Maravilhoso...Lindo...Doce...Encantador...Deslumbrante, e...
Desalmadamente
ao entardecer, em dia de cara outonal, senti o brilho ímpar, único, numa primazia
idílica de grandeza sem igual ao alto da Serra da Ameixieira, após subir a Serra do Mouro, tendo por companhia a vista deslumbrante sobre o
cume do Alqueidão a espraiar-se no vale do planalto do Camporês-, tal contemplação só possível na única reta da estrada e mal
me descuidei já estava a entrar na curva apertada em "S" que encobria um inesperado sol a
disparar em raios luminosos, como que a dizer adeus... Sem dó nem piedade, tão
pouco pediu licença, estatelou-se em brilho incandescente no vidro do carro,
deixando-me cega... Qual beleza estonteante a lembrar o poente, assim igual já
vi por Albarrol, Costa do Castelo, Venda do Brasil, Serpa, Matosinhos...
Quiçá
um dia em África !
Espantada com o leque incrível de cores
fortes, quentes, dilaceradas a fogo vermelho raiado de amarelo e laranja, a
fugir de mansinho a caminho do mar...
Fatal não parar para admirar tanta beleza que
me sufocou de paixão!
Apressada e de mão trémula teimei registar
tanta beleza na objetiva -, desconsolo meu, constataria mais tarde a falta de
perícia no arrebatar do plano luminoso deste pôr-do-sol no Maciço de Sicó -, por
culpas do encadeamento e fascínio de beleza incomum que mirei no
horizonte ao endireito dos cumes serranos do Casal Viegas, Serra dos
Carrascos, Albarrol no endireito do Vale da Vide...
Sempre às pressas tenho por hábito
aferrolhar portas na casa da Moita Redonda para me perder mais uma
vez, outra vez nas paisagens de olival pelo Camporês -, algumas milenares
plantadas pelos romanos, mais tarde reconquistadas pelos árabes - mouros
teimosos insistiram em deixar azenhas, alambiques, noras, balanços,
nespereiras, limoeiros, alguidares, almotolias, alforges, ainda outras palavras
sem a inicial "AL" azenha, nora, adufe, hortelã,
coentros.
A
julgar o terreiro da célebre batalha de Ourique, travada
contra os sarracenos em Chão de Ourique (?) nos
planaltos da Ateanha ao limite do Camporês -,
um dos locais prováveis defendido pelo Prof. Hermano Saraiva e
outros historiadores-, honra disputada a par com Chã de Ourique no
Cartaxo, ainda Ourique em Lisboa, e jamais Ourique
no Alentejo -, mas é desta que reza o anal da história. Por aqui houve
guerras, pelos achados...e o D. Afonso Henriques estaria
por Coimbra nesse tempo e andou por aqui, isso é sabido!Derrotados os sarracenos, outra vontade não tiveram, senão de fugir às
pressas …Quero acreditar que algum mouro teimoso, ou "alma penada
se deixou ficar escondido na Serra do Mouro" no certo desígnio de
perpetuar marcas na toponímia: Alvorge, Alquelamouque, Aljazede,
Alqueidão, Albarrol além do traço visional nas suas gentes ainda hoje há
descendentes na sua passagem por estas terras com características desses genes "carapinhas,
olhos negros, pele trigueira, d’olhão, alcunha para a veia negocial " .
Sem dúvida encanto tamanho o trajeto de subir a Serra do Mouro a
caminho de Ansião ao entardecer, no alto o refúgio abandonado dos "Caçadores" mal
estimado e preservado -, tão bonito que foi, um desespero! Também o inverso é
verdade, pela manhã tenho visto ao cruzamento para o Alqueidão bandos
de perdizes e perdigotos atrás da mãe ordeiros abanicando as penas do
rabo...tem vezes que paro, me atrevo a correr para os tentar apanhar -, mal me
sentem, aceleram a marcha até que se atrevem a voar...
Em plena descida, na curva maldita, na berma ainda os grandes
pedregulhos recordam-se sempre a morte do Isaías
Cassiano que foi do Casal das Sousas -, rapaz bonito, educado, simpático
que conheci aspirante no Tribunal -, andava em despedida de amigos para voltar
a França na década de sessenta onde procurou nova forma de vida, na mota
emprestada pelo meu pai, seu amigo, no gozo de "vacanses" nas mãos nos levou presentes:
champanhe, Marie Brizard e chocolates…
O ritual da "chega" do porco à porca…Grande o
corrupio apressado das mulheres da Lagoa
da Ameixieira, do Cimo da Rua, Pinhal Terreiro, Quelha da Atafona, de
tantos lugares – munidas de
varapau na mão, encaminhavam apressadas as porcas a caminho do curral do
barrasco cobridor, na casa do Ti António
Moreira no Bairro de santo António. Viril ficava o barrasco, quando a porca entrava à cancela de madeira do
curral -, não se fazia rogado em começar a corte da cobrição -, os cachopos, em
passo de corrida mal sentíamos tal caminhada na ladeira da Cerca (onde
funcionou o hospital), esfalfados na corrida atrás da porca a olhar para o rabo
torcido, já no curral dependurados no tabuado, qual palco em frenesim
inusitado de dança e andança, do poleiro do porco no traseiro da porca, sem
perceber porquês...
- Um dia perguntei à minha mãe o que era isso da "porca ir ao porco" e não me safei de um brutal estalo com a retórica "vê lá se queres levar mais "...
Estranho era também ouvir falar "entre dentes" da
mulher do … de quem se dizia "à boca cheia ser uma grande
vaca…" e nos livros -, a vaca era um animal
pachorrento que comia erva, ruminava horas deitada para dar leitinho... nisto,
interrogava-me, será que também ia ao boi (?)
Gentes da Lagoa e Ameixeira... ,Lugar que nasceu à volta da lagoa que lhe ditaria o nome - nada mais que uma (Dolina) apesar de antropomorfizada ao longo dos tempos pela construção de muro delimitador para retenção de águas - não deixa de ser uma bela geoforma cársica do Maciço de Sicó como ainda felizmente existem muitas na região, na primavera cheias d'água são lindas de observar.
Tenho
apreciável apresso pelo "Ti João cantoneiro" que conheci ao Ribeiro da Vide na Casa de Cantoneiros -, antes de rumar a França, bom homem tal qual o Saguim -,os mais
simpáticos, no cumprimento diário,
quando nos cruzávamos.Trabalhadores teimosos na tarefa de tapar os buracos das estradas da vila, e das vezes de os ver
acender a fornalha da máquina do alcatrão, onde hoje é a casa da família Tarouca .
Também da hospitaleira esposa D. Helena e dos filhos: Odete
(minha comadre, doçura de senhora me presenteia amiúde) Carlos Alberto,
Arminda, Alfredo, Sérgio e Paulo Silva, todos muito simpáticos, humildes, amigos
do seu amigo e mãos francas para obsequiar.
Na sua casa já estive por várias vezes onde as mesas se apresentam sempre fartas de bom pão cozido no seu forno, o mesmo das carnes servidas em travessas Vista Alegre de grande fineza delicada pela antiguidade , bom queijo e salpicão, tordos e perdizes na brasa, para não falar da variedade de doces onde o Pão de Ló sendo enorme de alta confeitaria, pela mão da D. Helena. E claro bom vinho!
Renato -, neto do "Ti João cantoneiro" a tocar acordeão -,
arte que o avô também foi artista, sob o olhar orgulhoso do pai Paulo Silva e
do meu marido em abril de 2011
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Difícil esquecer a Amélia dos olhos tristes...
Que Deus levou tão cedo da nossa presença e acredito nunca foi feliz
nesta vida com o marido Serra do Escampado, sendo 17
anos mais velho, bem a devia ter estimado, porque mulher tão trabalhadora,
sofredora em silêncios e humilde, nunca conheci outra assim igual!
Também do "Ti Fidalgo" -, alcunha de António Ribeiro -, fazia artigos de cestaria com palha de centeio presa a tiras de plástico preto que aproveitava das encomendas para fazer o feitio-, na sua falta usava silva seca para prender a palha. Das suas mãos saíram cirandas para limpar a azeitona com pauzinhos de oliveira ou urze; o palhão, usado para tapar a massa da broa a fermentar; fruteiras de pé alto e, ...
Exemplares na casa do meu compadre Fernando Moreira |
Casal Soeiro: as manas Helena e Mariazinha no tempo que foram criadas
de servir em casa da minha tia Carma Russa…
Em abono da verdade -, a Mariazinha de seu nome Maria Irene...a tia Carma
quando as contratou chamou a recato a Irene na obrigação iminente de lhe contar
um episódio íntimo que lhe era desfavorável e cuja interveniente tinha o mesmo
nome "em jeito de pedir, a tia perguntou-lhe se não se incomodava
de ser tratada por Mariazinha"… boa moça, meiga, acedeu ao
pedido, ainda hoje assim me lembro dela, graciosa, tanto quanto a irmã.
Raparigas boas amigas -, quantas boas recordações da cumplicidade
de tanta amizade.
Chegava
ao balcão da mercearia de cesta na mão, logo os meus olhos corriam os
armários para descobrir a farinha Amparo - , enquanto isso elas de
corredor na mão aviavam colorau doce e pimenta em cartuchinhos de papel
pardo, arroz e açúcar amarelo, já o bacalhau e a raia era
cortada na grande faca que até estremecia o balcão, as sêmeas para os
porcos aviavam dos sacos de atilho corrido arrumadas na arrecadação
debaixo da porta para o sobrado -, um dia ouvi a tia na conversa com o
vendedor " oh senhor a margem das sêmeas nem se sente, estou
a perder dinheiro..." debaixo do balcão arrumavam os paus de
sabão azul ou rosa, pacotes de Omo e Sunil, para lavar a roupa e no teto e
nas portas penduravam tripas secas de cheiro nauseabundo para fazer as
chouriças e as morcelas, e claro rebuçados, elas davam sempre uma mão
cheia deles. No pátio ao fundo aviavam malgas de água-pé escura a escorrer
pelo vidrado...aos homens sôfregos por pinga!
Recordo também a Alice que foi empregada no
hospital, além de boa empregada tinha umas mãos delicadas para o crochet.
Tive um colega no Externato -, o Henrique, se não me falha
a memória é do Casal Soeiro ou será Ameixieira?
Ribeirinho ou Casal Soeiro (?) O "Ti Zé das
Notas" rara a semana que o não via nos seus terrenos na
proximidade da minha casa -, o que me lembro dele, baixote e
pitoresco.
"Ti
Zé Reis" também
velhote, magro, simpático, vinha muitas vezes ao seu grande terreno de
pinhal, milheiral e vinha na frente da minha casa, onde se especulou a
Câmara pretendia fazer o mercado - que bem ali teria ficado, porque a vila
merecia já nesse tempo encaminhar-se mais para o Carvalhal…
Empiados: Isaura linda e bondosa mulher que conheci padeira.
Paisagem de cariz mediterrânico. Avassalador parar. Nunca me canso de a
mirar ao alto da serra da Ameixieira -, melhor quem se
atreve como eu a entrar nela dentro na procura incessante de pedras esculpidas
pela erosão...
Quando descobri esta logo me fez recordar as botas que o sapateiro fazia ao meu tio Chico...
Em baixo espécimes de machados de pedra do tempo do neolítico (?)Também aqui encontrados por mim!
Artesanato...Mantas de lã da CUF feitas por um tecelão do Avelar, de cariz romântico, airosas com passarinhos, da minha comadre Odete, intervalados com corações e flores.
Flores...Nascem na serra espontaneamente à toa semeadas pelo vento; lírios, alecrim, oregãos, funcho, rosmaninho, urze branca, murta, esteva, arruda e orquídeas.
Gosto sempre de ir à serra apanhar flores para o meu oratório na Páscoa!
Flores...Nascem na serra espontaneamente à toa semeadas pelo vento; lírios, alecrim, oregãos, funcho, rosmaninho, urze branca, murta, esteva, arruda e orquídeas.
Gosto sempre de ir à serra apanhar flores para o meu oratório na Páscoa!
Rosas albardeiras por aqui chamadas de cucas, na frontaria da primeira casa ao vir da Serra do Mouro, na Ameixeira-, lindíssimas.
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Venham descobrir, quem tiver um bom jipe ou mota4 no cimo
da serra atrevam-se a descer pela nova variante, atravessando o costado...Mete
respeito a descida, na planura do vale, perdido de vegetação exuberante, e
animais -, coelhos e perdizes, quem sabe raposas e ginetos, onde julgo um dia
passou perto a via romana aparecem courelas, e do lado direito um contraforte
altaneiro brutal em pedra,- de defesa natural.
Idílico para amar!
Gotículas de orvalho num lírio roxo...
Tudo é belo por esta terra implantada nos costadas das
serras...
Onde ainda persiste casario em pedra de traça
típica com janelos, escadas, varandins, currais e eiras.