quinta-feira, 5 de setembro de 2019

Festa de S. Bartolomeu no Pereiro de Baixo, em Pousaflores

Em 2014 nasceu a crónica sobre a Escola Primário do Pereiro, na freguesia de Pousaflores.
Este ano aconteceu a visita em  dia da festa de S. Bartolomeu.
Não resisti aparecer em fim de tarde, lamento não ter assistido à procissão, acredito seria muito bonita.

Intrigou-me o pensamento a razão da atribuição da toponímia- Pereiro, que o relaciono  facilmente na região na antiga herdade da Ribeirinha do Pereiro, em Maças de D Maria. Na antiga estrada coimbrã a seguir ao Tojal, em Ferreira do Zêzere, perto da ruína da torre do Langalhão, temos Pereiro e, no feminino, em Pousaflores, temos a Pereira e Macieira,  ao limite da  quinta de Sarzedas, hoje Sarzeda na ligação à Caza de Pereira, que foi a ultima  donatária desta quinta e da de Martim Vaqueiro, sem se saber o nome de outras, a exemplo a da Togeira na Sarzedela e a quinta da Fonte, em Ansião.

Despertei com  Pereiro de Palhacana em Alenquer, citando excerto da CM« Em 1729, João da Costa Távora era proprietário de uma quinta neste lugar, talvez a Quinta do Pereiro, que em 1873 era propriedade de Manuel Baptista. Ao Pereiro ligou-se um ramo da família do célebre botânico Félix de Avelar Brotero. Em 25 de janeiro de 1789 casaram, na ermida do Espírito Santo deste lugar, o Dr. Joaquim Pereira Fajardo de Azevedo, de Alenquer, e D. Maria Margarida Rosa de Avelar e Noronha. Esta era filha do capitão Domingos Rodrigues de Avelar e de D. Francisca Rosa de Avelar e Noronha, presumivelmente irmã de Brotero. Deste casal terá sido também filho o capitão Matias José Rodrigues de Avelar, vereador da Câmara de Alenquer entre 1821 e 1823. 
O excerto reporta para os Távoras e os Noronha, famílias que tiveram a Quinta das Lagoas em Ansião e parte da Lagarteira, Viavai, Penela, Avelar, Chão de Couce e Pousaflores. 

A Sãozinha, a Santinha de Alenquer, a sua mãe tinha raízes em  Maças de D Maria, já lhe dediquei uma cronica. 

Não sei se é o acaso ou coincidência o gosto de interligar o passado e as gentes, a topónimos e apelidos com nomes de árvores se foi uma herança judaica para serem mais facilmente aceites na cristandade e sobretudo não ter inimigos que os denunciassem à Inquisição. Muitas famílias tiveram de facto uma vida árdua, ainda hoje persistem genes de gente reservada, calada e desconfiada, também de gente de má índole, cariz invejoso, sem talento algum, pelo resulto de tanta mistura de povoadores aqui aportados com homiziados e mouros .

Pereiro de Baixo e de Cima
Desenvolve-se num vasto vale, o certo seria ser apelidado de Vale do Pereiro. Surpreendi-me com as vistas para poente no Pereiro de Baixo, de sul para norte, caminho que percorri a pé com os meus tios - Zé e Emília  a partir da sua casa, emigrantes  em França.
Dar voz aos testemunhos deixados de herança do povo judaico ainda  evidentes na paisagem.
Casa em xisto cuja parede a poente ostenta em fila buracos- caracteristica que ainda se encontra por todo o concelho- perguntei a razão ao meu tio - a explicação é simples- servia para em caso de precisarem de mais espaço habitacional ou de arrecadação enfiavam nos buracos os barrotes para se fazer um sobrado. Esta casa encontra-se ao limite do Pereiro, na estrada que segue para Alvaiázere com entroncamento para a Mouta Redonda, na margem  da Ribeira velha.
Ribeira vista da ponte, nasce aos pés do Carregal e mais à frente toma o nome de Ribeira Velha 
Vista do Pereiro de Baixo
 Cardo seco, usado para fazer o bom queijo do Rabaçal
Ruína do que existe de uma casa típica na região usada pelos judeus, tal como se encontram iguais em Medelim e nas Beiras, com balcão e duas portas
As duas fotos abaixo retratam  o que foi aqui o passado e a importância da água.
Junto dos pés das árvores passava um ribeiro aberto a mãos por onde corria a levada de água  vinda da encosta sul, do Monte das Relvas passava junto da ribeira sempre atalhando por caminho que lhe fosse propício para deslizar em queda livre até chegar ao lagar que foi de João Santos
Um percurso feito à custa do suor humano com mestria pelos povoadores aqui aportados, seguramente mais de um km aviado.
Ainda se nota o relevo do muro onde passava o ribeiro para o lagar
Seria bonito o quintal em leirões e ver a água a deslizar no seu caminho...
 A água vinha de uma lapa ao meio do Monte das Relvas que se avista 
Um quelho na ligação do Pereiro de Baixo ao lagar ao lado da levada depois do casario onde passava  a caminho do Pensal e Mouta Redonha
Casario no Pereiro de Baixo a cativar o meu olhar
Vaidosa a família tinha o seu tabuleiro da fogaça na frente da casa- Assim é que é manter a tradição!
 Ruína, ainda assim exala beleza...
Depois da brutal extensão do vale do Pereiro, ao fundo a serra de Pousaflores, cujo topónimo mais recente é Serra do Anjo da Guarda
Pese os silvedos que ainda se deslindam na beira da estrada, distingui no costado leirões ou socalcos  arroteados pelos povoadores para terem mais terra para cultivo, tradição trazida de norte.
 Casa de sobrado com balcão
 Beco dos Artesãos. O que falta? Saber a arte? Eram ferreiros, o que falhou na placa, por incúria!
Cruz enfeitada nos locais por onde passou a procissão
Reporta esta arte e tradição celta trazida por  povoadores vindos da Galiza
Parabéns em atestar Beco
Em Ansião a JF denota incapacidade em decifrar o significado desta palavra, atribuiu a becos a designação - Canto...
 Uma grande eira onde se fizeram muitos bailes
 O que resta da eira e da casa...
 O portão de ferro, teria sido feito pelos ferreiros da terra?
Casa rica da família de João Santos, de arquitectura tradicional judaica
A família teve ou tem a farmácia em Maças de D. Maria. 
Casa adoçada a outra, talvez de antepassados, entretanto demolida. 
A casa que se encontra ainda apresenta arquitetura ancestral com arco de meia lua em lajes acima da porta na tradição romana/visigótica. 
Está em venda. Os compradores deviam respeitar a traça para não se perderem os testemunhos.
A cimalha em gesso delicada com muitas nervuras alindada com  pintura mural delicada pela grinalda. Há anos a porta estava aberta e não resisti entrar- peço desculpa- mas valeu a pena.
O salão com paredes forradas a seda adamascada em vermelho, a lembrar palácios e a cozinha com a corrente em ferro e,...
 Bela porta, bem esculpida em madeira, a lembrar os bons carpinteiros da região; Gonçalves, Ventura, Afonsos
Tradicional balcão nas duas portas
Capela de S. Bartolomeu
Dizia o povo que este Santo afasta os males e os medos. Um dos 12 apóstolos de Jesus Cristo.
Herança trazida por judeus Sefarditas da Galiza, onde este Santo era venerado para nesta região a sua evocação, pese o mar estar longe...jamais alguém se questionou...

O Livro Património Religioso do Concelho de Ansião de 2008  mostra a foto antiga da mesma  com a sacristia , um panfleto das festas e um mapa com a localização do Pereiro de Baixo que se localiza a 2,5 km a sudoeste de Pousaflores, já mencionada nas Memórias Paroquias de 1758. A fachada é encimada por um sino. A porta principal, de verga curva, acede-se por 3 degraus em forma hexagonal irregular. Do lado direito existe uma sacristia, com porta e janela para o exterior. Do lado direito da ombreira da porta encontra-se o orifício das esmolas.»
Debalde não entraram na capela!
A capela guarda um exemplar de arte sacra em pedra antiga a merecer estudo!

Contraste do antes e do depois da capela e da sua sacristia
Foto retirada do Livro acima referenciado
Bem hajam os obreiros
A toda a equipa que tomou as rédeas da alteração das obras endereço parabéns, por terem respeitado o passado na colocação de réplicas de colunas antigas, bem bonitas, em nada destoam no edificado tal como o belo telheiro e o seu forro encanastrado tudo a condizer. A ser mote para outros terem em conta esta visão nas alterações ao património religioso e particular, no dever de o  engrandecer e não desvirtuar para o deixar de herança às gerações vindouras!
Lintel da porta da capela
Ostenta escultura de 3 vincos grossos à laia de palma muito usual na região na centúria de finais de 700 com as portas a poente da igreja de Avelar e em casas em Ansião em 800.
Mas aqui houve uma ermida mais antiga, o que suspeito!
A capela, a quermesse, o palco das fogaças e da música, e as gentes, atrás funcionava  o bar 
 Imagem mais recente de S Bartolomeu sai  em procissão,  restaurada e pintada
O altar
Restaurado, em talha dourada, muito grandioso, belo, em contraste com a pequenez da capela.
Ultimamente tenho assistido a restauros em âmbito religioso na região em que se aposta no excesso de dourados; assim é na igreja da Aguda, Avelar, Torre de Vale de Todos e aqui não escapa.
Pessoalmente gosto de dourados velhos, por serem mais erudito em relação ao excelso brilho a lembrar pechisbeque... 
Tive conhecimento que as flores são oferta de uma benemérita
Achei exagerado os dourados do altar e da  quantidade de flores. Embora lindas e de qualidade pecam pelo exagero. No altar onde está a Imagem antiga em pedra do Santo do orago tive a sorte de levar os óculos onde deslindei por mero acaso no seu tardoz a existência de uma pedra ovalada na parte superior  lavrada, à laia de estrela, debalde a imensidade de tanta flor ofusca a beleza ancestral que a capela tem, por isso o fatal reparo.
A foto possível do altar antigo em pedra e o Santo primitivo
Abaixo do altar 
Deslindei uma pedra esculpida com um anjo alado, em cor natural, assim igual encontrei a pia de água benta da igreja do Rabaçal. Em policromia distingui na Igreja da Aguda.
Há necessidade de intervenção por historiador de arte para se classificar estas pedras e a Imagem para se datar a capela, a sua fundação, seguramente muito anterior , da centúria de 500. Aliás ao lado do altar na parede sul existe um abside rebocado, seguramente é de pedra, que ainda lá deve estar.

Pia na igreja do Rabaçal
Encontrei no cartório do Convento de Celas em 1591. N. S.ra da esperança Coimbra.
Prazo em três vidas de hun"v oliual, que tinha duas ametades, huã deste mosteiro, outra de Dona Vrsula de Mello, da ametade do mosteiro se pagauao quatro alq.res da de D. Vrsula sinco, se o mosteiro herdasse a sua parte, e assy vem a ser noue alqueires, o oliual esta alem de N. S." da Esperança aonde ehamaõ as Courellas, parte com oliual de Suõ Bertholameu: naquelle sitio se faz o mosteiro de S.ta Clara, h^ necessário saber se occupaõ este oliual.
O  excerto afirma que em 1591 já existia a capela de S Bartolomeu, entre as Courelas parte com olival de S Bartolomeu para poente à quinta de Nossa Senhora da Boa Esperança, hoje Sarzeda. 
E ainda naquele sitio se faz pelo Mosteiro de Santa Cruz, de facto o limite do prazo de Celas com o de Santa Cruz fazia-se ao Suímo. 
Uma excelente correlação que mais acrescenta a antiguidade do Pereiro, na freguesia de Pousaflores e por último ao apelido Melo na região.
Outro exagero, a pia de água benta com arranjo floral,  quando a simplicidade também pode ser bela...
Palanque da venda das fogaças
Ainda persiste a tradição dos tabuleiros na freguesia de Pousaflores, e isso é agradável de constatar. 
A mesma tradição que se mantém em Tomar, embora mui adulterada pelo turismo, não lhe acho a mesma graça . Esta sim  é genuína, como era no tempo dos meus avós e da minha mãe. Parabéns.
Se a memória não me atraiçoa esta menina fogaceira chama-se Isilda...
Encontrei-a na volta da festa a caminho de casa a quem pedi para se fazer à foto, para logo aceder a quem agradeço o gesto atencioso e carinhoso .Se olhar à sua fisionomia, não engana genes dos povoadores aqui aportados, a alta e forte silhueta, amante das tradições, prestável em colaborar e simpática, acredito mulher de afetos e de trabalho!
 Os meus netos hilariantes com a quermesse e as rifas...
Agradeço à boa vontade e carinho que um dos rapazes ao reparar que lá fui várias vezes para comprar rifas para os netos sem nada o fazer esperar procura por brinquedos- um para menino e outro para menina e  os obsequeia  - não é o valor daquilo que se oferece que conta - é o gesto altruísta, humano e de afetos. Boa gente no Pereiro.
As festas tem o condão de reviver pessoas, amigos e família
Além da família encontrei o Leonel Lopes da Mouta Redonda.
Cumprimentou-me a rapariga bonita da Gramatinha  que vende no mercado,  abasteço na sua banca  a boa fruta e hortaliças quando estou em Ansião, linda de olhos azuis, de apelido Simões pelo pai, e o filho, o Lucas, uma graça de menino.Veio à festa da sua freguesia, em prol doutros que não compareceram, vinda de trás da serra. Boa gente que respeita e cultiva as tradições, carisma que é preciso revitalizar no concelho. Mais tarde soube faz parte da Junta de Freguesia de Pousaflores, chama-se Ana Patrícia.
Aqui a dançar, abriram o salão na estrada...
Os tios do meu marido João Veríssimo e Zézita, moradores no Pereiro de Cima

Os homens preparavam os assadores para começar a assar os frangos. 
Fizemos encomenda de um que levámos para o nosso jantar, era muito bom.

A minha filha a conversar com a tia Emília
Tia por afinidade do lado do meu marido, que mais amo. Quando nos encontramos a única que me sabe dar um abraço apertado, sentido, amigo, de coração, uma verdadeira Mulher de afetos. 
Grande Tia Emília- amo você e sinto é reciproco!
Jaz morto a apodrecer o velho arco da festa talvez do ano passado...
O meu Vicente quis ir apreciar de perto, leva o meu jeito de ver tudo...
 Deixámos a festa felizes...
Ao pôr do sol...

Na volta da festa os cachopos espiolhavam  a Cruz que já tinha sido retirada, já cumprira a sua função...
O Vale do Pereiro guarda um manancial histórico do que foi a sua  riqueza na centúria de 300 e seguintes, então aforada ao Convento de Celas, com moinhos de água e azenhas entre 7 a 8,  as ruínas que ainda se podem contar ao longo da ribeira desde o Lugar da Azenha, Pensal, Mouta Redonda de Baixo, Prazo e Ribeira Velha onde houve  dois açudes.
Mais tarde dois munhos de vento no cimo do monte a sul, a caminho de Maçanicas, os lagares no Pensal e, outro a caminho do Carregal. A juntar a arte da tanoaria , ainda de gente que se distingui na vida em riqueza e construíram casa na sua terra, por amarem as raízes. 
Em todos se distingue gente com talento.
A Fonte do Pereiro foi mencionada no livro Topografia Médica das Cinco Vilas e Arega.
Diga quem mais sabe, para já pioneira a falar do que senti do Vale do Pereiro.

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