Cronica com resumo publicado no Jornal Serras de Ansião em Abril de 2023
A primeira referencia conhecida, em 1721 - na notícia do juiz
Bernardo Rodrigues; o Corsial
Piqueno da jurisdisam deste Couto de Ual de Todos sitiado de matos e penedos,
com oito moradores, com uma capela instituída por um sacerdote secular, natural
do mesmo Lugar, o qual se chamava Simao da Sylva; de invocação da Senhora
da Esperança. Foi vigário na vila de Botão, ia defunto e deixou em seu
testamento missa perpétua para meio ano e sua cunhada Mónica Mendes a
quarta parte do ano como para outro seu irmão João da Silua; por conta do
administrador da dita capela Manoel da Silva Freire.
Em crer, a capela instituída, não foi sediada na morada do
padre Simão da Sylva, defronte da Lagoa, ainda na posse dos seus descendentes ; os pais
do Sr. Alfredo Lourenço. A quem agradeço o contributo; a casa é muito antiga, ao longo dos anos sofreu várias modificações.
Havia muitos livros antigos sobre religião, provavelmente foram parar ao
"lume ".
Morada dos descendentes do Padre Simão Sylva defronte da lagoa
Lagoa muito assoreada a pedir limpeza!
O orago de Nossa Senhora da Esperança
Ou foi trazido da Beira Alta de Viseu, ao 3º seminário em Portugal, fundado em 1587, sob a invocação de Nossa Senhora
da Esperança, ou da Beira Baixa, de Belmonte, terra natal de Pedro Álvares Cabral, na época dos descobrimentos, pela fé dos navegadores que, sob a Sua proteção se aventuravam “por mares nunca d’antes navegados”.
No concelho de Ansião, temos o mesmo orago na Sarzeda, a sul de Ansião, que foi uma quinta de nobres espanhóis, os Ponce Leão.
Imagem de uma Senhora na ala museológica da igreja de Avelar
Quiçá a imagem desta Senhora com o Menino e o mundo na mão, seja NSEsperança do Curcialinho. Esculpida na curiosa expressão - olhos arregalados e sobrancelhas arqueadas...seria mais assertivo ter denominada Nossa Senhora do Espanto...
Capela da Rainha Santa Isabel, os líquenes encobrem a data de 1938
Falam alicerces à
vista, a nascente, ter sido edificada no mesmo palco da capela de NSEsperança , com porta para nascente.
A Rua da Rainha Santa, na ligação da Ribeira do Açor ao Curcialinho, Casalinho e Torre, tenha sido roteada na centúria de 800, cortando a quinta da família do padre . Nos finais do séc. XX foi alcatroada. Por isso a sua frontaria ficou a sul.
O poder do Couto da
Torre de Vale de Todos
A
notícia de 1758, do cura Manuel Caetano de Carvalho, da Torre de Vale de Todos,
evoca o Foral do Senhorio, o Cabido da Sé de Coimbra, Duque de Cadaval de
Tentúgal. Com os Lugares; Casalinho, Lugar do Pinto, Carreira, Mata,
Sobreiro, Curcial de S. Bento, Curcialinho, Figueiras Podres, Casal do Poço
Mimchinho e a Fonte do Carvalho com 19 vizinhos e 79 pessoas. Onde se
acham, a câmara e cadeia. Tem juiz ordinário, escrivão, também tabelião, vereador,
um procurador e alcaide e almotacé.
No livro O Município de Coimbra da Restauração ao Pombalismo Cf. Sérgio da Cunha Soares, Op. cit., vol. I, p. 53. Em 1812 Os
concelhos do termo onde Coimbra detinha apenas a jurisdição crime em
Pombalinho, Eiras, couto da Vacariça, Botão, couto de Aguim, couto de
Outil, couto de Paredes, couto de Vale de Todos, Pereira, couto de Monte
Redondo, couto de Casal Comba, couto de Semide, e couto de Vila Nova de
Monsarros (...)
António de Oliveira – A vida económica e social de Coimbra, Coimbra, Faculdade de Letras, 1971, vol I e
Sérgio Soares, nos estudos que realizaram sobre o município de Coimbra,
evidenciaram os múltiplos problemas com que a vereação coimbrã se
deparou nos lugares do termo em que exercia apenas a jurisdição crime.
Problemas que se materializaram na tentativa de apropriação da
jurisdição crime por parte dos donatários que apenas detinham a cível,
ou na dificuldade em cobrar impostos municipais nas áreas em que detinha
apenas jurisdição cível. Na
maioria dos concelhos do termo apenas exercia jurisdição crime,
situação que provocava frequentes conflitos de jurisdição Margarida
Sobral Neto – Terra e Conflito. Região de Coimbra, 1700-1834, Op. cit.
O Lugar do Curcialinho
Nefasto passado inglório, sem alguém a se preocupar em elencar a genealogia do concelho de Ansião , como em Ferreira do Zêzere o Dr. António Baião. Seguida da perda dos arquivos em 1937, não sabemos quase nada de quem aqui aportou como foreiro de quintas, antes de 1578 - a data do primeiro livro de registos paroquiais. Pior , o Curcialinho só faz parte do concelho desde os finais do séc. XIX.
Por carolice e teimosia, consegui destacar uma família de apelido Freire que instituiu uma capela na vila em 1603.
André Freire, morou no Escampado da Lagoa, apadrinhando crianças no Vale Mosteiro. Mais tarde aparece na Ribeira do Açor, onde casou uma irmã - Luísa Freire. Teria vivido na quinta dos Freires nos Loureiros, onde aparece referenciada como viúva . Aponta a sua origem num ramo Freire de Andrade, que deixou cair o Andrade, com origem em Pedrogão Grande.
Credível que o Lugar do Curcialinho foi formado por dois ricos donatários instituidores de capelas
A quinta do padre aberta defronte da Lagoa com capela a norte do seu casario, de traça judaica.
Como a outra a nascente, na foto abaixo, fechada por muro com portal onde defronte foi a capela.
Aduz esta quinta doação ao bispado, ao jus da quinta do Curcial de S. Bento, um costume de gente sem descendência direta.
Segundo a D. Alice Rodrigues o casarão com a casa antiga e quintal foi comprado em 1910, pelo Sr. João Rodrigues, seu avô, com dinheiro ganho no Brasil. A um tenente de Chão de Couce. De onde eram oriundos vários proprietários com feitor na Lagarteira e na Torre.
Sugere que a família do Tenente Sousa Ribeiro de Casas Novas, a comprou ao bispado ou em haste pública.
Casa de sobrado, guarda o tradicional balcão e tem vários cómodos
O provável palco da Capela de S. Caetano
A D. Alice Rodrigues, recorda de ouvir a um vizinho entretanto falecido, que muito gostava de levantar questões do passado, que neste barracão, defronte do casarão houve uma capela de padres .
Conheci o casarão na visita com os amigos
Sr. Albertino Lopes, esposa D. Silvina Gomes e um neto. E a mana do Sr. Albertino a D. Filomena
A foto acima explicita a frente do portal do Paço - um janelo no anexo, teria sido o palco da capela?
A capela a S. Caetano a não ter sido no anexo foi na casa logo atrás
Coligi nas Memórias Paroquiais de Penela, em 1751 o Curcialinho tem huma ermida de S. Caetano
De facto nem tudo o que ficou escrito está certo ou completo. A esse respeito verifica-se nas MParoquiais da Lagarteira do vigário Caetano Rodrigues, não abordou as capelas no Curcialinho...
Ala museológica da Igreja de Avelar
Auspicia que a imagem de NSEsperança e esta, em baixo, a S. Caetano, expostas na ala museológica da igreja do Avelar, com proveniência desconhecida, que tenham sido das capelas do Curcialinho. Presume a sua desativação antes ou depois da República, que o seu espólio ou foi vendido ou levado para a igreja do Avelar, eleita pelo elo secular a
Penela, cuja extrema era pela Lagoa do Pito.
O S. Caetano é um Santo italiano, muito amado pelo Papa Francisco.
A grata memória de Alfredo Lourenço sobre o casarão
Um património importante que foi recentemente modificado, ao iniciarem
obras para turismo e assim ficou. A entrada era bela com escadaria de grandes
lajes. No sobrado havia 6 salas, em lajedo, uma com lareira e alçapões, um
espanto. O r/c com vários desníveis e divisões, umas com janelas fortificadas e
outras sem qualquer luz ou abertura que dava a impressão de presídio.
Vista de nascente
No tardoz do casarão
Hoje desvirtuado por estruturas de paredes em tijolo, inacabadas, houve um alambique de ameixa e outras frutas, de aguardente do Sr. Américo Rodrigues. Recorda o Sr. Henrique Caseiro onde foi com o seu avô algumas vezes e gostava de atiçar a fornalha. Talvez o alambique, fosse da casa primitiva da quinta...
Portal solicitei opinião a dois distintos conhecedores da arte medieval
Dra Carla Varela
Algo dos séculos XVI-XVII, mas não tenho a certeza...
Dr. João Santos
Uma
cantaria de estilo derivado do barroco final (encurvada), caminhando
para o neoclassicismo, novamente recto como no renascimento.
ÓCULO
Óculo visto por dentro servia de iluminação da escada
O meu marido ao alto da escadaria
Lareira
A cantaria da direita tem acrescento, simples, sem qualquer luxo, alvitra que nunca foi usada
Pequena cavidade numa parede com porta de sacada para sul, mas, julgo não teve varandim...
As lajes da escadaria e do sobrado jazem numa eira ao léu ...
Demais cantaria do início da centúria de 800
Pormenores da arte de lavrante em cima nas janelas e em baixo
Entrada, apenas restam estas lajes
O enigma deste casarão? Jaz perdida na voz do povo e por hora sem fonte documental. Presume escolha do bispado, o seu chão, para erigir um Paço - dito casarão, que sediou a nascente da casa da quinta (herança da D. Alice), pela capela a S. Caetano, que lhe ficava defronte.
Nítida pretensa no mesmo prédio acumular todas as valências do poder do Couto depois de 1812, ao ser contemplado com a jurisdição crime. Desativando o poder então na Cabeça na Torre.
Paço imponente, de fausto portal encurvado do final do estilo barroco, quiçá trazido de outro local e aqui requalificado, já que a demais cantaria é de 800.
O sobrado tinha seis salas, em chão de lajedo, para servir o público e não habitação.
Na frontaria, o r/c com duas celas e janelas com grades.
A cela a poente com degraus flutuantes, para o condenado depois de ouvir a sentença descer pelo alçapão à cela…A retirada do reboco das celas inviabiliza saber se tiveram uso, ao serem perdidas as dos presos, já a lareira jamais foi acesa.
Vivia-se uma época intensa de conflitos sobre a terra e os foros pagos pelos rendeiros ilhados entre senhorios; Cabido, Mosteiro de Santa Cruz e o de Celas.
No livro Terra e Conflito da Dra Margarida Neto Sobral aborda os conflitos na Gândara , Montemor o Velho, Verride, Condeixa etc, mas, lamentavelmente sobre esta região nada explica, e bem sabemos que também sofreu os mesmos problemas e revoltas.Conflitos a originar a abolição das ouvidorias, por alvará de 1792 de D. Maria I.
Refere as MParoquiais de Ansião, pág. 173, quanto ao Couto de Val de Todos, distando 5 léguas de Coimbra, e tendo apenas 83 fogos que não lhe permitiam sustentar camara propria propos o corregedor da Comarca de Coimbra que entrasse para o termo da vila de Penela, de que distava apenas uma légua.
(...) pág. 176 - As Cortes Gerais . Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa na sessão de 28 de junho de 1837, alteraram o conteúdo do decreto de 6 de novembro de 1836. O novo decreto, sancionado pela carta de lei de 4 de julho de 1837, reinstalou o Concelho de Ansião, o qual passou a ser composto pelas freguesias de Ansião, (desanexada do Concelho de Chão de Couce) , Lagarteira e Torre de Vale de Todos(desanexadas do Concelho de Penela) e Santiago da Guarda (desanexada do Concelho do Rabaçal) (...) em finais de 1855, o Concelho de Ansião compunha-se das freguesias de Ansião, Lagarteira, Torre de Vale de Todos, Santiago da Guarda, Alvorge, incluindo Atenaha (...) e foi m" anexada a freguesia da Torre de Vale de Todos, do mesmo concelho de a parte do Lugar de Figueiras Podres" então pertencente à freguesia da Cumeeeira do concelho de Penela.
A juntar o caos com a passagem dos invasores franceses.
A guerra liberal dos irmãos D Pedro e D. Miguel. A fuga e a perseguição aos monárquicos miguelistas que venderam á pressa os bens, para salvar a pele...muitos foram apanhados e mortos.
A extinção das Ordens Religiosas.
Convenhamos. Demasiada vicissitude, onde admito - o Paço, jamais foi usado para o que foi predestinado!
Por certo virgem, sem jamais pedido de licença de utilização!
R/C a nascente
Pequena janela com grade
Frontaria o r/c com duas janelas com grades
Portadas de madeira com caixilho pequeno
A retirada do reboco não permite atestar se as celas tiveram usoR/c com porta a sul
Porta para poente para o átrio do portal da casa que foi da quinta
Cela a poente com degraus flutuantes
Falta uma das pedras, apenas existe o buraco onde encaixava. Ao fazerem a placa em tijoleira, perdeu-se a abertura para o alçapão da sala de cima , tribunal, de onde o preso descia diretamente à cela.
Fresta de iluminação e ventilação, seria da torre?
Marco de pedra característico para os carros de animais não encostarem nos prédios
A toponímia Rua do Tanque
…Por
detrás da Torre, os ditos Passos - auspicia uma torre romana sediada por ali algures, erigida com o propósito da defesa da água da fonte e Lagoa do Pito, Poço Minchinho e
Fonte Carvalho. Como outras em corredor romano, que foram reutilizadas na reconquista cristã, na luta contra os mouros.
O casarão !
Um paço que teve ortografia Passos.
Um património de valia histórica em agonia que suplica
reabilitação urgente!
Quem lhe acode?
Valoriza e dignifica?
Eis, a hora de mudar de rumo. Com apelo ao equilíbrio estético e cultural, a chamar a ribalda turística ao
Curcialinho!
A toponímia Rua do Tanque confronta a cultura à memória esquecida dos Passos do Couto!
Agradeço a todos a quem macei, o inestimável contributo das suas partilhas para compilar esta nótula histórica, sobre o Curcialinho, que era de inédita bibliografia, a crédito vir a estimular arqueológos em achar os alicerces da torre.
Fontes
Testemunhos de Alfredo Lourenço, Alice Rodrigues e Henrique Caseiro
Memórias Paroquiais de Penela
O Município de Coimbra da Restauração ao Pombalismo de Sérgio da Cunha Soares
Minha visita à ala museológica da igreja de Avelar