Desenfreada em frenético prazer e aventura à laia de Françoise Choay, historiadora e investigadora das teorias e formas urbanas e arquitectónicas ao curioso interpretar do vulgo mosteiro, ao Vale Mosteiro que foi plantado a sul do primeiro burgo de Ansião. Na oralidade corria o dito ainda vivo - a cama em pedra da Rainha Santa Isabel ...Depois da minha vida de trabalho mais disponível em tempo de reforma para me dedicar com paixão ao passado de Ansião. Demorei mais de meio século a conjecturar um sonho, que tinha sido palco de um pequeno mosteiro...Debalde nada havia escrito e o topónimo Vale do Mosteiro e hoje Vale Mosteiro, induziu-me a más interpretações.Tomei como linha de investigação o parecer do Dr. Manuel Dias "(...) Falando ainda de História, mas de Ansião, cada vez mais me convenço que não houve nenhum Mosteiro em Ansião, o que houve foi uma Igreja dedicada a S. Lourenço na parte Poente da Vila, que hoje não se vislumbra onde seja (provavelmente aquela de que conhece vestígios). E digo que não houve convento porque a documentação vernácula do início do século XVIII descreve a vila e as suas instituições e não fala do Convento (diz-se sempre que há ligações da Igreja local com o Convento de Santa Cruz de Coimbra). O António Simões levou-me ao local, mostrou-me um arco de volta perfeita e registou outras fotos."
Seguidamente o Sr Padre Manuel Ventura " (...) Sobre o Vale Mosteiro pouco ou nada sei. Como sabe, a Igreja velha de Ansião ficava para aqueles lados dentro do atual cemitério, e era pertença daquele Mosteiro. Penso, mas não vi isso em nenhum documento, que perto da Igreja teria de haver residência para os párocos frades que serviam a paróquia . O mais provável é que tivessem dentro do próprio solar uma capela, para não terem de se deslocar por tudo e por nada à igreja, quando atendiam pessoas ou faziam as suas orações comuns.A esta residência não chamaria "Mosteiro" mas uma sucursal do Mosteiro. O povo entretanto era capaz de lhe chamar mosteiro. Lembro-me de quando eu estava em Figueiró ter consultado muitos livros e documentos sobre mosteiros na Biblioteca da Universidade de Coimbra e na Torre do Tombo e nunca me apareceu referência a mosteiro algum em Ansião."
No Livro Ilustres Ansianenses do Dr Manuel Dias, refere em José Luiz de Macedo (...) o local do primeiro burgo, foi a poente, o povo no seu linguarejar chamava Ribeiro da Igreja. Descobriu-se à pouco tempo um seu pagamento de foro de um seu cerrado ao Ribeiro da Igreja (Ribeiro da Vide) ao limite do cemitério que aparece referenciado na escritura da minha avó, Piedade da Cruz, a quem o pai dela teria comprado à posterior aos herdeiros. O topónimo Ribeiro da Igreja atesta em definitivo a primeira igreja foi localizada na junção dos cemitérios - do velho e do novo, no seu ponto mais alto e não, onde foi a capela de S Lourenço, ambos os cultos existiram mediados pelo adro velho inseridos no olival de S Lourenço da quinta com este nome, foreira do Mosteiro.
No Livro de 1986 do Padre Coutinho (...)Embora já existisse anteriormente, apenas no último quartel do séc. XII urgem as primeiras referências escritas àcerca de Ansião , mediante os documentos em que o Mosteiro da Santa Cruz em Coimbra - na pessoa do seu Prior Dom João Teotónio - ali aparece a adquirir bens a partir de 1175.Era uma extensa propriedade que, demarcada por três limites determinados, confinava a nascente pela Moita do Açor, dai seguindo o cimo da vertente até ao lombo da Fonte Galega; descia para o Pedrulhal e ia até Figueiras Podres . A poente Osumio e esmoliadouro em Ansião; a norte, a ribeira de Sarzedela .
No Estudo arqueológico da prospecção no Vale Mosteiro em 2010 classificado Mancha de Ocupação Romano e Medieval Cristão « (...) O Vale Mosteiro está limitado a Norte pela Igreja Velha e a Sul pelo Ribeiro de Vide. Para J. E. R. Coutinho (1986), o topónimo "designa não um mosteiro ali existente, mas o vale pertencente ao Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra. Pois segundo o autor, as estruturas que observou no local, eram propriedade daquela instituição religiosa, até à extinção das Ordens Religiosas, em 1834, de acordo com o que refere o Livro de D. João Teotónio, fl. 10 e 142 v.º a 144 v.º, sobre a aquisição e localização da herdade de Ansião pelo Mosteiro. A própria tradição popular (lenda da Rainha Santa) é reveladora da importância de Ansião como possível ponto de paragem para descanso dos viandantes, bem como da existência de um esmoliadouro. Este topónimo indica que havia um local, propositadamente preparado para que os viandantes deixassem as suas esmolas, o que logicamente seria junto à estrada. Também o Livro de D. Teotónio o refere, onde entre as delimitações registadas da herdade de Ansião, aparece o "esmoliadouro". Assim a estrada designada por "estrada coimbrã", passaria por Vale Mosteiro e Igreja Velha. No decurso da prospeção levada a cabo numa área com 166.980 m², foram detetadas a Sudeste do estaleiro do município de Ansião, num local que se encontra ocupado por uma construção devoluta, estruturas que, pela sua volumetria aparentam estar parcialmente soterradas, e que foram reutilizadas para o levantamento daquela construção. Numa habitação contígua identificaram-se também alguns elementos arquitetónicos, que poderão estar relacionados com as estruturas detetadas. E que se encontram integrados numa escadaria, que permite o acesso ao primeiro andar da habitação. O sítio em questão faz parte do conjunto de sítios que se identificaram no perímetro urbano da vila de Ansião, onde foram detetados vestígios com interesse arqueológico. Tendo em conta a informação existente sobre a localização e o tipo de espólio que foi detetado, é lícito interpretar a mancha de ocupação em causa, associada aos vestígios que se encontraram por uma vasta área na malha urbana da vila de Ansião, que vai desde a Igreja Velha até ao Vale Mosteiro (limite Oeste da vila), passando pelo centro da povoação, na Avenida Victor Faveiro. Neste sentido, poder-se-á estar na presença de um assentamento do período romano (uma possível Villa) e do período medieval.»
Qual a opinião a retirar do que aqui existiu afinal?
Verossímil a imagem transmitida dos relatos sobre a quinta de S Lourenço, ao Vale Mosteiro, uma das cinco quintas que vieram a constituir a Herdade de Ansião, em relação às outras quatro teria já a valia da estalagem. E ainda seria a última (parcela) a ser adquirida em Junho de 1176, segundo o Livro de 1986 do Sr Padre Coutinho" o oitavo final, a Pedro Soares e a sua mulher Maria Pais, por igual preço do anterior e constitui a Herdade de Ansião."
As antigas vias romanas a privilegiar Ansião, em época medieval tomaram nomes diferenciados. A estrada de Braga a Lisboa com traçado por Vale Figueira, hoje Figueiras de S. João, teve derivação para a Constantin, Lagoas, onde se bifurcou com dois troços: nas Lameiras, Nabão, Vale Mosteiro, veio a ser chamada estrada real. Com o abandono do burgo antes de 1593, que se mudou de poente para nascente, onde está, foi reativado o outro troço romano que derivava abaixo das Lameiras, paralela ao Nabão onde o ultrapasasva na atual Ponte da Cal, talvez por ponte de pedra ou de madeira. Seguia pela frontaria da igreja, Cimo da Rua, Empiados, Casal Soeiro, Casais Maduros, Venda do Negro e Alvaiazere, no atual Caminho de Santiago de Compostela .
A via romana XVI, de Antonino, bifurcana ao limite de Ansião, na Varzea de Aljazede, A via principal seguia pelo algar da Povoa, Venda das Figueiras, Togeira, Pontão, Cabaços, Rego da Murta, que em época medieval tomou o nome de Estrada de Coimbra .
Em setembro de 2016 nos Cadernos de Estudos Leirienses nº 9 de Saul António Gomes e Mário Rodrigues. O Povoamento do Território de Ansião nos séculos XII/I
(...) in ocidente à Sumo e Esmoliadouro de Ansion - Pedro Soares e a mulher Maria Pais vendem ao MSCC uma herdade em Ansião.
Retira-se das duas transmissões - o Sr. Padre José Coutinho apresenta-se mais completo na descrição - aquisição da última parcela, o oitavo final. Induz dizer tenha sido o mais difícil de vender pela riqueza associada da estalagem para ter ganho novas valências dadas pelo mosteiro - cadeia e a almoçateria, verossímil afirmar. E ainda porque o apelido Soares continuou vivo na vila. Na centúria de 700 da mãe e do avô materno dos ilustres - Soares Barbosa, cujo pai de apelido Freire foi intrinsecamente ligado a Ansião, nesta quinta de S Lourenço e nas envolventes; Quinta das Lagoas e Quinta do Bairro .Ainda se verifica a discrepância nos dois autores, ao topónimo mencionado a poente de Ansião:
O Sr. Padre Coutinho refere Osúmio - o relaciono com o topónimo actual Suímbo, antes da Sarzeda.
E o topónimo Sumo para o mesmo local referenciado nos Cadernos de Estudos Leirienses.
Quem estará certo?
«O Vigário de Ansião António Martinz a 19 de Março de 1627 relata no elenco das capelas (...) a de São Lourenço no adro velho fabricada pelos fregueses sem para isso o mosteiro Contrebuir Com Cousa algua, sem obrigação alguma do mosteiro.»
Retira-se do excerto que a capela de S. Lourenço foi instituída pelos fregueses.Na envolvente do que foi o seu palco, nas escavações arqueológicas foi identificada uma mancha de ocupação romano/medieval cristão. Verossímil no passado houve reaproveitamento do habitat romano e moçárabe onde foi fundada a primeira estalagem antes de 1175, cujo esmoliadouro já existia por aparecer referenciado nos limites desta herdade, cujas esmolas serviam para apoio caritativo a necessitados, enfermos e pobres na costumada prática assistencial desde sempre associada à Igreja, mosteiros, albergarias, estalagens, pousadas, albergues, os muitos nomes para definir lugares de passagem, implantados na beira da estrada, quem efectivamente prestava ajuda aos desafortunados ali aportados. A Enfermaria seria dotada de enxergas para descanso a quem chegava cansado e doente, com ala diferenciada para a acomodação dos passageiros mais limpos, comparativamente com análogas assim acontecer, para lembrar a cama em pedra onde a Rainha Santa Isabel tenha alguma vez dormido, se aconteceu, em Ansião, foi aqui e não noutro lugar. Portanto a estalagem seria apetrechada com alcovas diferenciados para os viandantes pobres e sujos dos limpos, asseados e endinheirados. Todos tinham direito a se recolhe, alimentar e receber cuidados nas doenças. Naquele tempo a lembrar-me da cozinha do meu bisavô, acredito foi mais tarde outra estalagem, com grande lareira e grande chapéu assente em poderoso tronco de madeira, na sua volta bancos para se sentarem, além de favorecer o aquecimento em tempo de friagem, era o meio para se cozinhar e ainda ter água quente para amassar o pão e para se lavarem. Também aqui os enfermos procuravam curas que os afligiam e lhes seriam administradas mezinhas e tisanas da sua botica, estes povoadores vindos da Galiza, entre celtas e judeus sefarditas, letrados com talento , no conhecimento de ervas medicinais então abundantes nas serras de Ansião e das quais sabiam tirar proveito em misturas para fazer emplastros e enxundas, as gorduras das galinhas derretidas em púcaros, depois usadas sobre feridas e dores, em rituais de rezas e lengalengas. Recordo a que me fizeram para matar o cobrão - no chão de cimento palhas de alho com enxofre e azeite, tudo pisado a martelo e dantes em almofariz, a papa colocada no sitio enfermo e coberta por ligadura. De facto sarou e antes com a botica do médico não. Os viandantes depois de revigoradas forças voltavam ao caminho e outros substituíam as cavalgaduras estafadas dos caminhos pedregosos da viagem por outros mais descansados. Mais tarde com o aparecimento das Misericórdias e dos seus hospitais , passaram estas a cumprir essa função social, no continuado procedimento a receber pobres e viandantes de todas as estirpes na sua jornada de viagem e também de peregrinos, no mesmo apoio; comida, descanso e na doença até recuperação de forças para prosseguir viagem recebendo Cartas de Guia, e também se despachavam as que chegavam das demais Misericórdias.Desse tempo há registos de viandantes que morriam na estalagem ou no hospital.
Tive o privilégio de ter vivido a minha infância e adolescência relativamente perto desta centralidade que conheci em meados dos anos 60, do séc. XX, perto da casa dos meus bisavós, a sul do vulgo mosteiro, ao Alto da Vinha, no mesmo caminho do cemitério onde ia enfeitar as campas de familiares, com a tia Maria e ainda atalho à fazenda da Lameira, para fugir ao Fundo da Rua .
O vulgo mosteiro tinha duas entradas onde moravam famílias em paralelo com ruínas .
A antiga estrada real, recordo os altos muros abobadados a caliço escuro com grandes buracos esventrados dos rodados dos carros dos bois.
Aos 8 anos em férias de Natal, depois do almoço com a minha irmã Mena, pegámos nos cestinhos de verga que o nosso pai encomendara na Feira dos Puseiros, em agosto ao "Ti Zé Mau de Aquém da Ponte" e partimos para a fazenda da Vinha, a fazer de conta de as encher de azeitona para retalhar, e enfeitar a campa do nosso caniche, o "Franguinhas" sepultado debaixo de um frondoso pereiro, como tinhamos visto no jardim zoologico em Lisboa... O céu escureceu de tal maneira medonha, a ditar abrigo no Mosteiro, a escassos 100 metros. Metemos pés ao caminho a saltar buracos de pedra em argila amarela , hoje parte da Avª Sá Carneiro . Mal chegadas ao gaveto da entrada sul, havia uma pequena casita em ruína, onde se presume esteve uma Cruz alta assinalando o Esmoliadouro, pela segurança e proteção a ladrões, pela estalagem. E, possível portagem do complexo por a entrada da capela ser por aqui e na entrada a norte, um portelo, a cadeia e as cavalariças. Distingui na entrada sul à direita um rectangular relvado debruado a patamar fino em pedra com friso relevado, e ao fundo portal arqueado virado a poente, igual ao que conhecia no tardoz da Misericórdia, que revia em tempo de cerejas no jardim do Tribunal, pese de menor dimensão . Foi preciso alçar a pernita para subir a sapata, e no portal, arrojar a portada de madeira, esbranquiçada de velha e entupida de cordéis no buraco da fechadura, extraordinária visão de alvas lajes quadradas a jus de passadeira, em corredor largo ladeado a terra e, ao fundo, no que foi o corpo da Capela de S Lourenço, e depois a morada “do Miguel e Miguela” até um incêndio apressar a venda com emigração para o Brasil. Fechado um quartito a norte, seria para não profanarem objetos de culto cristão, uma pia de água benta, e uma Cruz alta em pedra. No cimo das paredes haviam restos de arcos que teriam sido da sustentação da cúpula da Capela de S. Lourenço. Brutal cenário grotesco com um grande buraco no telhado onde se via o céu negro aterrador, com barrotes negros em derrocada de telhas Marselha a pender sobre as nossas cabeças...Demorei anos para entender a razão das telhas serem iguais às da casa dos meus pais, quando a maioria do casario as tinham mouriscas de canudo e, se aqui tinha sido um mosteiro, a razão de haver telhas recentes...Pois ainda estava longe de saber que após a extinção das Ordens Religiosas, estas ruinas foram vendidas a vários compradores onde cada um fez a sua morada, reutilizando materiais e adaptando outros. A luz que entrava por outra porta da capela, aberta a norte, ditou o mote de saída na ligação a um corredor lateral com acesso a um portelinho de ferro forjado de ombreira encimado por elegante e gracioso pescoço a remate de esfera em pedra, como já conhecia outras maiores, no Convento de Cristo em Tomar.
Anos mais tarde a Carmita do Bairro disse-me que tinha recebido de herança do sogro a parte que foi a capela, o seu marido tinha vendido ao "Ti Inácio do Bairro de Santo António" a pia de água benta que a despachou na Feira da Ladra em Lisboa e a Cruz em pedra o marido a vendeu para a capela do Cemitério novo de Santiago da Guarda. Perguntei pelo Santo, disse-me que não havia nenhum . Depois de muita procura o localizei na Capela do Cemitério, pedindo nessa altura ajuda ao Sr. Padre Manuel Ventura Pinho, para identificar a Imagem, pois não a reconhecia . Evidências que ali tinha sido fundado um pequeno mosteiro pela existência da capela outros ditos; o túnel a ligar a Santa Marta, e os arcos de volta perfeita na ligação ao Senhor do Bonfim, caídos com o terramoto de 1755 ficando de pé apenas um que se distinguia no casario a norte...Na boca das minhas primas Júlia e São Silva do Bairro, e das vizinhas e amigas Lúcia e Tina Parolo do Ribeiro da Vide e outros . Demorei a refletir que a ligação dos arcos ao Bonfim, não me parece viável pelo grande desnível do vale e do costado. O único arco de volta perfeita que havia no exterior, segundo as minhas investigações foi da entrada para as cavalariças. Com o abandono do burgo por volta de 1593, houve reutilização para lagar, além da pedra do senfim, descobri mais dois arcos de volta perfeita na cave da casa que foi do "Ti António serrador" associada ao plantio de vinha, sendo vivo o toponimo Alto da Vinha, morada da minha irmã.
Sobre o túnel na ligação a Santa Marta... A Fátima Carvalho, uma das herdeiras de um lote que esteve em venda transmitiu-me " adorava que a casa tivesse sido uma parte do Mosteiro, o meu avô filho do António, serrador dizia que sim, que ate existiam uns túneis que levavam os moradores até à capela no Escampado ou lá perto, já não me lembro bem". O túnel pode ter sido uma realidade a ligar a igreja matriz que foi a primeira assente no palco do atual cemiterio. Separa os dois cenarios um extenso olival, pese trajeto curto, servia o padre quando vinha celebrar Missa na capela de S.Lourenço, aos viandantes importantes, estrangeiros e nacionais, a resguardo de salteadores. Pela existência de um buraco a poente da capela de S.Lourenço, aventa vinha da igreja e não para o Escampado de Santa Marta, nem da quinta da Boavista, no Senhor do Bonfim. Pese em ambos os locais viveu gente importante na centúria de 500, quem instituiu três capelas, hoje apenas existem duas em Santa Marte e S. Miguel . Nos registos paroquiais nesta época aparece com muita frequência André Freire, no papel de padrinho de muita criança da quinta de S. Lourenço.
A Fátima Pego do Bairro", em miúda entrou neste buraco na frente do portal da capela e dizia havia um algar". O "António Simões, Arrebela" nascido e criado no local, confirmou a existência do buraco mas nunca lhe viu jeito de ser túnel, cujo teto feito com uma laje de um varandim que foi da capela onde a irmã criava coelhos. Confirma que a laje foi reutilizada para fechar o buraco para coelheira, o que parece viável afirmar. Contudo é estranho a existência do buraco ali para ser expectável a ter existido um túnel tenha sido o terramoto de 1755, que o desmoronou na entrada, debalde jamais se apurou e devia! Dizia ainda que ali se tinham escondido pessoas no tempo da guerra…
Mas que guerra, seria na passagem dos invasores franceses?
Afinal o móbil do que aqui existiu?
Verdadeiramente aclarado o que aqui se viveu em leitura mais atenta ao ponto 2.1.3.6. do Livro do Sr Padre José Coutinho - Clérigos Franceses «( ...)Dom Edme de Salieu, abade de Claraval, veio à Península Ibérica visitar as abadias cistercienses em companhia de uma comitiva, entre os quais o seu secretário, Frei Claude de Bronseval, o autor do diário das viagens, onde descreve as sínteses das ocorrências: - Dia 6 de julho de 1532, depois de percorrerem uma péssima estrada que os trouxe do Rabaçal, chegaram ao lugar campestre de Ansião, onde foram bem recebidos num bom albergue; ali almoçaram bastante bem e dormiram. Dia 7, de manhã, ouviram Missa na capela onde na véspera já tinham celebrado, e meteram-se por um terrível caminho através de montanhas extremamente altas, arborizadas e cobertas de rochas... Extraordinário excerto em ditar a imensa luz do que aqui se pretende afirmar dia 7, de manhã, ouviram Missa na capela onde na véspera já tinham celebrado. Em 1532 o burgo tinha a sua igreja primitiva, de orago a Santa Maria de Ancião, desde pelo menos 1259, no palco do cemitério novo .O autor ao referenciar capela, e não Igreja e, a ausência do Padre, parecem legitimar em definitivo, o palco da estalagem que aqui existiu e, não de outra em Ansião, pela análise ao volume arquitetónico do complexo, reutilizado por povoadores anteriores, romanos e moçárabes, em local estratégico de formato quadrado, ao jus de forte, sustentado por muro alto a poente e pela frente a estrada real com o seu Esmoliadouro, derrubando em definitivo o que julguei anos ter sido um pequeno mosteiro outra coisa não foi que o primeiro albergue como lhe chamou e bem, em Ansião, na beira da estrada real (...) a 7 de dezembro de 1532, dirigindo-se para Évora de novo por aqui passou Frei Claude de Bronseval, fazendo uma descrição semelhante à anterior, onde pontualmente insiste na particularidade da estrada: passada a ponte de Coimbra, sobre o Mondego, era pedregosa e muito má , ao longo de uma légua; a outra légua que ia até Cernache era de estrada plana,dali a Rabaçal era bastante boa; em seguida, tornava a piorar, de modo que a légua até Ansião era cheia de rochedos, de muitíssimos penedos e coberta de imensos escolhos, e fastidiosíssima. Em Ansião, ficaram hospedados numa excelente e honestissima estalagem, onde já anteriormente, tinham estado e ficado. No dia seguinte, depois de esperarem ouvir Missa, até as 8 horas, o que não aconteceu, partirem por uma estrada horrível, para a vila de Alviázere».
Na descida ao vale a poente, assolou-me a nítida sensação de aparente forte, onde distingui uma pedra retangular esculpida a formato de gárgula, se juntar o arco gótico do portal da capela, a passadeira lajeada, a pia de água benta, a Cruz alta, arco de volta perfeita no exterior a norte , e mais dois na cave da casa do “Ti António Serrador” a pedra de senfim, dois varandins em pedra, sapata reutilizada em degraus na casa da Deolinda , dois fragmentos de coluna que pode ter sido do primeiro Pelourinho, janela com grade de ferro da cadeia, culmina o empreendimento estalajadeiro já activo antes do séc. XII, com Capela e Enfermaria, e depois de adquirida pelo Mosteiro a ganho de novas valências; Cadeia e a Almoçataria - onde se transaccionavam os produtos do burgo ; vinho, azeite, farinha, entre outros .
A aguarela de Pier Baldi de 1669
A primeira representação icónica de Ansião, apresenta casario adoçado à igreja primitiva no atual cemiterio, afecto à residência do sacristão e do padre, frade crúzio e, também aqui em Ansião na função de Procurador do Mosteiro com outros frades serviçais na supervisão e cobrança de foros, de os levar para Coimbra, e ainda teriam a função de controle da sede da almoçataria e do (s) seu(s) almocaté(s) aos pesos e medidas usados.
No Livro do Sr. Padre Coutinho « (...) Dar cada povoador, anualmente,uma fogaça , dois alqueires de trigo em dia de S Miguel e um capão. As mulheres pobres dessem, apenas, cada ano,, uma galinha.Se alguém ali quisesse morar sem cultivar a terra, desse todos os anos um soldo. Se ali o Mosteiro quisesse vender o seu vinho, que o vendesse durante um mês e sem que nesse tempo alguém da própria vila lá vendesse outro vinho. Se alguém nesse mês trouxesse vinho de fora e o quisesse vender, devia dar um almude ou o seu preço em dinheiro. Se alguém ali quisesse edificar um forno ou moinho, desse ao Mosteiro a décima parte do rendimento.Se na praça alguém vendesse um porco, desse um lombo.De carneiro ou de gado miúdo, desse um só dinheiro. De vaca, seis dinheiros. De cervo. dois dinheiros. De pescado e de sal, pagassem como os de Abiul. De portagem, o Mosteiro nada determinava.Se alguém tivesse uma besta e fosse almocreve, fizesse uma viagem desde Leiria, ou duas a Ansião ou do Ulmar. Se alguém quisesse vender os bens,que os vendesse ao homem que ali habitasse, fizesse foro dele e desse a décima parte.Tais princípios de coactividade, assim preceituada, são reconhecidos como exigências de ordem jurídica que actuam informadores e factores delimitativos de acção intersubjectiva, bilateralmente acordada entre o Mosteiro e os povoadores,, quer atingidos em primeira instância, quer em tempos futuros. Concomitantemente, perpassam relações funcionais sobre o relego e os vários tributos a receber pelos crúzios. »
Pela escolha estratégica para sediar o Esmoliadouro, em local defendido de salteadores onde viandantes nacionais, estrangeiros, peregrinos e a Rainha Santa Isabel, deixaram esmola. As esmolas serviam ao apoio assistencial da Enfermaria, no cuidado caritativo a enfermos, pobres e peões de viagem, claridade enxergada no Livro Notícias e Memórias Paroquiais a Bula da união a Mesa Conventual, e Infermaria deste Mosteiro de Santa Cruz da Igreja de Ansião por renuncia que dela fez no Mosteiro Gaspar Fernandes:cuja bula se passou em Roma no ano de 1559.Em vão tentou, nessa altura, a Universidade de Coimbra apoderar-se da Igreja de Ansião, em demanda que travou com os cónegos crúzios.» (...) A de 1 de agosto de 1577, o Bispo D. Manuel de Menezes fez publicar uma sentença que extinguiu a vigaria da Igreja de Ansião, que a transformou em curato anual.
Almeja o declínio desta primeira estalagem e de todas as suas valências sociais a precipitar a mudança do burgo, para nascente, depois de 1593, com reactivação de outro troço romano e agora medieval, entrando este do Vale Mosteiro em abandono.
Após a extinção das Ordens Religiosas em 1834
O que ainda restava das terras das quintas do mosteiro foram arrematadas em haste pública, por vários particulares.O administrador do Concelho, o Visconde da Várzea, amigos, correlegionários e o Dr. Domingos Botelho de Queiroz ficaram com os melhores terrenos na vila e fora dela, ainda no meu tempo o poderio da terra era mantido na posse de meia dúzia de conterrâneos...Aos pobres restou as migalhas das ruínas do complexo do vulgo mosteiro, comprada por vários, o que atesta a sua grande pobreza.
António Joaquim de Bastos Guimarães, o meu tetra avô paterno, nascido em Fafe, foi deixado na Roda de Expostos de Guimarães. Procurei pelo seu registo, encontrei um Faustino António, do Lugar da Ponte, seria o seu pai? Cuja mãe tenha morrido de parto e o pai para continuar a trabalhar o tenha ali deixado, pagando os seus estudos.
Já a razão de ter aportado a Ansião, abre varias perspetivas; ou o pai seria vendedor de couros que vinha comercializar na Feira dos Pinhões e na da Rainha Santa Isabel, na Constantina, aos sapateiros e, quiçá comprar peles curtidas, tradição que ainda recordo - morreu-nos uma cabrita e o meu pai curtiu a sua pele que esticou com canas para secar.
Localizei no livro do Dr. António Baião, de Ferreira do Zezere, uma nota de uma estalagem na Venda da Maria, vulgo Vendas de Maria, em Alvaiázere, que em 1775 era de um tal Cruz, apelido do meu lado apterno que veio para uma estalagem no Bairro, em Ansião, onde veio a morar nos finais de 800 o meu tetra avô. Indicia que vindo pela estrada medieval e ficou por ali na Venda da Maria, em idade já maduro . Casa no Bairro, alguns filhos nascem em Maças de D.Maria. Foi Oficial de Diligências no Tribunal na Cabeça do Bairro, presume que o ordenado lhe permitiu comprar um grande quinhão de terra ao Alto da Vinha, um gaveto contornado por caminhos onde veio a viver o meu bisavô Elias da Cruz , noq ue fora outra estalagem onde fundou a primeira padaria em Ansião, antes só se cozia pão nas estalagens do Bairro de Santo António; na da Ti Maria da Torre e da minha avoenga Maria Zé Guimãres.
O Esmoliadouro ou foi aqui implantado nesta entrada ou na outra a norte.Numa das entradas foi.
Alvitro que tenha aqui sido implantado nesta entrada ao gaveto, no lado esquerdo na portagem do complexo aqui instituído? Pelo contexto de ruína de casa pequena que se afunila sob o comprido...Não lhe vejo outra utilidade.Com as ruinas a ficar mais pequenas e o espaço limpo verifica-se que aqui existe um pequeno poço. Ora se antes nunca o enxerguei dita que foi uma cisterna em forma de poço, como havia na vila, duas, fechado com casa com caleiras para canalizar a água, deixadas pelos romanos.
Reutilização de materiais, o varandim era da capela.
A pequena janela com grade na cave foi da adega pela sequência dos arcos de volta perfeita que entestava a norte com a capela.