segunda-feira, 8 de junho de 2015

Quem acode à Casa dos Órfãos na Mouraria?

O que resta da Muralha Fernandina, lápide  no prédio com inscrição comemorativa da construção 1373/75
Ermida de Nossa Senhora da Saúde
Cruz templária e o catavento no campanário
Cores garridas na Mouraria dão vida à rua
Azulejos da Fábrica Viuva Lamego
CASA DO AMPARO, imóvel das Finanças

CRONOLOGIA DO EDIFÍCIO
"Fundação em 1273 do primitivo Colégio para meninos órfãos, pela Rainha D. Brites, mulher de D. Afonso III
Em 1549 D. Catarina fundou-o de novo e reformou sob invocação de Nossa Senhora de Monserrate, destinado a albergar 30 meninos pobres que recebiam instrução que os preparava para as missões religiosas de África e do Brasil
Em 1570 realiza-se a 1ª procissão de Nossa Senhora da Senhora da Saúde, cuja imagem se guardava no Oratório do Colégio
Em 1661 a imagem de Nossa Senhora da Saúde é transferida para a então capela de São Sebastião, que lhe ficava quase defronte, a partir de então designada por Capela de Nossa Senhora da Saúde
No século XVII toma o nome de Colégio de Jesus, por aí existir uma confraria do Menino Jesus
Em 1754 sofreu obras mandadas executar por D. José, por o edifício se encontrar em mau estado
Em 1755 o terramoto provoca muitos estragos no edifício arruinando parte do núcleo construído no ano anterior, tendo sido posteriormente restaurado
Em 1758 o Colégio foi confiscado à Companhia de Jesus, passando a ser administrado pelo Tribunal da Mesa da Consciência
A 10 setembro nas Memórias Paroquiais, o pároco da freguesia de São Cristóvão refer o Recolhimento do Amparo, que ficou com a capela da igreja bastante danificada, assim como a fachada principal, na sequência do terramoto
Em 1814 instala-se o Recolhimento do Paraíso para mulheres e o Colégio dos Meninos Órfãos é anexado à Casa Pia da Correcção da Corte, instalada desde 1812 no Desterro
Em 1834 o edifício é ocupado pela Sede da Sociedade Farmacêutica e por um estabelecimento comercial no piso térreo, após o Recolhimento do Paraíso ter sido transferido para o Convento do Grilo
Em 1859 a abertura da nova Rua da Palma implicou a demolição de uma Ermida dedicada a Nossa Senhora da Guia, tendo a sua imagem sido recolhida no oratório do antigo Colégio,desde então passou a ser conhecido como "Ermida da Senhora da Guia" ou do "Amparo", denominação que perdurou até 1885 Em 1907 o edifício deixou de ter a função de Ermida, tendo a imagem sido transferida para a Igreja da Madalena e o imóvel passou para a Federação de Associações de Socorros Mútuos
Em 1910 após a implantação da República instalaram-se várias associações; a Comissão Central das Juntas de Freguesia, repartições de serviços públicos e uma esquadra de polícia, o que levou à realização de várias obras, alteração do pátio interior e transformação de uma das portas da fachada principal em janela
Em 1975 / 1979 os azulejos do átrio e escadaria em muito mau estado, e alguns partidos e retirados, e as paredes deterioradas
Em 1980 / 1994  o edifício foi ocupado pela Junta de Freguesia do Socorro, Dispensário Materno-Infantil da Mouraria, Montepio dos Ferroviários, INATEL, Cofre de Previdência das Forças Armadas, esquadra da P.S.P. o Depósito do Tribunal de Contas e pelo Centro de Saúde do Castelo
Em 1990 infiltrações de águas pluviais inundam certas dependências e o andar inferior                                  
Em 2003 a 30 Dezembro foi dissolvido o Montepio Ferroviário
Em 2006 a 22 agosto um parecer da DRC Lisboa para definição de Zona Especial de Proteção conjunta do castelo de São Jorge e restos das cercas de Lisboa, Baixa Pombalina e imóveis classificados na sua área envolvente
Em 2011 a 10 outubro, o Conselho Nacional de Cultura propõe o arquivamento de definição de Zona Especial de Proteção
Em 18 outubro por Despacho do diretor do IGESPAR a concordar com o parecer e a pedir novas definições de Zona Especial de Proteção."

Possivelmente seria a cisterna no pátio, entupida com o feto(?)
Fachada da lateral para o pátio em ferro forjado
Entrada pelo pátio , o pórtico de entrada encimado com as armas de D. José I 
Átrio da entrada, soberbo com brutais painéis de azulejos uma jóia da azulejaria barroca portuguesa

"Átrio e escadaria com revestimento azulejar de composição figurativa, em monocromia, azul em fundo branco, formando silhares recortados na parte superior e ilustrando, em 41 painéis, temas do Antigo Testamento (32 painéis) e do Novo Testamento (9 painéis). 
Uma inscrição inserida em cartela na parte superior de cada um dos painéis identifica os temas representados. 
Todos os painéis são delimitados por motivos ornamentais arquitectónicos e vegetalistas, tendo na parte inferior cartela formada por frutos diversos e enrolamentos de folhagem. "
No 1º e 2º andar é um Lar de idosos de dia, os vi a subir as escadas para o pequeno almoço agarrados aos corrimões. Perguntei a uma funcionária  muito simpática se o edifício tinha capela, disse-me que no 2º andar há evidências do que poderia ter sido, também a casa de banho e a cozinha com obras ao longo de anos, praticamente nada tem de antigamente.
Valências do passado
Ao sair entrava uma multidão de homens de meia idade que se encaminharam para os andares de cima, Inatel?
No corredor de acesso ao pátio na parede a fileira de caixas de correio, de tudo o que aqui funcionou e ainda funciona.
Adorei conhecer o espaço com o meu neto Vicente, sentada num banco no 1º andar por segundos idealizei a felicidade daqueles momentos em descanso, sem jamais deixar de pensar nos órfãos que aqui foram deixados na Roda, durante tantos séculos, sediada no átrio ou no pátio(?)-, imaginei senti-los a gatinhar nas mesmas pedras dos degraus  das escadas que subi até ao 4º andar...arrepiei ao sentir gemidos, choros, gritos e tristeza, embora de olhos arregalados pensei., não ! Por certo estas crianças se deliciaram sem o saber com a beleza dos azulejos, em os mirar encantados pelo brilho de tanta luz, sobretudo pela macieza quando lhe passavam com as maozitas, sem jamais conseguir apanhar as imagens que neles viam, que os deixava naturalmente apreensivos, ainda assim entretidos, por isso acredito foram ainda assim felizes, porque fome não deviam ter passado...Azulejos setecentistas, como seria nos séculos antecedentes? Paredes frias...

O edifício é central, sem elevador, não faz sentido para a prática de Lar de Dia para idosos, e o mesmo para Sala de Convívio do Inatel, estando situado em frente ao Centro Comercial, com acessibilidades, supostamente haverá salas ou lojas desocupadas(?) bem poderiam abarcar estas valências com melhores condições para os utentes e quiçá mais modernas.
Estando a esquadra no r/c desativada, deveriam repensar na revitalização do edifício, privilegiando a escadaria com restauro do reboco das paredes, algumas com infiltração de humidades, fazendo algo que mostre ao visitante a vida que aqui se viveu no passado. 
Há que encontrar MECENAS
Interessante seria saber para onde é canalizado o dinheiro que o governo  ganha do euromilhões quando sai em Portugal, de vez em quando entram uns milhões em saco azul(?) -, uma ideia fantástica seria aproveitada para dar nova vida a casos como este. 
Porque não se deve perder a história com estórias e  do sofrer dos órfãos, embora protegidos sempre desprotegidos e abusados, muito menos perder o que resta -, os silhares azulejares, que me parecem desprotegidos!


PREFACIANDO O SODOMITA E O SANTO OFÍCIO
O pecado nefando de João de Távora (1555-1556) Pedro Miguel Barbosa Moreira Faculdade de Letras da Universidade do Porto

"No início da segunda metade do século XVI, num momento em que o tribunal do Santo Ofício português procurava junto da Santa Sé a permissão para perseguir e julgar o pecado nefando de sodomia, um mourisco forro, batizado em Ceuta com o nome de João de Távora, que no momento aprendia no Colégio dos Meninos Órfãos da Mouraria, é acusado de assédio a duas crianças da instituição. A atenção dada ao pecado de sodomia pela justiça civil e eclesiástica dos reinos católicos era crescente desde o final do período medieval, acompanhando muitas das considerações que a sociedade da época tecia acerca das relações hétero e homoeróticas. O caso apresentado reflete algumas dessas questões, integrando também aspetos relacionados com a violência sexual juvenil."


Fontes
http://www.monumentos.pt/Site/APP_PagesUser/SIPA.aspx?id=6477
http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/12127.pdf

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