Em 2011 presenteio meu e da minha irmã à nossa querida mãe em reviver a rota de paneiro do seu pai, o meu avô José Afonso Lucas da Mouta Redonda, então definida numa faixa territorial a consenso de paneiros da freguesia de Pousaflores. A transaçãod e bens no alto Alentejo além da venda de paneiros e de outros produtos no comércio
ambulante, era feita nas feiras.
O ofício de paneiro admito enraizado no atual concelho de Ansião, por influência judaica nos mercadores da feira da Paz ou dos Pinhões, e a da Rainha Santa Isabel, na Constantina, ao correlacionar os confrades da sua Confraria de Estremoz, Avis, Abrantes, Coruche e Golegã. Além da coincidência do apelido Simões, Irmão da Irmandade da Confraria de NSPaz em 1623. Na aposta na deslocação para sul, onde se foram fixando noutras terras pelo alto Alentejo, a que também associo o orago de NS da Orada, em Santiago da Guarda, com Orada, em Ferreira do Zêzere e em Avis. Alguns deixaram o negócio por essas terras montado para um filho, a exemplo; no Sabugueiro, Arraiolos, fixou-se um ramo da familia do Outeiro do Pessegueiro, conheci os filhos; Arménio e o Zé Carlos, estudantes no Externato de Ansião.
O curioso cruzar de apelidos que foram vivos em Ansião e em Avis. Destaque do seareiro da casa agrícola de João Abreu Calado, o maior proprietário de Avis e do seu irmão Francisco Abreu Calado, lavrador de Benavila .João Fernandes, impulsionador da plantação de sobreiral no Alentejo no início do século XX, chamado "menino de ouro" de Évora, proprietário de várias herdades nos concelhos de Avis, Mora e Ponte de Sor. António Pais da Silva Marques Jr., e Joaquim Pais Monteiro donos de lagares de azeite em Avis. José Godinho d’Abreu dedicou-se ao apuramento de raças de porcos e ovelhas e tinha uma coudelaria. O seu irmão Cosme dos Campos Calado, herdeiro de todos os bens da família e também sem filhos, constituiu a Fundação Abreu Callado, que ainda funciona.Manuel António Botas com a matéria-prima dos outros, a azeitona, foi um grande o produtor de azeite. Avis, teve uma fábrica de sabão como houve uma em Ansião em 1630.
Na vila de Asião estabeleceram o comércio de paneiro dois irmãos apelido Simões, até década de 30 do sec. XX e depois venderam ao Sr. Pires .
O meu avô José Lucas começou a sua vida profissional como peixeiro, indo de carroça à Costa de Lavos comprar o peixe. Em dada altura um seu amigo de Lisboinha, por estar com farta idade faz-lhe a oferta do da rota sazonal que tinha pelos montes do Alentejo, que aceitou. Montou loja e taberna na Mouta Redonda com presença nas feiras anuais a 6 de janeiro em Avis, dia 27 de julho a feira de S. Pantaleão, em Figueiró dos Vinhos, a feira do 23 no Arneiro em Almoster, além do mercado de Ansião e do Cabaço (s). Em 31 de dezembro de
1911, depois do mercado em Ansião vinham os meus avós ao alto da serra do
Mouro, quando a minha avó foi acometida das dores do parto da sua primogénita, sendo
ali prontamente socorrida no parto, cortando o cordão umbical com a tesoura de cortar a fazenda. Acomodando-as entre os fardos como pode sob abafo de um
cobertor do Avelar, a caminho da Sarrada da Mata onde as deixou na casa de um
casal amigo e quando restabelecidas as foi buscar.
Graças aos relatos da minha querida mãe para não se perderem as memórias, a presenteio de aniversário de 75 primaveras fomos reviver a rota do seu pai, meu avô, com saída de Ansião, armadas de voucher ”A vida é bela” pela IC8 com paragem para admirar a barragem do Fratel. Atónita em Arez, o nicho do oratório vazio, quê dê o Santo de pedra? Café e empada em Nisa, na roda-viva à cestaria, barros decorados a pedrinhas, trapologia de felpo e queijos, a praça de cara lavada com desocupados, e pensionistas... Rumo a Alpalhão paragem junto a uma anta artificial o registo de fotos. O convento Flor da Rosa prestes a fechar, soslaio ao r/c agora hotel. Almoço no Crato na praça em Mós de granito, com o castelo de xisto pintado de branco, a fonte Perofilho em branco e amarelo, o museu fechado em obras, a varanda gótica dos Paços do concelho em granito rendilhada com arcos imita a Pax Júlia de Beja, casario com portais góticos, e Ansião com apenas um, esquecido no tardoz da Igreja da Misericórdia. Rota pela ponte no rio Seda, eis-nos em Alter do Chão na praça do castelo com cúpulas brancas jus à sempre noiva de Arraiolos. Surreal tarde de banhos na piscina da estalagem, exclamava a minha querida mãe; mal chegue a Ansião vou mandar fazer uma no galinheiro. Felizes no ginásio, e vestidas para jantar um delicioso bacalhau à Crato, remoído ao som de chocalhos no redil do chaparro ao pôr-do-sol a definhar na charneca...Bom pequeno-almoço a caminho de Fronteira eco às viagens pelo S. João em Badajoz após o 25 de abril. Jazia morta uma raposa de reluzente pêlo na chegada a Sousel antes da linha desativada do caminho-de-ferro. Almoço em Ervidel onde estabeleci conversa com um senhor cujo pai fora paneiro, e acompanhou em criança, perguntei se tinha memória de um paneiro da região centro – onde me diz; era conhecido pelo Coimbra, baixo, russo, trazia uma mala de lata na carroça, e deixava as mulas na estalagem da Ti Joana, onde pernoitava com o meu pai. No Alentejo o meu avô ganhou a alcunha “Coimbra” cidade sonante onde comprava a mercadoria a crédito, e depois de vendida era paga nos armazéns Lousada na Rua da Sota, e outro na Praça do Comercio, junto da igreja, com oferta de um corte de vestido para a sua filha mais nova, a minha mãe. Marçanos faziam o transporte dos fardos embrulhados em sarapilheira para a carreira do Pereira Marques. Transbordo em Chão de Couce onde deixava de manhã o macho com a carroça à sombra do freixo do adro, balde água e fardo de palha.
Emoção na Casa Branca ao entrar numa padaria antiga, a certeza que o meu avô ali também comprou pão, irrompeu o silêncio na reza em sua memória. Euforia em Santo António de Alcôrrego linda a casa branca e azul com data na chaminé que o meu avô arrendou para o seu filho Carlos Lucas. A intenção era casado se fixar, debalde vendeu os fardos da fazenda, e voltou à Mouta Redonda com a família e o hortelão. Lembranças da viagem de comboio da minha querida mãe com os pais para o visitar. Avis à vista, êxtase à tamanha monumentalidade dum passado esquecido, jus a Manique do Intendente…ruas sem vivalma chamava gente a buzina do padeiro ambulante de Abrantes, enfeiramos na adega azeite e vinho. Em bucólica paisagem Benavila com cavalos em pastoreio nas margens da barragem do Maranhão, a sempre linda Ponte de Sor, Rossio ao sul do Tejo, e sardinheiras em Constância. Matrena, as ruínas das fábricas de papel do Prado, e em Tomar, quem resiste às fatias da China?
Chegadas a Ansião partiamos de volta, pelo encantamento comungado de belas paisagens, cheiros, as gentes, por onde o meu avô andou a fazer negocio sazonal...