quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Abiúl atesta a primeira festa dos toiros em Portugal

Abiúl, vila do concelho de Pombal…Foi vila e sede de concelho constituído apenas por uma freguesia, entre 1167 e 1821,  os duques de Aveiro já tinham construído um hospital, albergaria e a capela da Misericórdia. Entrou em declínio com a morte trágica da família dos Duque de Aveiro, por crime de lesa pátria acusado no atentado contra o Rei- teria sido perpetuado pelo Marques de Pombal, visionário , odiava o poder da nobreza e dos Távoras. Corria o ano de 1758 quando o rei D. José, regressado de mais uma escapadela com a sua amante Távora levou um tiro no ombro. Acabado de regressar da Índia o Vice- Rei Luís Bernardo Távora, marido traído quis repudiar a mulher, mas o rei não permitiu que a sua amante favorita fosse humilhada publicamente. Começaram os insultos e as ofensas, aos poucos nasceu um ódio de morte entre o monarca e a família Távora, atiçada pelo Marquês de Pombal que não gostava da alta nobreza, em especial dos Távoras, pelo poder que tinham no reino. A casa de Aveiro foi um ducado desde o século XVI, título conferido por mercê de D. João III, o duque de Aveiro, também fidalgo Távora foi considerado implicante na tentativa de assassinato do Rei D. José, homem pouco inteligente, confessou (?) a tentativa do crime na esperança de absolvição, preso, torturado e acusado de regicídio.
“ O Jurisconsulto Pascoal José de Melo Freire dos Reis nascido em Ansião com 19 anos foi quem bateu o martelo na sentença perpetuada pelo Marquês de Pombal nesta tramóia...”
O Marquês de Pombal ambicionava o poder, o trono, em ser rei, porque a sucessora real era uma mulher, filha de uma espanhola, e nunca até ali houvera uma rainha a governar Portugal, sendo o Marquês um homem sem escrúpulos, não olhou a meios para atingir os fins, dizimou os Távora com a ajuda preciosa do Pascoal de Melo que ditou a sentença e assim foi avante o plano maquiavélico de assegurar a extinção dos Távoras-, os mais novos escaparam à morte foram encarcerados nos conventos de Chelas e Rilhafoles. 
Rezam as crónicas da altura "às quatro da tarde não restava um Távora vivo em Belém, os seus corpos foram cobertos de alcatrão e queimados lentamente , nesse dia treze de janeiro de 1759, o nome Távora era tão mal visto que o chão por baixo do cadafalso onde morreram foi salgado para que ali nada nascesse, nem sequer uma erva daninha. Os seus bens foram confiscados pelo reino".
Felizmente a família dos Távoras não foi totalmente extinta, porque existem hoje muitos Távoras. 
D.Manuel I  deu novo foral a Abiul a 14 de julho de 1515, dotada de câmara, cadeia e tabelião
Resta pouco do fausto da vila  do século XIII a meados do século XVIII. Outra machada final de Abiúl  aconteceu com a passagem da 3ª invasão francesa em 1810.
Soube em tempos de antiquários desde sempre bateram a região à procura de tesoiros do tempo dos duques, do espólio que foi roubado, falaram-me de uma cómoda em pau santo e,...Outro episódio passado há anos quando a autarquia andou com obras de saneamento e abastecimento de águas tendo do largo retirado o fontanário em pedra com carranca ao centro ladeado por dois sóis, tendo-se oferecido para seu fiel depositário um vizinho já velhote que alvitrou para o guardar no seu pátio até ao dia que soube que na vila  andavam os antiquários logo os chama e lhes diz que tem uma pedra antiga... Pobre homem, mas astuto, não teve pejo em vender o que não era seu, património de um povo, do tempo dos Duques. Lástima  a falta de cultura, pobreza e ambição quiçá com genes judaicos/mouriscos?
Um dia os descendentes de quem o comprou a viver algures o vão vender de novo ...sem saber a sua estória com história!
O certo era o fontanário regressar à terra de onde nunca deveria ter saído!
As pistas do fontanário foram dadas...De qualquer das formas a Junta de Freguesia de Pombal  devia ter o mérito de mandar fazer uma réplica, basta ver na faiança como se fazia o sol, ou até pode haver ainda alguém que se lembre e o saiba desenhar.

Arco manuelino
Nas minhas lembranças recordo a festa brava no concelho de Pombal  em Abiul cuja origem se deve aos Senhores de Abiúl -, os Duques de Aveiro, ele um Távora e a esposa do reino de Leão da família dos Ponce Leão, amante da tradição espanhola do toureio e toiros os mentores do gosto da lide para Portugal
Nesta terra receberam de herança o palácio que dele existe este arco Manuelino e teriam mandado fazer um  palanque para assistirem à tourada no redondel no terreiro do burgo no ano de 1561, onde se correu toiros em Portugal pela primeira vez, como promessa por se ter erradicado a peste desta Vila . Sobre a sua origem sempre a conheci como sendo a praça de toiros mais antiga de Portugal - até em concursos televisivos essa pergunta saiu por duas vezes, no entanto fala-se que Sousel, também poderá a par dela, receber tal menção...Conheço um aficionado de Setúbal com livros editados que me disse que a primeira corrida de toiros não foi aqui nem Sousel e sim Atouguia da Baleia- até me disse que me oferecia o livro, debalde nunca mais o vi.Achei estranho até correlacionar que um genro do Duque de Aveiro era Conde da Atouguia , tinha de renda casas e a fazenda que hoje é a Quinta do Conde, do Mosteiro  de S Vicente de Lisboa.Fala-se que quando vieram prender o Duque de Aveiro ao seu palacio de Azeitão levaram também o genro.

Praça atual
No dia da reinauguração da praça em cimento armado havia muita gente na maioria vestida de preto, outros de cor garrida, todos acorriam à novidade da reportagem -, o repórter Fernando Pessa da Emissora Nacional, tinha eu doze anos, no primeiro domingo de agosto de 1969. Recordo o eco forte daquela voz sonante em ênfase  para o grande microfone preto: "seria aqui, aqui, neste preciso lugar onde me encontro, o varandim do palácio dos Duques de Aveiro, de onde avistavam o boi"...
 
Palanque do paço dos Duques de Aveiro
Do palanque restam três arcos em tijoleira . Em miúda ainda conheci a praça de toiros em madeira vermelha queimada pelo sol edificada em 1951, até aí fora um redondel murado a pedra firme, estando os curros e os alçados das bancadas seguros por grossos troncos de pinheiro. Vezes que aqui vim assistir às touradas, sentada numa das bancadas onde o sol batia forte com o toldo circular em lata e rendilhados ainda assim teimava em não nos dar sombra. De táxi  de Ansião, com o meu pai, grande aficionado, recordo os cavaleiros emblemáticos Gustavo Zenkel no começo da sua carreira vestido de casaca azul, Mestre Baptista envergava casaca vermelha debruada a oiro a mais reluzente de todas, António Ribeiro Teles já de mais idade... Lindo o bailar das vacas charolesas a que sempre chamei chocas, com grandes chocalhos presos ao pescoço na dança e andança pela arena para o toiro cair no engodo e assim o encaminhar para o curro, e “dos perrotes” - forcados vestidos de meias brancas em croché até ao joelho com borlotas vermelhas, barrete verde enfiado na cabeça produzidos na fiação de Castanheira de Pera com mãos fincadas nas ancas na dança de traseiro – em grito atiçando o boi para a “pega de caras”…ah toiro, aferro de força, batiam o pé na arena, sem medo!
Palanque
 
Curioso nestas terras do Maciço de Sicó, o povo chama os toiros de bois… 
Episódio pitoresco que nesse dia assisti . De repente duas mulheres castiças vestidas de preto, traje típico à época das vendedeiras de barros dos Ramalhais enfeitadas de grossos cordões de ouro, medalhões ao pescoço, arcadas pesadas nas orelhas e saia dobrada de serrubeco pelas costas em jaez de casaco -, uma dizia para a outra, anda ver o boi... e abalam em passo corrido em cima de pernas tortas ao mesmo tempo que elevaram mãos em ajeitar do lenço da cabeça para baixar em guisa de palas aos olhos,  esgueiradas em bicos de pés , curiosas, espreitavam pela guarita, o curro!
Este tipo de traje único desta região, as chamadas "saias das costas", ainda hoje é possível ver algumas vendedeiras mais velhas assim vestidas pelas feiras de antanho, vendiam os típicos barros verde azeitona e amarelo forte da Bidoeira, aldeia do concelho de Pombal. Este tipo de traje sempre presente em mim, nunca visto noutra região deveria ser mote para um trabalho de pesquisa -, uma monografia, porque na realidade foi típico em Ramalhais. 
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O Forno 
Como nota etnográfica existe o forno que ainda hoje se conserva, no qual se registava uma cerimónia que atraía muitos forasteiros como veio a acontecer mais tarde no Avelar, no concelho de Ansião, de igual simbolismo e cariz medieval. O povo acendia o forno com umas boas carradas de lenha, era amassado grande bolo ou fogaça com alguns alqueires de trigo e o punham a cozer. O ritual  consistia em que o homem que o retirava do forno tinha de comungar e levar na boca um cravo e de chapéu armado na cabeça dava três voltas dentro do forno, só depois retirava o bolo ou fogaça para os forasteiros comerem...O que me deixa a pensar, como seria que o conseguia fazer sozinho, se era tanta massa, a pensar nos alqueires de trigo e não levava pá? Como o agarrava, se escaldava...porque o cravo na boca o ensejo da física para não se queimar?
Citar um comentário  da crónica " homem que entrava no forno com um cravo na boca..."
É o bisavó da minha esposa . O seu nome é José Lopes Domingues.

Não digo que não tivesse acontecido e não acredite.Na realidade tem de existir um fenómeno, que ainda ninguém explicou-, ou iam de roupa molhada com o chapéu de aba larga para não queimar a cara, o que levariam calçados, tamancos? Faltam respostas que deviam ter ficado escritas ou terem sido passadas na família para hoje se saber com maior fidelidade como decorria o ritual.E também se morria, o que parece em Abiul assim aconteceu com o último e mais ninguém foi dentro do forno. Há anos em Ansião numa feira de velharias veio à baila a conversa com uma senhora que me falou sobre ele...  
Falta um elemento da FÍSICA para explicar o fenómeno do abrasador calor não molestar o homem!
Na verdade as bocas dos fornos são em tamanho bem diferentes aqui mais pequena  em contrate coma do Avelar de porta. De qualquer das formas ninguém explica como era possível alguém entrar dentro dum forno depois de cozido o bolo ou a fogaça, e não se molestar, porque o facto de comungar e levar o cravo na boca são rituais dum tempo em que as gentes eram fortemente beatizadas.
O forno de Abiul parece mais um forno comunitário  em prol de apenas ser usado para o bodo aos pobres na devoção ao Divino Espírito Santo criado pela Rainha Santa Isabel - tradição que ainda hoje existe no concelho com as Festas do Bodo e os bolos tradicionais, as fogaças
Recordo alguns colegas de Abiul e redondezas que andaram comigo em Pombal onde se deslindavam genes de judeus,  francos de olhos claros e cabelos loiros e também mouriscos.
Abiul, terra com tantas estórias e história sem ser dignificada hoje como o foi no passado, e bem o merecia!

domingo, 10 de outubro de 2010

Saudade da casa dos meus avós maternos e dos seus filhos na Moita Redonda

As duas casas ao cimo do  quelho do Vale, já não existem. Atrás do gato a casa de porta aberta sob o comprido tinha na fachada uma janela-, a casa do bisavô do meu marido, o Ti Miguel que tinha um burro, se chegava ao fim do dia com "um copito na asa" se mostrava muito teimoso com o vinho em teimar com o burro para entrar de marcha atrás no curral, a pobre mulher, que dela se dizia ser uma santa, pela paciência em o aturar dizia-lhe " o palerma do burro é teimoso, é..." 
Para baixo, a casa pegava paredes meias com a  da avô Brísida da minha mãe, outra santa mulher, um casebre que o conheci no meu tempo palheiro e onde se arrecadava lenha, a seguir a casa dos meus avós Maria da Luz Ferreira e José Afonso Lucas.
A  minha mãe com 79 anos na quelha do Vale -, do lado direito foi a casa onde nasceu a 27 de julho de 1934, no dia de S. Panteleão ( o pai tinha saído de madrugada com a carroça para a feira de Figueiró dos Vinhos) num dia radioso de sol com os passarinhos a chilrear no ribeiro que desce da Nexebra.
A quelha do Vale, euzinha na frente onde outrora foi a casa dos meus avós, o que resta...pedras calcárias dos degraus da escada.

Aqui era a casa da Maria, onde se faziam os bailaricos no tempo da minha mãe. 
Uma "broa inteira" no dizer da boca de sua mãe aos rapazes na saga de lhe arranjar um bom partido, quando casou foi viver para Monte Real.
O sítio da casa dos meus avós maternos na aldeia de Moita Redonda, freguesia de Pousaflores, concelho de Ansião, distrito de Leiria.Tanta saudade e tantas horas felizes por lá vivi na companhia da minha querida avó. Costume nesta vida, tudo tem um fim!
Chegou o maldito dia em que a Câmara resolveu derruba-la por uma dessas máquinas de lagartas para alargar a estrada, mas que estrada, tudo continua selvagem.Sinto uma nostalgia que invade a minha alma, pelo que se perdeu!
Bem sei que só restavam as paredes e a chaminé altaneira pintada de ocre, as lembranças tão frescas na minha memória da sua elegância e imponência, destacava-se na aldeia, quem diria, tão simples, vulgar, mas foi assim que sempre olhei para ela, feita pelo sobrinho António do Vale, pedreiro, aqui nascido, tal como os irmãos, ficou-lhe a alcunha . Adorava contempla-la como referência  do alto do outeiro da mina de S. João  quando aí ia buscar o barril de água fresquinha. Lembro alguns motes do passado que me tem sido contados pela minha mãe. 
A quelha do Vale, o sítio onde foi a casa dos meus avós Lucas, na esquerda, a seguir à oliveira. Que saudade!
Casa muito farta no seu tempo. Na aldeia a mais rica. No forno assavam-se dois leitões para dias de festa ou piqueniques na serra onde não faltava a presença do Padre Melo e do médico D. João de Chão de Couce, naquele tempo ainda não haviam eucaliptos, apenas frondosos castanheiros e pinhal com tapetes de flores. O cheiro do leitão assado deambulava em fuso aberto pelo Outeiro do Cuco, Cova da Raposa, até ao Penhasco-, o bom do criado, o Zézito, tomava conta de os assar mas ia bebendo uns copitos , um dia demorou mais a virar o espeto de loureiro e as orelhas esturricaram, que a minha mãe o foi encontrar a pôr pázadas de cinza nelas já pretas de tanto ardidas...Foi uma chatice e das grandes.
Os meus avós maternos José Afonso Luvas e Maria da Luz Ferreira
Pelo Natal a tarefa da minha tia Záira, irmã mais nova 10 anos que a minha mãe, era a fritura dos sonhos. Usava a lúgrebe casa velha da avó Brísida onde o Prof José Lucas nasceu e viveu até os pais mudarem para a sua casa no cimo da aldeia. Enorme o tacho de esmalte azul às pintinhas brancas cheio de azeite a ferver que fora de fazer o "Verde" no casório do irmão Carlos -, gulosa e sôfrega aquela tia comia mais sonhos do que os apresentados à mesa na palangana de faiança na consoada...Do cheirinho do aferventado que saia da panela ao lume de couve galega ou  de nabos com feijão frade ou feijão de debulhar e até feijocas, depende se era verão ou natal, depois  a via a esfarelar broa para uma taça e em cima punha-lhe o aferventado, o que sobrava era janta para o dia seguinte, o requentado, a que ela chamava carinhosamente fertungado, usava um tacho de barro com o fundo alagado em azeite a estalar dentes de alho e folhas de louro, juntava as sobras do aferventado com as migas de broa escorridas e com a colher de pau mexia até ficar tudo desfeito, o cheirinho era tão bom, como o arroz de bacalhau com colorau, e da galinha corada com batatinhas.
Conheci a minha avó só com um dente -, comia papas de milho e sopas de pão duro com queijo de mistura meia cura partido aos bocadinhos amolecido na quentura da cevada. A minha mãe nunca suportou que eu a imitasse, confesso que ainda hoje gosto,uma malga de sopas de café com queijo do Rabaçal!
Gostava de ir ao galinheiro buscar os ovos para fazer gemadas com açúcar amarelo para ser forte, no pensar da avó.Boas as bonequinhas de açúcar que chupava  como se fosse rebuçados. No pequenito quintal enviesado, recordo a flor vermelha das feijocas serpintadas de branco  junto ao jardim da eira, ladeadas de couves galegas e  couve nabo.Prazer de calcorrear os carreiros por entre os leirões ao lado das levadas de água fresquinha... A chegada da civilização com o toque da corneta do carteiro ao cimo da aldeia no Fôjo, em meio tempo ouvia a Ti Rosa em gritaria "oh comadre parece que vejo o carteiro a subir a quelha ", sinal de notícias de Angola, da Titi ou da minha mãe que abusava nas férias no envio de mimos e guloseimas que a avó guardava na pequena arca do seu quarto. Eu à socapa gostava de lá ir espreitar e surripiar qualquer coisinha.Um belo dia fui apanhada, ouvi sermão, missa cantada e ainda sofri um castigo, era inverno a noite caia cedo, obrigou-me a ir ao alpendre buscar lenha para o lume.Assustada ao rebate de xisto da porta abaixo do nível da casa naquela hora parecia maior, ou eram as minhas pernitas a tremer que não o conseguiam subir, lá fora só enxergava uma imensa escuridão e o barulho do vento a bailar nos altos ramos dos eucaliptos.Imagine-se, só havia luz eléctrica dentro de casa.Corajosa, enchi o peito de ar e saí a rezar naquela de partilhar ajuda, "Jesus vai comigo, eu vou com Jesus" e consegui por apalpação encontrar os gravelhos de pinho!
A primeira filha dos meus avós veio à luz no dia 31 de Dezembro de 1911 em plena serra do Mouro, sábado, vinham de fazer a feira em Ansião, não deu tempo para esperar, era a hora, deitada na carroça entre os panos da tenda ajudada pelo pai a vir ao mundo nasceu a Maria Augusta, Maria da Luz, nunca soube, sempre a conheci e amei tratar por Titi, menina baixinha, graciosa de cabelo escuro.Enternecedor o gesto do seu pai meu avô em querer fazer dela uma menina fina, mandou-a para Coimbra estudar, naquele tempo no sótão da casa haviam poceiros abarrotar de sapatos e chapéus, aquela tia foi muito vaidosa no seu tempo de menina e moça. Casamento da Titi na Vidigueira, com chapéu.Teve duas meninas, teimou que a primeira viesse nascer na Moita Redonda, era um bebé grande, sem assistência médica, só a mãe e curiosas, veio a falecer. A seguir nasceu o Carlos, rapaz louro a puxar para o albino, endiabrado, de mau feitio pelos maus tratos à sua mãe, enquanto o pai andava no giro pelo Alentejo, fugia à escola, passava tempos numa taberna à beira do caminho ali ao Furadouro, também a roubar fruta pelos campos com outros rapazes, um dia a mãe encontrou o professor Cardo, e questionou-o sobre o aproveitamento do filho, este espantado respondeu-lhe, "oh mulher, ele não me aparece na escola há coisa de seis meses" enraivecida, cansada de lhe fazer a bucha todos os dias para ele levar para a escola, confrontou-o com o sucedido, este ligeiro respondeu, "oh mãe,eu não preciso de ir à escola, até lhe digo, sei mais, do que o professor"!Tiveram sete rapazes. A seguir nasceu o Alberto de parecenças a meias com a mãe e o  pai -, bonito, de olhos para o esverdeado, lírico, poeta, na quaresma punha-se dentro do poço do engaço a tocar concertina, a mãe beata, se o ouvisse batia-lhe, tal a afronta. Parado ao rebate da eira olhava para a Portela, para  enxergar a sua amada...Com quem casou e tiveram duas lindas filhas.
Tia Clotilde
Seguiu-se a Clotilde, mulher esperta para o negócio, morena a reivindicar heranças de moira por parte de mãe era de "olhão e veia para o negócio"aprendeu costura e bordados nos Cabaços.Teve um namorado rico do Carregal, já tinham as casas quase feitas, chatearam-se, ela deixou-o.Foi para Angola e ai casou com o Américo Fernandes, seu vizinho da Horta, e tiveram 3 filhos. A Rosária era loira de parecenças ao pai  de genes dos foragidos das invasões francesas que por aqui passaram, no seu tempo já tirou o 2º ano e foi Regente escolar na escola de Albarrol onde esteve com a minha mãe que com ela andou em roda viva.Não teve filhos, todos os sobrinhos são afilhados menos eu!
Foto no adro de Pousaflores no dia de festa, o meu tio Alberto Lucas, a Clotilde, a minha mãe, pequenita junto da fogaça, a Rosária , Zaira, e a Maria Augusta a Titi. Na frente de chapéu, fato e colete, de mão a ir ao bolso o outro irmão Carlos  Lucas, de feitio arisco, nada dado a estas modernices...A Titi de chapéu!
A minha mãe pequenita com a irmã Clotilde de vestido branco e laçarote 
Em tempos de menopausa nasceu a minha mãe - Ricardina, a mais bonita de todos, loira de olhos verdes, e muito branquinha, até diziam..."tão linda, quem havia de dizer que é filha da Ti Luz", menina na mão das bruxas recebeu muitos mimos,o pai pela altura das festas gostava de as presentear com um bom tecido para fazerem vestidos novos, as mais velhas com ciúmes, diziam que a minha mãe não merecia, ainda era pequena, naquilo o meu avô respondia,"é para todas igual, são todas minhas filhas".

A minha mãe sempre foi muito bonita!
Desde a primária andou com a casa às costas para estudar, primeiro com a irmã Záira por Albarrol e Maças de D. Maria, depois com o primo Zé Lucas em Santiago da Guarda e Ansião. A casa dos seus pais o pronúncio de casa farta, rica, a mais abastada e maior no seu tempo na aldeia de Moita Redonda, muito castiça para a época e grande com três entradas. Do lado do quintal havia um grande alpendre com o chão em terra com porta  para uma saleta com uma janela, só me lembro que tinha uma mesa, desta fazia-se a ligação para a cozinha e para o corredor de acesso à casa de dentro. Cozinha pequena de janelo virada ao sol, sob este a pia em laje vermelha de lavar a loiça, sob o lume uma grande panela de ferro com água fervente.Enorme chapéu da chaminé para curar os enchidos, do outro lado uma parede em tabuado onde se guardava a lenha e o banco corrido onde se sentou em tempos o meu avô. Ainda os tripés e a tripeça para nela se comer ao aconchego do lume. Já no lado poente a escadaria em pedra dava acesso à porta principal da casa, onde nascia um corredor, do lado direito a famosa sala da varanda com muitas janelas num convite de lazer apreciar floreiras de madeira carregadas de begónias de todas as cores, uma mesinha oval feita pelo meu tio Alberto, cadeiras de encosto à parede  e uma grande arca em madeira que servia de cama quando era necessário, nas paredes fotografias -,uma com a minha mãe com 18 anos, soberba envergava lindo vestido onde sobressaiam os seus belos cabelos compridos. Outra das entradas da casa ficava a nascente onde rompia outro corredor que ladeava um quarto de cada lado -, um dos rapazes e o outro das raparigas, ao fundo a sala de jantar e o quarto da minha avó onde eu dormia com ela. Da sala ainda me lembro do louceiro com pedra mármore muito bonito, a fazer parelha com outro com espaldar e grande mesa oval , mobília comprada pela minha Titi, quando a avó faleceu tinha 9 anos, esta levou-o para a sua casa, mais tarde foi para a casa da minha prima Isabelinha por esta também se encantar com antiguidades, ainda a vi na sua casa em Leiria, não posso deixar de lembrar o rocambolesco episódio passado com esta  minha prima ao perguntar onde era a casa de banho-,a avó coitada, olhou para ela e num gesto de olhar e com as mãos mandou-a ir ao quintal, há muito que a retrete de madeira que o tio Alberto fizera tinha caído, menina habituada a casa de banho e a folhas da lista telefónica, ali teve de se desenrascar ao léu e com um telhito... Boas lembranças invadem o meu estar das noites à lareira, ouvir o crepitar das carcóvias dos pinheiros e dos galhos dos eucaliptos, sentadas em tripés, comíamos a janta da mesma palangana de faiança sob uma tripeça, empunhávamos garfos de ferro com cabo de madeira, bebia-se um copito de vinho com sabor esquisito, por lá chamado "coveiro",umas passas de figo pingo mel, nozes, ainda um pixel de abafado!
O que eu gostava depois da janta beber um pixel de abafado, servia para aquecer o corpo naquelas longas noites frias de Dezembro.
Dormir na cama de ferro, com mantas de trapos feitas no tear e cobertores de papa às riscas da Guarda. 
A casa entrou em declínio com a trombose que o meu avô sofreu no início de 1950. Rapidamente tudo se esfumou, não teve nenhum dos seis filhos que continuasse o negócio de família naquela casa. Cada um se governou como pode. A minha mãe, só tinha 18 anos quando o pai faleceu, andava a estudar em Ansião no Externato António Soares Barbosa.A mais decidida das irmãs, arrancou os móveis da loja e deu-os ao irmão para a sua nova loja em Pousaflores . Apoderou-se da casa uma tristeza, dizimaram tudo o que havia e ainda deixaram a minha pobre avó na ruína com uma dívida de doze contos na altura.Foi o meu pai que nesse tempo lhe arranjou uma espécie de reforma para ela sobreviver. Voltar àquela aldeia e confrontar-me com tamanho abandono parada a olhar a quelha que lhe dava acesso sem ser limpa, em frente à casa no ribeiro, o meu tio Alberto tinha feito um dique que servia de ponte e açude a caminho das Hortas, e à mina férrea para cozer os grelos e o aferventado, ficarem verdinhos, nada quase hoje existe, tudo é muito desolador. 
Casa da Lenha no sopé da Nexebra que foi da avó Rosa do meu marido-, dentro dentro dele irrompe o xisto em fúria!
Saudade de tomar banho na frente da casa da lenha da Ti Rosa, onde o ribeiro se espraiava no baixio depois da descida, lembro das figueiras enfezadas e pedras brancas para lavar a roupa trazidas da serra do Anjo da Guarda. O que eu brincava na pia  de pedra no acesso ao quintal e entrada da casa com raminhos de oliveira, outrora nela o macho  e a mula saciavam a sede. Hoje metade do quelho está alcatroado. Ao tempo houve quem vomitasse desculpas, com a quina da casa dos meus avós, alvitrando que a máquina não passava -, pura mentira, o terreno até ao ribeiro dá largura, o problema foi com a vizinha Maria, casa sita ao início do quelho, que não deixou alargar por causa de um poçito. Infelizmente já faleceu, mas bem se aproveitou do empreiteiro, que obrigou que lhe fizessem os degraus em plena via e ainda as valetas cimentadas, que o mesmo preceito não foi feito a outros moradores, e o deviam. A seguir à sua casa ficava o típico balcão de acesso ao barracão que foi da avó Rosa, do meu marido, tendo sido retirado, com a menção de fazerem uma escada e nada fizeram, estando sem acesso à alta porta. O certo era a estrada ser alargada às imediações do ribeiro para em caso de incêndio, os carros poderem passar ficando ao cimo do quelho ou beco um  farto largo para manobras.
Ao tempo a Junta,  falou da intenção em calcetar o resto do quelho, mas até hoje nada fez!
Ao fundo o mítico largo ao ribeiro, onde o táxi me deixava. 
Quis a sorte que a minha mãe por herança recebesse um terço daquela casa. No entanto por razões que agora não interessam a vendeu a outra irmã que tinha sobre ela o maior quinhão. Desígnios e lamentações que nos custam ainda hoje aceitar!
Se a minha mãe a tivesse comprado em vez de a vender...só sei que hoje estaria  recuperada como só ela durante anos demonstrou saber e gostar de fazer, nas várias que possui.Adora fazer obras, um fascínio que tem em preservar e de criar. 
Aquela casa morreu de pé como as árvores, depois da derrocada do telhado, do soalho e das paredes apenas a chaminé sobressaia naquele espaço de completa ruína. Ficaram ainda no quintal a velha laranjeira,o pessegueiro,a nogueira, a tangerineira e o sabugueiro que ainda teimam continuar de pé. O pior? O imenso emaranhado de silvas e rosas de silvão a fazer lembrar as rosas de Alexandria muito cheirosas entrelaçadas na imitação copiosa de desenhos em cúpulas a subir em direcção ao céu, as preferidas da minha avó Maria da Luz!

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

O festival d' Rey Chicharo em Alvaiázere!

Alvaiázere 2009 !
Ao apreciar uma das montras dei de caras com um forasteiro que se excedia dizendo à boca cheia para a comitiva que o acompanhava-, "os pratos expostos são da loja dos chineses"...
  • Vi-me na obrigação de intervir à laia de repor a verdade-, respondi, são velhos pela gordura entranhada na massa -,  são pratos da Fábrica de Sacavém, tenho iguais, ao que de imediato se desculpou. 
Na feira de velharias encontrei uma agenda do meu ano de nascimento que comprei.
Degustámos saborosos pastéis de chícharo por sinal muito bons.
  • Apreciei a mostra fotográfica dos vários Fornos de Cal espalhados pelo concelho que sempre fizeram parte do meu imaginário. Durante anos achava que teriam sido minas de gesso ali por terras de Almofala, Portelanos e Bairro nas imediações de Chão de Couce. Pena de estarem todos ao abandono, seria uma rota turística de interesse juntando os sabores da serra, falo dos tomilhos por ali conhecidos como erva de Santa Maria.
Um prazer que tantas vezes usufruí na minha rota de viagem ali na Cortiça , o cheiro é tão forte tão agradável que vejo-me forçada a parar só para contemplar e respirar...
Não vi nada alusivo à Quinta da Cortiça-, casa solarenga com pequena torre de menagem.
 
Caminhando pela vila descobri a exposição de "Alminhas" espalhadas pelo concelho, algumas minhas conhecidas, ficou a curiosidade de conhecer a freguesia de Rego da Murta, que dela apenas conheço a estrada em direcção a Tomar . A freguesia é cortada por esta via, ficando a componente histórica a lembrar os templários um pouco mais afastada da estrada, será um dos meus próximos passeios com certeza.
  • Mais montras, algumas muito bem decoradas ao tema do rey chícharo.
Mostra do ritual da ceia : bacias de faiança, há sua roda todos comiam,cada um com o seu garfo de ferro e cabo de madeira, couves migadas aferventadas embrulhadas em migas de broa e chícharos, tudo bem regado em azeite, o conduto um dente de alho a puxar o tintol e sardinha assada ou chouriça.
  • Já a acusar o cansaço vimos a ementa do D. Sancho, não tínhamos muita fome decidimos jantar numa tasca na rua principal em frente ao coreto, a comida era bem confeccionada, migas de chícharo com entremeada assada e feijoada de chícharo, o vinho era da região -,17 graus uma pomada,a sobremesa tarte de chícharo a lembrar o pastel de feijão cafés e aguardente velha.
Saímos e demos mais outra volta de reconhecimento, ainda fiz umas compras na feira de artesanato estavam alguns expositores abertos, os figos secos no saquinho de serapilheira eram deliciosos, havia-os para todos os gostos rematados por tecidos alegres a lembrar a chita de outros tempos, comprei uma rodilha minúscula a lembrar o meu Sporting e sabonetes de cheiro, havia obras de bordados muito bonitas, cestaria, muitas outras coisas, para se ver e comprar. Estava na hora de ir embora .
  • Um comentário construtivo:Acho que o povo tem de estar mais entrosado neste tipo de eventos que publicita a sua terra, devem ser mais intervenientes, participando nestes dias de festa comendo fora, andando mais na rua numa mostra de alegria e vontade de agradar aos forasteiros, motivando todo o concelho . Um reparo, se nas alturas de eleições é sabido que algumas câmaras vão buscar as pessoas às aldeias para votar porque razão nestas alturas o procedimento não é o mesmo!
Assim, sim, todo o envolvimento seria salutar e mantinham-se as tradições com o rigor dos mais sábios, os velhos, os que no tempos de outrora comiam chícharos à ceia e à janta...

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Janelas antigas com um caixilho

Um dos locais mais bonitos da minha infância que preservo fica num extremo de além a seguir à capelinha do Escampado de Santa Marta de 1708 por serras de Ansião.
O progresso quis que este antigo caminho sem saída fosse roteado para ligar este Lugar a Albarrol. Um baque!
O que se perdeu por aqui -, nem quero lembrar...grande era o empedrado a fazer lembrar calçada romana (?) de grandes pedras arrumadas geometricamente, ainda uma enorme laje plana com um pequena cruz templária esculpida.

A frágil casita meio derrubada ainda me lembro de lá ter entrado, agora de porta aberta pintada a cal, as silvas a invadir o espaço, ainda um bengaleiro feito manual muito castiço, os quartos minúsculos em tabique, onde acredito terem sido gerados e paridos sem prazer os filhos, como na época era normal...sufoco só de pensar!
Ao fundo depois da cozinha a lenha o alpendre com o forno em barro abobadado e  abertura celta em triângulo. Adoro fornos, dos cheiros da lenha a arder, das cores, do crepitar até ficar branco, sinal que está no ponto para receber a massa levedada de milho, centeio ou trigo, ainda mistura e broinhas de azeite, entaladas com bacalhau, sardinha, chouriça ou açucar...
Incrível, hoje quase tudo se perdeu!
  • O empedrado encontrei-o numa das minhas caminhadas com a minha mãe um pouco mais abaixo para o lado direito à saída do Lugar, talvez o mais provável eixo da estrada romana vinda da Lagoa do Castelo a caminho de Albarrol, Almoster, Alvaiázere onde a toponímia ainda hoje atesta nomes de aldeias como Romila e Rominha -,da existência dos fornos de cerâmica, do olival com oliveiras desse tempo com mais de 2.000 anos, dos buracos feitos nas encostas das serranias para se esconderem  fortes indícios da sua passagem por estas terras...tudo aventa que a via romana por aqui passasse, por certo não há dúvidas, tantos são os indícios nos Escampados num círculo restrito, coisa de um km sem dúvida alguma...passou!
Desde miúda que sou vidrada neste tipo de janelas em madeira com minúsculo caixilho em vidro.A primeira, a que faz parte do meu manancial de memórias existia nas traseiras da  casa dos meus avós paternos, entre a estrada real e a vila
  •  o meu pai tinha uma foto com uma folha de couve galega na mão, por detrás dele a casa de janela de madeira e janelo em vidro minúsculo...perdeu-se a foto...a casa sempre a conheci como palheiro pertença do Ti Serra , nunca registei a foto, com o tempo o palheiro pertença de dois, houve um que o  remodelou!
A segunda janela encontrei-a precisamente neste Lugar de além do Escampado de Santa Marta quando por lá ia com a comandita de cachopos do Bairro na véspera do dia de Ramos à procura do alecrim.Passaram-se os anos, mais de trinta, deixei de lá voltar, entretanto uma vez por outra tentava, alguns caminhos passaram a ser asfaltados, fatalmente perdi-lhe o norte , não conseguia encontrar a direcção, faltava-me qualquer coisa...
  • fui tentando nas várias passeatas que gosto de fazer com os cães da minha irmã, quis um imprevisto que numa tarde de domingo no meio da estrada, uma reunião para obras na capela me obrigou a desviar noutra direcção , o meu coração bateu forte, será que era aquele?
De passo apressado parti à descoberta... finalmente tinha-o encontrado!
Vibrei nas recordações de que maneira...até perdi o fôlego, tais as emoções...
  • Voltei mais tarde desta vez levei a máquina....com um baque no coração com o que via e não queria ver, nervosa pela perda irrecuperável de tanto património tremi a foto, mas volto lá, voltarei mesmo desfocada não resisto a mostra-la!
Pena fiquei em saber que o dono lhe tirou as colunas que sustentavam o alpendre, antes que as roubassem...o caixilho outrora com vidro já não o tem, escaqueirada mal se nota a cor original em amarelo, o que ainda resta o avental em pedra calcária, linda!
Quanto a esta janela pela antiguidade já não tem o vidro que lhe conferia  glamur!
Dei com ela numa das minhas caminhadas pelo Escampado de S. Miguel, vinha de mota do Marquinho e naquilo ela deparou-se à minha frente, irresistível não fotografar.
No caminho para Fátima  numa aldeola junto à estrada existe também uma, vi-a mais em pormenor quando fiz a peregrinação a pé.
Até há pouco tempo existiu na antiga estalagem do Bairro de Santo António em Ansião janelas em madeira sem o caixilho, são ainda as que se vêem mais.
No entanto para mim o caixilho pela sua pequenez, é um encanto um rasgo criativo do habitante da casa.
  • Como seria entrar no quarto e ver a luz através dele?
Que dizer dos efeitos de contrate na camisa de dormir em estoupa grossa para afugentar as pulgas, bordada no peito com monograma a vermelho pendurada no cabide...
Romântico diria!

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Arrábida piquenique e banhos!

A uns escassos 4 kms do rio  à entrada de Setúbal vindo pela nacional depois de Azeitão na 1ª rotunda corta-se à direita por uma estrada sinuosa, passa-se à desativada Universidade Moderna ,sítio de quintas umas a seguir a outras com frondosos portões e muros. Sempre a mira de seguir em frente até deparamos com a sinalética num entroncamento com tabuletas improvisadas, algumas partidas com os vários itinerários, e para a direita avisava o parque de merendas. A estratégia do parque de merendas naquele local adivinha o mesmo ser pertença de uma grande quinta abandonada que se encontra na encosta da colina. Vedado a toda a volta com rede, dispõe de 4 assadores em pedra, poucas mesas, bancos corridos debaixo das oliveiras -,já o conhecia de outra vez, aqui acorrem corropio de gente, sobretudo emigrantes ucranianos a fazer churrascos!

  • Piquenique em 26 de setembro de 2009

Postados nos lados do parque grandes troncos de eucaliptos tri -seculares jazem despidos corroídos no interior, ainda um vivo com um diâmetro a perder de vista.
Visível na encosta um grande palacete em ruínas, ainda vestígios do empedrado da estrada de acesso, mais à frente uma parede com ameias em jeito de castelo encoberto pela vegetação, seria um miradouro?
Ao lado do parque estende-se um grande terreno arenoso quase despido de ervas com cor de terra...tropecei sem saber num fóssil-, um búzio, fui com a mão, saltaram outros da terra como se estivessem dentro de farinha, aqui jazem há milhares, milhões de anos?
Adoro fósseis e outra das minhas paixões "caquinhos de faianças" que encontrei no terreno, apanhei alguns debaixo de um sol baixo escaldante...
Por certo restos da vida de outros tempos do palacete na encosta, que as chuvas no tempo descarrilaram pelas terras.

Portinho da Arrábida. Deitada na toalha na praia a saborear contrastes de sombras do sol encoberto por nuvens com o verdes das encostas crespas de vegetação mediterrânica,efeitos enigmáticos dos estratos e das cristas de calcário, misto brecha e pudim da Arrábida -, trouxe uma amostra redondinha, parece um nugget de amendoim...
Soberbo panorama de fazer perder a respiração, tanto sossego, tanta beleza incomum num lugar paradisíaco ainda por explorar.
Deixámos de mirar a Arrábida para avistar aquele mar azul com bancos de areia antes de Tróia a perder de vista, e os verdes das encostas do planalto com os prados tipo paisagem "Bocage" de fenos já cortado, ainda El Carmen que me deixou a sonhar e de que maneira!
Fazia-se horas para regresso. Na subida um acidente com um casal de mota que ficou sem travões...Claro, o INEM bloqueou a estrada, criou o pânico no trânsito, e não havia necessidade. As mulheres fizeram-se sinaleiras, ora mandaram avançar os da fila para descer, ora mandaram avançar quem como eu que  vinha de baixo, na esgueira de portas abertas e carros mal estacionados, tomámos a valeta, ao desenrasque!

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

A Real fábrica do Gelo em Montejunto






Situa-se em plena serra de Montejunto, também designada real fábrica da neve, a escassos 50 km da capital.Vinha eu na Ponderosa, num repente apeteceu-me mudar de rota , conhecer Montejunto.Gosto de andar por estradas do interior,exalta-me o fascínio pelo casario desordenado, as colinas umas verdes de floresta, outras de vinhedos, ainda muito mato, a sinalização quase passava despercebida num entroncamento com semáforos.
Aldeias castiças encravadas nas colinas da serra e dos vales imensos e profundos,inevitável uma pedreira, no ar uma avioneta fazia círculos atrás de círculos....mas que raio faria ali, perguntava-me...
  • A faixa dizia tudo, tudo!" És única, completas-me M ama P Q do Castro".
Percebi melhor quando esbarrei mesmo defronte da quinta de rija e soberba fachada imponente...talvez casamento!
Pragança -, a última aldeia grande antes da serra com cabeços de pedra debruados a vegetação mediterrânica, tipo ramalhete, naquela de continuar a subir ,sempre a subir ,o carro já ia com o ponteiro do aquecimento quase no máximo... Está a ficar velhote!
Um miradouro com muros pintados de branco e um cruzeiro, ao longe o oceano atlântico!
Continuámos estrada acima na companhia de pedras tipo ponte agudas que servem de resguardo à barreira abrupta e logo acima um entroncamento, parque de campismo, centro de interpretação da serra e fábrica do gelo, quisemos continuar até ao cume.
Montejunto -,afinal um sítio mítico outrora povoado por dominicanos que não perderam tempo em se pirarem de lá, tal a agrura do inverno... repleta de um sem número de antenas de todos os canais, de redes de telemóveis e força aérea ...uma loucura, os zumbidos, tantos fios esticadores presos em sapatas de cimento armado, pior as desactivadas, que as deixaram lá inactivas a morrer ao sol...e a destoar no contexto serrano de pedra calcária. Deparei-me com a fachada da igreja de Nossa Senhora das Neves, por detrás dela ainda vestígios de suportes em pedra usados no século XXII, até os caixilhos das janelas são em pedra, ainda ruínas do primeiro convento dominicano erguido em Portugal,uma ermida com muitas velas e ao lado umas ruínas onde ainda se vê o chão em pedras pequenas tipo mosaico e noutra os alguidares encaixados na argamassa de cal, um vidrado em verde, não resisti trazer um fragmento, louca por estes artefactos!
Subimos mais um pouco, aí sim o cume de Montejunto com uma capela de S João e ruínas de um segundo convento ,os dominicanos não queriam desistir da serra, tentaram construir outro, porém desistiram pelo tempo frio que aí se faz sentir deixaram-no por concluir, foram de vez para Santarém. Existe no grande largo que se rasga na frente do aglomerado um lindo painel de azulejo com a menção de todos os pontos de interesse na serra.
Descemos e fomos em direcção à real fábrica do gelo.
  • Tivemos a graça de ter encontrado um excelente funcionário da câmara do Cadaval, simpático, afável,mui bonito e sensível, excelente candidato para este posto, com perfil para comunicar e agradar sem presunção nem favor, simplesmente porque adora o que faz, presentear e encantar o forasteiro. 
A pé caminhamos ordeiramente por entre castanheiros selvagens que escondem um parque de merendas, ao lado um parque de campismo apetrechado -, grátis-
Incrível no meio, uma ilha da força aérea com um enormíssimo radar verde...
Aberto o portão dei conta dos pinheiros seculares arrancados do chão, restos do grande temporal, que passou por Torres Vedras, ao nosso lado direito uma grande extensão de tanques baixos que intercomunicam entre si a água vinda de um grande tanque tipo depósito onde os alcatruzes da nora à força de tracção animal faziam retirar de dois poços contíguos, dia e noite...quando os tanques se cobriam de finas películas de gelo, as pessoas eram chamadas da aldeia de Pragana para as vir retirar e armazenar nos poços , um maior do que outro em pedra, achei fascinante as cúpulas em tijoleira tipo árabe, adorei!
  • Dentro do edifício chamado fábrica cujo chão em lajes grandes irregulares de pedra, ainda vestígios de arcos podem observar-se painéis elucidativos do tempo de oiro do gelo como, "Café do Gelo" em Lisboa ainda em funcionamento e noutro uma placa de mármore a dizer vende-se Fructas, Cerveja, Neve...
Interessante foi saber que a modernice de usar o gelo como refrescante foi trazido com a corte de D. Filipe II, por volta de 1600, julga-se que começou por vir da serra de Estrela, depois das faldas da serra da Lousã, do Coentral, ainda da serra de Sintra,mas rapidamente uma atrás da outra foi perdendo importância pela distância da capital e da génese do produto, o gelo -, não aguentar o tempo da viagem...que derretia... 
Assim nasceu a ideia de fazer gelo na serra de Montejunto julga-se por volta de 1741, e em 1782 inauguram uma nova fase, o gelo também começou a ser utilizado no hospital de Todos os Santos ali na Praça da Figueira. 
  • O armazenamento do gelo era feito nos poços onde era calcado com um maço tipo calceteiro, sendo depois o seu transporte feito em carroças puxadas a jumentos embrulhado em serapilheira e palha para aguentar o calor, as viagens faziam-se de noite quando o calor abrandava até à vala do Carregado onde embarcava em barcaças até ao terreiro do paço, um percurso de 12 horas, aí chegado era transportado para a casa do gelo, não se sabe muito bem onde seria, uns dos donos da fábrica era também dono do café Martinho da Arcada. Ainda no local pude ver um forno de cal em excelente estado de conservação que serviu para a construção da fábrica e também a população.
Fiquei com inveja dos castanheiros americanos, com 10 anos, de folhas grandes, ao invés do que plantei numa courela lá na minha terra, não medram!
Valeu a pena, fiquei com a sensação que já lá estive antes, maravilhoso cenário não me sai da cabeça, o pior é que tenho boa memória...Será do programa do Dr Hermano Saraiva?...
Continuo na minha, já lá estive antes...
Adorei!

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Sonho em viver aventura nas vindimas no Douro !



Em 2008, com a herança inesperada de uma propriedade vinícola, vi-me confrontada com um dilema: apostar na manutenção ou no seu abandono.Decidi teimar na aposta da sua preservação, surgindo a necessidade de alguma aprendizagem e aquisição de conhecimentos específicos sobre esta temática, da vinha e do vinho.Através de roteiros turísticos disponíveis on-line, seleccionei uma Quinta no Douro que oferece aos seus visitantes, na época das vindimas, a possibilidade de participar nesses trabalhos, para auto valorização, aprendizagem ou somente lazer.A escolha foi aleatória, tal o número de ofertas.Fácil, foi agendar uma data e ir sem ninguém se aperceber...menti...tinha de ser!
Na data estipulada, depois de acalmada a ânsia com o aproximar da hora, cheguei à Quinta do Crasto no Douro vinhateiro.À minha espera, o capataz e o enólogo deram-me as boas-vindas.Todos sabiam da minha chegada e dos motivos da minha visita, esclarecer e aprender vários conceitos da vinha e do vinho.A vontade de começar a fotografar era imensa: a casa grande, os barracões, onde se guardam as alfaias, a serem invadidos pelas mulheres, que se apressavam a ir buscar as tesouras de poda, e a azáfama dos homens a carregar os tractores de cestos.O capataz pegou, então, na maleta de primeiros socorros, embalagens de luvas e garrafas de água.Estava tão entusiasmada com o rodopio dos tarefeiros.Todos pareciam saber as suas funções e, já instalados, lá partimos rumo à vinha do Marco do Grilo.A minha vista alcançava em redor um percurso sinuoso de estradas estreitas, rodeadas por um imenso mar de vinhedos aos carreirinhos, xisto e mais xisto a tropeçar nos pés. Ao longe o rio sereno numa de fazer caretas com as sombras dos salgueiros por entre os raios de luz… 
Interrompi os cliques da máquina fotográfica para ouvir as explicações sobre a utilização de luvas: "a casta das uvas pretas é muito tintureira e as mãos, se não estiverem protegidas, ficam encardidas".Por falta de hábito no manuseamento da tesoura de poda, ou nervosismo, cortei um dedo, de imediato o capataz apressou-se a ir buscar a maleta e a socorrer-me no ferimento.Fiz uma pausa na vindima e voltei a atenção para a minha máquina digital, que já contava com umas largas dezenas de fotos.Neste momento estava a ouvir à minha volta algumas pessoas que falavam acerca da maturação das uvas, prevendo uma colheita superior à do ano anterior.O tempo tinha corrido de feição,o míldio fez tréguas,também a última chuvinha diziam, acabou por lavar, engordar os cachos que ganharam mais doce, alimentando expressões com sotaque ...
"Olhe, as abelhas já andam à roda delas", auspiciando um ano de bom grau, quiçá de um vinho "vintage".O vaivém dos homens com os cestos cheios de uvas nos carreirinhos e os de regresso já descarregados no tanque inox do tractor, estratégica medida cautelar de higiene sem perdas de uma pinga de mosto, saíam em direcção ao lagar, atulhados de uvas, reluzentes ao sol.O almoço foi servido no arraial em plena vindima, trazido por mulheres com cabazes de verga branca.Serviram de entrada bola de Lamego, o prato rancho à moda de Viseu, fruta melão,e doces as famosas cavacas grandes que davam para encher de vinho da adega, por sinal esplêndido.Com o estômago composto com o apetitoso repasto, ouviam-se anedotas, e alguém insinuou: "Então e as fotos?"
Aproveitei o ensejo do mote e registei mais uns momentos descontraídos de todo aquele alegre rancho de gente.À tardinha regressámos à Quinta em direcção ao lagar.O rancho, só de homens que tinham vindo à frente, estava já no preparativo do ritual da lavagem dos pés para entrar no grande tanque.Dava-se início à pisa das uvas! 
Abraçados a cantarolar "Era o vinho, meu bem, era o vinho, era o vinho que eu mais adorava!" a fazer lembrar os rituais alentejanos a cambalear como ondas.As mulheres tratavam da lavagem dos cestos e da limpeza das tesouras, arrumando tudo o que tinha ido para a safra.A noite já ia longa, o corpo não perdoa e o cansaço era muito.Todo o pessoal irradiava uma simpatia sem igual, franca e sempre pronta a esclarecer dúvidas.Aprendi novos conceitos sobre um tema quase desconhecido, que me tornaram apta para seguir em frente com o meu projecto.A Quinta tem várias vinhas: Lameira, Cadela, Cantinhos e Salgueiro.Cada safra com a sua casta destina-se apenas a um lagar (tanque).No lagar havia cinco, só dois estavam ainda vazios.Depois da pisa, o mosto foi tratado com produtos químicos (a quantidade regula-se pelos cestos,compra-se nos Grémios e farmácias), o mosto ferve entre 4 a 5 dias durante estes o ritual diário, calcar duas vezes o mosto que sobe no tanque com alfaias de madeira a lembrar os rodos das salinas.Noutro tanque, registei essa tarefa, executada por várias pessoas à volta do mesmo, ficando tapado com plástico como medida de protecção.No dia seguinte, assisti noutro sector do lagar, ao vasilhame do vinho em pipas de carvalho francês, devidamente preparadas, sendo estas tapadas com um marmelo ou uma maçã, para evitar os mosquitos, o mosto continua a ferver e deita fora, quando deixam de ferver, finalmente são tapados pela rolha de cortiça.A minha aventura tinha terminado.
Numa conversa, de hora e meia, com o dono da Quinta, esclareci as últimas dúvidas sobre cava da vinha e sua fertilização.Por fim, ele fez questão de se despedir pessoalmente de mim e dos restantes colaboradores de fim-de-semana que abraçaram uma aventura diferente, na lavoira!
Quanto ao vinho, com muita pena minha, o resultado final só será provado na Páscoa, pois no Carnaval ainda devia ferver.Será que irá manter a graduação da colheita anterior, 15º?
Vamos esperar para ver e, com sorte, ainda poderei fazer uma pequena visita e prová-lo directamente das pipas da Quinta da D. Antónia.
Apeteceu-me regalar de espanto e surpresa a minha família.Para tal os presenteei na casa rural com um almoço regrado.Fiz cartazes de boas vindas alusivos que tinham ao lado dos lugares na mesa com a lenga-lenga, à falta de melhor improviso na arte de poetar:
Surpresa, surpresa! O que vem lá?
Será coisa boa ou coisa má? 
Boa será!
Humm, cheira a cozido… 
E a sobremesa o que será?
Querem uma pista?
Podem ser tintas,brancas ou morangueiras 
Colhem-se e esmagam-se de mãos nas ancas,
E o aroma? Ah, cheira tão bem! 
Mal podia esperar para mostrar as fotos de todos os registos feitos durante a minha aventura.Será que ia ganhar o desafio?
Depois de um bom cozido à portuguesa e já bem instalados no sofá e no caixote corrido, dei início ao documentário.Fotografia a fotografia fui revelando as experiências por que tinha passado,original, divertida e de mais valia como conhecimento.Tal o espanto da família era geral, estupefactos com a aventura que eu tinha vivido.
Perguntavam incessantemente "Foste tu? Mas és tu, não és?" 
O desfecho desta minha aventura... aposta foi ganha! 
Não poderia desejar nada mais do que os sorrisos e as palavras expressas naquela tarde por todos, um a um.Valeu a pena o desafio.Agora, só é preciso pôr mãos à obra naquela que será a nossa Quintinha da Mó.Bem, conhecimento já adquiri, motivação também.
Já iniciámos a poda e a fertilização do terreno.Agora é só esperar por Setembro próximo e que o ano tenha chuva e sol quanto baste.De resto, bem… já os antigos diziam "o hábito faz o monge", nesse pressupsoto o desejo para mim!

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