Crónica a que destaquei excerto para publicação no Jornal Serras de Ansião em junho de 2021
Infelizmente não se encontra catalogado, e devia!
Ancestral história
resumida ao firme portal, em talhe gótico, quiçá o mais antigo testemunho da
arte de lavrante, no concelho de Ansião. Descobriu-o em criança, no tardoz da
Capela da Misericórdia (então jardim dos Paços do Concelho), em tempo de cerejas.
No mesmo ano, nas férias do Natal, com a minha irmã, vimos outro maior que foi
da Capela de S. Lourenço, no vulgo mosteiro.
Questionei anos
a razão de haver dois portais de ogiva de tamanho diferente, separados 200
metros: um sediado no primeiro burgo e o outro, no segundo, o atual. Favorável resposta
nas prospeções arqueológicas de 2010, a concluir que em época medieval, ambos
os burgos de Ansião, foram implantados em ruínas de habitats romanos, com reutilização de materiais. De supor que os portais
pertenceram a locais de culto desconhecidos, transformados em capelas cristãs. Depois
de 1593, o primitivo burgo de Ansião deslocou-se de poente para nascente e a
ruína do portal foi requalificada na Capelinha de NªSªConceição, cuja provável
datação é anterior ao séc. XII, se atender ao ano de aquisição da herdade de
Ansião entre 1175/6, com a fixação dos vendedores das quintas em vivência
organizada.
De má memória guardo
o desaparecimento de pedras afeiçoadas em Ansião, mostrando-se assinalável a
salvação deste portal até aos dias d’hoje - ou alguém se impôs em o preservar
ou sorte ao local recôndito, por isso desconhecido. A sua foto a preto e branco
participou, em 2016, no concurso de fotografia patrocinado pelo município; debalde
continuou ignorado… Descobri recentemente nas faces internas do arco quebrado a
gravação de arabescos – as ditas marcas de canteiro, desvanecidas com a erosão.
Correlacionei a vocação
da Capelinha na notícia do juiz Manuel Rodrigues nas Memórias Paroquiais de
1721 "A Capella da Senhora da Conceição que
servio antigamente para della se admenistrarem os sacramentos nos infermos no
Epital" (…) Em 1598 na
capela da Conceição o batismo da criança filho de Leonel Roriz e de Maria João
do Casal das Pêras. Padrinho André Freire do Casal do Freire da freguesia de
Chão de Couce (…)
Em 30 de agosto de 1700 batizei Anastácio de baixa condição de criança
enjeitada na capelinha de NSConceição de Ansião, foi padrinho João de Barros» Clarifica a sua
cabal importância no apoio à Casa da Misericórdia de Ansião, antes jamais
aflorada. Mas, era pequena para atender tanto serviço diversificado, até que em
1702, uma nova e maior Capela foi benzida. Mas, em 1706, ficou inoperacional e
a Capelinha voltou a prestar serviço até finais da centúria de 800, altura da
requalificação da Capela e da sua anexação, sendo bem visível a sul, a ligação
de ambos os locais de culto. De referir a falta de sinalética cultural que poderá
ser colocada com referência ao arco gótico no seu tardoz.
Em pranto, aludindo
ao mais recente orago – Senhora do Pranto da Capela da Misericórdia, reflito a pouca
estima ao património histórico da autarquia, no fecho de um portão na parede do
portal gótico podendo ser de correr, pelo menor impacto visual a contrastar a
medida positiva com a demolição do urinol público - resta a calçada portuguesa
do seu adro, de convir, não deve ser uso, a privado estacionamento!
Ansião
apresenta-se líder do projeto “Territórios de Pedra” no distrito de Leiria ao
juntar-se a Pombal e Figueiró dos Vinhos. Transparece o cartaz projetar a escultura
quinhentista e setecentista. Mas, a ignorar a arte de lavrante mais antiga de
Ansião, dita desprimor à própria herança cultural dos nossos antepassados, com
canteiros no Mosteiro da Batalha, induzindo a provável engano a todo aquele que
venha a circuito turístico de visitação!
Adoro a pedra esculpida
pela erosão ou pela mão do homem. Se atender à nostálgica perda no concelho: brasões,
lápide sepulcral brasonada na Capela do Senhor do Bonfim e do entupimento de um
poço (reza na oralidade a ligação a túnel),soterramento da cisterna romana
(redonda e telhada, no parque de estacionamento) e, no vulgo mosteiro, a
recente demolição de arcos de volta perfeita e, do suposto fuste do inicial
Pelourinho. Por fim, a regeneração da Rua dos Mosteiros, com o encanamento do
Ribeiro da Vide, sem aparente olhar e estudo ao talhe dos blocos em cantaria - a
olho amador, alvitram possível reutilização das paredes da Igreja velha, pela analogia
ao curso a sul e a norte, com muros de pedra tosca.
Projetar a vinda de massas em rota turística ao concelho de Ansião, apelando à valorização da pedra no séc. XXI, alvitra coragem de incluir o portal gótico e de remover os blocos de cantaria por carregarem história falante, a englobar em obra emblemática, a perpetuar o nosso passado, no futuro Museu Municipal. Sem dúvida, seria uma iniciativa positiva de líder, em Territórios de Pedra!