segunda-feira, 11 de março de 2013

O pôr-do-sol ao alto da Ameixieira e as suas gentes...





Maravilhoso...Lindo...Doce...Encantador...Deslumbrante, e...
Desalmadamente ao entardecer, em dia de cara outonal,  senti o brilho ímpar, único, numa primazia idílica de grandeza sem igual ao alto da Serra da Ameixieira, após subir a Serra do Mouro, tendo por companhia a vista deslumbrante sobre o cume do Alqueidão a espraiar-se no vale do planalto do Camporês-, tal contemplação só possível na única reta da estrada e mal me descuidei já estava a entrar na  curva apertada em "S" que encobria um inesperado sol a disparar em raios luminosos, como que a dizer adeus... Sem dó nem piedade, tão pouco pediu licença, estatelou-se em brilho incandescente no vidro do carro, deixando-me cega... Qual beleza estonteante a lembrar o poente, assim igual já vi por Albarrol, Costa do Castelo, Venda do Brasil, Serpa, Matosinhos...
Quiçá  um dia em África !
Espantada com o leque incrível de cores fortes, quentes, dilaceradas a fogo vermelho raiado de amarelo e laranja, a fugir de mansinho a caminho do mar... 
Fatal não parar para admirar tanta beleza que me sufocou de paixão!
Apressada e de mão trémula teimei registar tanta beleza na objetiva -, desconsolo meu, constataria mais tarde a falta de perícia no arrebatar do plano luminoso deste pôr-do-sol no Maciço de Sicó -, por culpas do encadeamento e fascínio de beleza incomum  que mirei no horizonte ao endireito dos cumes serranos do Casal Viegas, Serra dos Carrascos,  Albarrol no endireito do Vale da Vide...
Sempre às pressas tenho por hábito aferrolhar portas na casa da Moita Redonda para me perder mais uma vez, outra vez nas paisagens de olival pelo Camporês -, algumas milenares plantadas pelos romanos, mais tarde reconquistadas pelos árabes - mouros teimosos insistiram em deixar azenhas, alambiques, noras, balanços, nespereiras, limoeiros, alguidares, almotolias, alforges, ainda outras palavras sem a inicial "AL" azenha, nora, adufe, hortelã, coentros.
A julgar o terreiro da célebre batalha de Ourique, travada contra os sarracenos em Chão de Ourique  (?) nos planaltos da Ateanha ao limite do Camporês -, um dos locais prováveis defendido pelo Prof. Hermano Saraiva e outros historiadores-, honra disputada a par com Chã de Ourique no Cartaxo, ainda Ourique em Lisboa, e jamais Ourique no Alentejo -, mas é desta que reza o anal da história. Por aqui houve guerras, pelos achados...e o D. Afonso Henriques estaria por Coimbra nesse tempo e andou por aqui, isso é sabido!Derrotados os sarracenos, outra vontade não tiveram, senão de fugir às pressas …Quero acreditar que algum mouro teimoso, ou "alma penada se deixou ficar escondido na Serra do Mouro" no certo desígnio de perpetuar marcas na toponímia: Alvorge, Alquelamouque, Aljazede, Alqueidão, Albarrol além do traço visional nas suas gentes ainda hoje há descendentes na sua passagem por estas terras com características desses genes "carapinhas, olhos negros, pele trigueira, d’olhão, alcunha para a veia negocial " .
Sem dúvida encanto tamanho o trajeto de subir a Serra do Mouro a caminho de Ansião ao entardecer, no alto o refúgio abandonado dos "Caçadores" mal estimado e preservado -, tão bonito que foi, um desespero! Também o inverso é verdade, pela manhã tenho visto ao cruzamento para o Alqueidão bandos de perdizes e perdigotos atrás da mãe ordeiros abanicando as penas do rabo...tem vezes que paro, me atrevo a correr para os tentar apanhar -, mal me sentem, aceleram a marcha até que se atrevem a voar...
 
Em plena descida, na curva maldita, na berma ainda os grandes pedregulhos recordam-se sempre a morte do Isaías Cassiano que foi do Casal das Sousas -, rapaz bonito, educado, simpático que conheci aspirante no Tribunal -, andava em despedida de amigos para voltar a França na década de sessenta onde procurou nova forma de vida, na mota emprestada pelo meu pai, seu amigo, no gozo de "vacanses" nas mãos nos levou presentes: champanhe, Marie Brizard e chocolates…

O ritual da "chega" do porco à porca…Grande o corrupio apressado das mulheres da Lagoa da Ameixieira, do Cimo da Rua, Pinhal Terreiro, Quelha da Atafona, de tantos lugares – munidas de varapau na mão, encaminhavam apressadas as porcas a caminho do curral do barrasco cobridor, na casa do Ti António Moreira no Bairro de santo António. Viril ficava o barrasco, quando a porca entrava à cancela de madeira do curral -, não se fazia rogado em começar a corte da cobrição -, os cachopos, em passo de corrida mal sentíamos tal caminhada na ladeira da Cerca (onde funcionou o hospital), esfalfados na corrida atrás da porca a olhar para o rabo torcido, já  no curral dependurados no tabuado, qual palco em frenesim inusitado de dança e andança, do poleiro do porco no traseiro da porca, sem perceber  porquês...
  • Um dia perguntei à minha mãe o que era isso da "porca ir ao porco" e não me safei de um brutal estalo  com a retórica "vê lá se queres levar mais "...
Estranho era também ouvir falar "entre dentes" da mulher do … de quem se dizia "à boca cheia ser uma grande vaca…" e nos livros -, a vaca era um animal pachorrento que comia erva, ruminava horas deitada para dar leitinho... nisto, interrogava-me, será que também ia ao boi (?) 
Gentes da Lagoa e Ameixeira... ,Lugar  que nasceu à volta da lagoa  que lhe ditaria o nome - nada mais que uma (Dolina) apesar de  antropomorfizada ao longo dos tempos pela construção de muro delimitador para retenção de águas - não deixa de ser uma bela geoforma cársica do Maciço de Sicó como ainda felizmente existem muitas na região, na primavera cheias d'água são lindas de observar. 

Tenho apreciável apresso pelo "Ti João cantoneiro"  que conheci ao Ribeiro da Vide na Casa de Cantoneiros -, antes de rumar a França, bom homem tal qual o Saguim -,os mais simpáticos, no cumprimento diário, quando nos cruzávamos.Trabalhadores teimosos na tarefa de tapar os buracos das estradas da vila, e das vezes de os ver acender a fornalha da máquina do alcatrão, onde hoje é a casa da família Tarouca .
Também da hospitaleira esposa D. Helena e dos filhos: Odete (minha comadre, doçura de senhora me presenteia amiúde) Carlos Alberto, Arminda, Alfredo, Sérgio e Paulo Silva, todos muito simpáticos, humildes, amigos do seu amigo e mãos francas para obsequiar.
Na sua casa já estive por várias vezes onde as mesas se apresentam sempre fartas de bom pão cozido no seu forno, o mesmo das carnes servidas em travessas Vista Alegre de grande fineza delicada pela antiguidade , bom queijo e salpicão, tordos e perdizes na brasa, para não falar da variedade de doces onde o Pão de Ló sendo enorme de alta confeitaria, pela mão da D. Helena. E claro bom vinho!
Renato -, neto do "Ti João cantoneiro" a tocar acordeão -, arte que o avô também foi artista, sob o olhar orgulhoso do pai Paulo Silva e do meu marido em abril de 2011


Foto com a minha linda comadre Odete em grande plano com o marido o Fernando Moreira do Casal S. Brás, na frente os pais dela - Ti João Cantoneiro e a Ti Helena da Lagoa da Ameixieira
 Ainda tempo para falar das vizinhas: Suzete; Delminda; Filomena; Fernanda, Rosa; Delfim vinha com os pais ao terreno junto ao largo do Ribeiro da Vide -, moreno bem bonito havia vezes que vinha na companhia da sua prima a  Lucília Teresa dona de belos olhos expressivos  -, ambos a fazer jus a moiros, ele tornou-se advogado, viria mais tarde a construir nessa courela uma casa onde montou escritório, ela foi professora, soube há pouco estar muito doente. Fiquei imensamente infeliz por o saber, sendo tão nova e bonita não merecia!
Difícil esquecer a Amélia dos olhos tristes... Que Deus levou tão cedo da nossa presença e acredito nunca foi feliz  nesta vida com o marido Serra do Escampado, sendo 17 anos mais velho, bem a devia ter estimado, porque mulher tão trabalhadora, sofredora em silêncios e humilde, nunca conheci outra assim igual!
Também do "Ti Fidalgo" -, alcunha de António Ribeiro -, fazia artigos de cestaria com palha de centeio presa a tiras de plástico preto que aproveitava das encomendas para fazer o feitio-, na sua falta usava silva seca para prender a palha. Das suas mãos saíram cirandas para limpar a azeitona com pauzinhos de oliveira ou urze; o palhão, usado para tapar a massa da broa a fermentar; fruteiras de pé alto e, ...
Exemplares na casa do meu compadre Fernando Moreira
Casal Soeiro: as manas Helena e Mariazinha no tempo que foram criadas de servir em casa da minha tia Carma Russa…
Em abono da verdade -, a Mariazinha de seu nome Maria Irene...a tia Carma quando as contratou chamou a recato a Irene na obrigação iminente de lhe contar um episódio íntimo que lhe era desfavorável e cuja interveniente tinha o mesmo nome "em jeito de pedir, a tia perguntou-lhe se não se incomodava de ser tratada por Mariazinha"… boa moça, meiga, acedeu ao pedido, ainda hoje assim me lembro dela, graciosa, tanto quanto a irmã. Raparigas boas amigas -, quantas boas recordações da cumplicidade de tanta amizade. 
Chegava ao balcão da mercearia de cesta na mão, logo os meus olhos corriam os armários para descobrir a farinha Amparo - , enquanto isso elas de corredor na mão aviavam colorau doce e pimenta em cartuchinhos de papel pardo, arroz e açúcar amarelo, já o   bacalhau e a raia era cortada na grande faca que até estremecia o balcão, as sêmeas para os porcos aviavam dos sacos de atilho corrido arrumadas na arrecadação debaixo da porta para o sobrado -, um dia ouvi a tia na conversa com o vendedor " oh senhor a margem das sêmeas nem se sente, estou a perder dinheiro..." debaixo do balcão arrumavam os paus de sabão azul ou rosa, pacotes de Omo e Sunil, para lavar a roupa e no teto e nas portas penduravam tripas secas de cheiro nauseabundo para fazer as chouriças e as morcelas, e claro rebuçados, elas davam sempre uma mão cheia deles. No pátio ao fundo aviavam malgas de água-pé escura a escorrer pelo vidrado...aos homens sôfregos por pinga!
Recordo também a  Alice que foi empregada no hospital, além de boa empregada tinha umas mãos delicadas para o crochet. 
Tive um colega no Externato -, o Henrique, se não me falha a memória é do Casal Soeiro ou será Ameixieira?
Ribeirinho ou Casal Soeiro (?)  O "Ti Zé das Notas"  rara a semana que o não via nos seus terrenos na proximidade da minha casa -, o que me lembro dele, baixote e pitoresco.
"Ti Zé Reis" também velhote, magro, simpático, vinha muitas vezes ao seu grande terreno de pinhal, milheiral e vinha na frente da minha casa, onde se especulou a Câmara pretendia fazer o mercado - que bem ali teria ficado, porque a vila merecia já nesse tempo encaminhar-se mais para o Carvalhal… 
EmpiadosIsaura linda e bondosa mulher que conheci padeira.
Paisagem de cariz mediterrânico. Avassalador parar. Nunca me canso de a mirar  ao alto da serra da Ameixieira -, melhor quem se atreve como eu a entrar nela dentro na procura incessante de pedras esculpidas pela erosão...


Quando descobri esta logo me  fez recordar as botas que o sapateiro fazia ao meu tio Chico... 
Em baixo espécimes de machados de pedra do tempo do neolítico (?)Também aqui encontrados por mim!
Artesanato...Mantas de lã da CUF feitas por um tecelão do Avelar, de cariz romântico, airosas com passarinhos, da minha comadre Odete, intervalados com corações e flores.
 
Flores...Nascem na serra espontaneamente à toa semeadas pelo vento; lírios, alecrim, oregãos, funcho, rosmaninho, urze branca, murta, esteva, arruda e orquídeas. 
Gosto sempre de ir à serra apanhar  flores para o meu oratório na Páscoa!
Rosas albardeiras por aqui chamadas de cucas, na frontaria da primeira casa ao vir da Serra do Mouro, na Ameixeira-, lindíssimas.
Venham descobrir, quem tiver um bom jipe ou mota4 no cimo da serra atrevam-se a descer pela nova variante, atravessando o costado...Mete respeito a descida, na planura do vale, perdido de vegetação exuberante, e animais -, coelhos e perdizes, quem sabe raposas e ginetos, onde julgo um dia passou perto a via romana aparecem courelas, e do lado direito um contraforte altaneiro brutal em pedra,- de defesa natural.
Idílico para amar!
Gotículas de orvalho num lírio roxo...
Tudo é belo por esta terra implantada nos costadas das serras...
Onde ainda persiste casario em pedra de traça típica com  janelos, escadas, varandins, currais e eiras.

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