr. Manuel Dias sobre Adolfo Leopoldo de Figueiredo teve uma ação judicial incitada pelo barbeiro António Ferreira da Silva que alegou o favorecimento a familiares no carboreto utilizado na iluminação pública da vila, comprado a um seu familiar. Na sua qualidade e Administrador da vila só podia assistir às sessões da camara como qualquer particular, mas o que é fato é que tomava parte ativa nas mesmas; compra de votos para conseguir para o seu partido, terá oferecido terreno baldio, por preço muito inferior ao seu valor real, ao Ribeiro da Vide; enriquecimento corrupto – é acusado de ter vivido com algumas dificuldades, antes da República, mas, depois a sua situação financeira mudou completamente. O réu perdeu, condenado ao desterro para Setúbal em 1916.E se questionar a opinião do Jornal Imparcial de Pombal de 16.02.1919 da sua nomeação como Administrador do concelho de Ansião, com folha de serviços à Republica, que são soberba garantia de boa administração, puramente republicana e honesta. Fica o suspense das penumbras de interesses que se reveste  o passado de Ansião, e as sentidas duvidas, por ter sido atestado na toponímia…Se é merecido ou não!

Outra boa história partilhada nas redes sociais pelo Dr. Prates Miguel “Contava o meu sogro que certo aldeão de Albarrol comprara a um habilidoso do Maxial uma engenhoca de fazer dinheiro e passava o dia encafuado no curral da mula a falsificar notas de 20 escudos. Como a produção exigia muita mão-de-obra e não pagava o trabalho, decidiu-se por um aumento justo e passou a imprimir notas de 30 escudos que não tinham curso legal pois a Casa da Moeda só fabricava notas de 20, 50, 100, 500 e 1000 escudos. O homenzinho, além de falsário era bacoco”.

A minha mãe recorda na década de 50 ter havido um falsificador da Fonte Galega, o Ti Miguel, foi zelador da Misericórdia, agora se era este a que se refere o Dr. Prates Miguel na voz do seu sogro na adulteração ao local de origem ao referenciar Maxial...Não sabemos!

Muitos se lembram da venda de produtos ao alqueire com tábua rasa, sem migalha de oferta ao perfil sovina. E, do uso de alqueires diferentes nas feiras de Montemor-o-Velho e de Condeixa; a origem ao ralhete em Figueiró do Campo, a aldeia da mãe do meu amigo Dr. Américo Oliveira levas com a medida grande de Montemor. No talho da Ti Augusta do Ti Manuel da Olinda havia o presenteio - nesga febra – esta é para o gato…e a Ti Matilde do Cimo da Rua, adoçou a gulodice a muito cachopo com sopas de café; fumegava e resplandecia de aroma e sabor, quiçá enviado pelo irmão do Brasil.

Ansião é assinalada no mapa com corredores da via romana/medieval na ligação norte/ sul e Europa. Assaz pequena para manter pujança ao perfil ardil e visionário com aprendiz sabujo, para em boa hora os mestres se erradicarem. Ao jus do adágio Quem pouco ganha e muito gasta, se não herdou, furtou. Escroques e burlões existem em várias sociedades por todo o mundo que evoluíram em técnicas sofisticadas no almejo de enriquecimento rápido no desvio de milhões. Contínuas fraudes levam ainda ao engano a quem se mostra pacóvio e ingénuo, sem nada desconfiar, tão pouco de publicidade enganosa. Perdura a lábia estruturada do conto do vigário na fisga a idosos até os fazer denunciar que tem dinheiro em casa e acabam por dar de mão beijada, na ilusória ganância de não o perder, e sim perdem e outros cegos fazem contas a juros altos, quando correm baixos, tendo caído em nebulosa pirâmide até ao dia que rebenta…fazendo jus a quem tudo quer tudo perde. Antiguidades de sangue, da era romana, tem sido roubadas de túmulos da Síria e, de outros países para custearem o terrorismo da Al-Qaeda. Recordar a Camorra em Itália e, Portugal? Não foge à regra na alta corrupção; poder político, económico e judicial, com mediáticos processos a decorrer. Se no melhor pano cai a nódoa, o concelho de Ansião que se pauta de brandos e bons costumes na chispa do rumor em descendente na quota parte dos 100 milhões no BPN. E das armas de Tancos.Ainda perdura nuns de casa, o hediondo arreganhar de chão público, por falta de fiscalidade, condenável em Democracia. O recente troço medieval vindo de novo à ribalta  e um beco fechado, já liberto.Pese a herança trazida do passado e presente com histórias de ladrões e falsários, nada que ofusque o brilho a Ansião. O grande contraditório em cidadania com a distinção no agraciar filantropos, eleitos Comendadores, em tempo atestados na toponímia, pelas altas valias dadas ao concelho de Ansião e ao País!

O que realmente conta para vingar o seu progresso no futuro!

 

terça-feira, 20 de outubro de 2020

O malfadado adágio a Ansião

 Artigo publicado em 15.10 de 2020 no Jornal Serras de Ansião

A importância da Cultura aos dias que correm interpretando o excerto do Livro “Estremadura Portuguesa”, do polígrafo, aquele que escreve sobre várias coisas - Alberto Pimentel, na sua estadia em 1902, em Ansião (…) Assim, não obstante o seu povo ser trabalhador, pacífico, religioso e respeitador dos bons costumes há um adágio tópico deprimente para eles: Em Ansião 30 habitantes e 31 ladrão. O autor não alude à sua fonte, a voz que lhe declamou o adágio - sem cautela, ao tamanho enxovalho a Ansião, até ali corria na oralidade, agora eternizado. Pior, invoca origem errónea (…) da época que aqui houve uma audaciosa quadrilha  de salteadores, de que era capitão, um preto, o famoso Escarramona, decapitado no Vale do Judeu com a cabeça espetada num pinheiro”. Sugere o nome do malfeitor alcunha à ligação do topónimo em perda; Escarramoa, a sul da Chã Galega, no Caminho de Santiago de Compostela. Bem antes, existiu outro mais famoso; Rui Mendes de Abreu, decapitado em 1679 em Lisboa. Viveu-se o terror em 1810 dos invasores franceses e as quadrilhas de salteadores na Guerra Liberal. Na cadeia de Ansião passaram ladrões famosos; Zé do Telhado e o Zé do Traço. Concluir sobre o delator do adágio - um tonho, vaidoso e iletrado. Jamais falar do que mal se conhece e não se sabe explicar; bem melhor ficar calado!

O Livro do Padre Coutinho em 1986 desmistifica o adágio. A dúvida se foi ou não conseguida? Usou sinónimos; provérbio e axioma “Ansião, terra de 30 moradores e 31 ladrão (…) Este axioma é, de imediato, interpretado e aplicado segundo os termos do enunciado, todavia, em abono da verdade, enferma de grave deturpação resultante da depreciação efetuada no seu sentido original. Corretamente deve ser: Ansião, 30 povoadores, 31 lá estão (…) o Mosteiro em 1216 fez aforamento da sua propriedade de Ansião a 30 bons povoadores (…) leva a afirmar que 31 lá estão pois, a presença deste adiciona-se à daqueles. É este o único e verdadeiro sentido de tal proposição intrinsecamente histórica e elaborada a partir de factos da nossa história medieval.”

Inegável o cerne do adágio entronca em 1216. Em pluralidade a necessidade de questionar a palavra onerosa – ladrão; nascida com o adágio ou no tempo apodo e, como sobreviveu a 8 séculos? Desde cedo no aprendizado a destrinçar carismas adversos; em crer, pessoas, de maus fígados. No curioso querer; enxergar mais sobre a origem dos seus avoengos, ao jus quem sai aos seus não degenera. No vasto panorama e rol; quezílias nas partilhas entre irmãos; casórios de tios e sobrinhas em agregar fortuna; núpcias com viúvos ricos no ganho de herança; o moço vindo da serra para tomar conta de porcos a um fintão; o costume não pagar contas, nem honrar compromissos, a sorte do guardador que acabou por lhe ficar com os bens; o dinheiro a tilintar na gaveta de qualquer negócio, alicia o ajudante de caixeiro a roubar aos bochechos; no logro enriquecer ao jus do ditado - grão a grão enche a galinha o papo. A má-fé; em chão de um e a oliveira de outro, o dono do chão descarnava o pé até a fazer secar; mudança de marcos de extremas; corte de serventias; quintal de irmãos, um deles muralhou a casa ao outro, até o fazer desistir e ainda proveito de chão público. Em panóplia ao carater; manhoso, impostor, ardil, ladino, cobiça, ganância, inveja, hipocrisia, mentira e somítico, em agoiro filhos de mau piçalho… Indivíduos de olho gordo, a reivindicar bagagem moura, adensada no cruzar de gerações com outros genes, nas artes de surripiar e atazanar a vida aos vizinhos.De almejo o supremo poderio, segurança e riqueza, sem pejo anular até os de sangue, qual guerra de titãs. Nessa claridade compreender a natureza do adágio. O Mosteiro, em 1216 tinha de ter hierarquia em Ansião, além de supervisionar a herdade a incumbência de levar os foros para Coimbra. Quem de fato recebe as 30 novas famílias e, fez a sua distribuição. Credível, cada família veio a instituir no perímetro de cada quinta, o seu sítio de morada delimitado, onde passou a viver com os filhos. Em crer, deu-se o início de novos Lugares em Ansião, denominados Casais, a se destrinçar uns dos outros acrescidos do nome do foreiro, ou da sua origem, a título de exemplo Casal do Galego, a sul de Ansião, por cabal ignorância cultural mudou para Pinhal.

Que ninguém se choque ao sair da minha base de conforto sem brando vaticinar. Os foreiros residentes não viram os novos povoadores com bons olhos, sem lhes dar afável acolhimento. Sentiam-se donos e senhores das suas quintas, sem o serem, afinal onde viviam com a sua família há mais de 40 anos. Ora, se atender que aos dias de hoje isto é passível de acontecer, não se mostra leviano o ajuizar. Sem amistosas boas vindas, tão pouco préstimo ou ajuda a potenciar conflitos. Só Deus sabe as agruras infringidas, para os ver desistir…Debalde, a inesperada cabal resiliência; carater firme, obstinado, corajoso, abnegado e lutador. A inspirar o audaz e sábio ripostar do refrão; curto e grosso; nu e seco; título bastardo aos 31 ladrões, os que cá estavam à sua chegada, na vingança justa, servida fria! O perpétuo louvor aos seus pais, a memória futura aos vindouros - jamais esquecerem o que foi o inferno singrar em Ansião!

Porém, corria outra versão do adágio – Ansião 30 moradores e, com o padre, 31 ladrão. Deturpação maldosa, pela correlação num estudo de Metrologia do Dr. Mário Viana dos Açores da contenda de Ansião arquivada na Torre do Tombo “ (…) A 17 de Janeiro de 1359, na alcáçova da cidade de Coimbra, Afonso Martins Alvernaz, seu juiz, fez pronunciar uma sentença no processo que opunha o concelho de Coimbra ao mosteiro de Santa Cruz quanto à jurisdição dos almotacés sobre o lugar de Ansião, e que decorria desde inícios de Dezembro de 1358. Vicente Esteves, prior de Ansião, enquanto procurador do mosteiro, assume a defesa dos moradores, argumentando que a jurisdição cível pertence ao mosteiro, nele tendo juiz, mordomo e almotacés próprios, e não ao concelho, pelo que os almotacés não podiam tomar conhecimento do feito relativo às maquias dos moinhos. Sem respeitar as leis do concelho e por isso se manifestar Domingos Eanes “rendeiro da almotaçaria, o qual, tendo detetado que os moleiros de Ansião não tinham colheres nem medidas novas destas que agora el rei mandava ter por seu senhorio”. A maquia de farinha nas mãos do povo sob o olhar do Prior? Quem de fato conhecia o seu árduo laboro para tirar uma fanega (alqueire) de farinha e, se contradiz “ A fio rouba o moleiro e mais dão-lhe o pão “ mas se revê, na oração do moleiro, na voz da minha mãe “ Deus te salve saco, 4 maquias te rapo - um pró burro comer, outra para te moer, outra para te levar, e outra para te trazer”.

A ladroagem perdura aos dias d’hoje com novos meandros. Tema da próxima crónica.

Concluir, o adágio cifra a negligente hospitalidade aos novos povoadores, em época específica. Ansião pauta-se por ser terra anfitriã, de gente boa. Cabe a cada um, agora mais esclarecido, o papel de erradicar o adágio. 

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